Descrição de chapéu Governo Biden

EUA tentam apaziguar frustração palestina por promessa não cumprida de Biden

Democrata deve nomear enviado especial enquanto não reabre consulado em Jerusalém, como havia dito na campanha

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Washington

O governo de Joe Biden tem tentado nos últimos dias apaziguar a crescente frustração das autoridades palestinas, que esperam que o presidente americano cumpra a promessa de reabrir o consulado em Jerusalém. A tarefa de agradar os palestinos, porém, esbarra nas expectativas de Israel, um país com o qual os Estados Unidos vivem hoje um momento de excepcional afabilidade.

Os americanos tinham um consulado em Jerusalém para sua representação junto aos palestinos. Quando, em 2018, o então presidente Donald Trump transferiu a embaixada americana em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, ele fechou o escritório. O gesto foi importante porque sinalizou apoio a israelenses na disputa com palestinos na cidade que os dois lados consideram sua capital. Foi também um símbolo do rebaixamento dos palestinos nas prioridades americanas.

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, à esq., encontra-se com o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, na cidade de Ramallah - Jacquelyn Martin - 27.mar.22/Pool/AFP

Biden venceu as eleições em 2020 e, desapontando a Autoridade Nacional Palestina, nunca reabriu o consulado. Ned Price, porta-voz do Departamento de Estado americano, repetiu a promessa na última terça-feira (31) e rejeitou a ideia de que ela tenha sido abandonada. No mesmo dia, o presidente palestino, Mahmoud Abbas, reiterou a cobrança em telefonema com Antony Blinken, responsável pela diplomacia —ele já havia pedido a reabertura do escritório em março, numa reunião presencial.

Abbas disse esperar que Biden transforme suas palavras em ações, de acordo com a agência de notícias estatal palestina Wafa. Não há, porém, data para a eventual inauguração nem qualquer indício de que Biden tenha feito algum gesto concreto.

Circulam, nesse meio-tempo, rumores de que os EUA podem tomar medidas temporárias para afagar os palestinos. O jornal Times of Israel, por exemplo, afirmou no último dia 29 que Biden deve nomear Hady Amr, de origem libanesa, como enviado especial para assuntos palestinos.

A ideia é que a embaixada americana em Israel, que Trump transferiu para Jerusalém, deixe de cuidar de temas relacionados aos palestinos. Esses seriam tratados pela equipe de Amr, com base em Washington, na prática incrementando a representação diplomática sem reabrir o consulado. De acordo com o jornal, que ouviu diplomatas, esse arranjo já existe, mas ainda não foi formalizado. A ideia é fazer o anúncio antes da viagem de Biden à região, prevista para ocorrer no fim de junho.

"Há uma tremenda frustração entre os palestinos", diz à Folha Ghaith al-Omari, analista sênior do Washington Institute. Omari, que foi conselheiro de Mahmoud Abbas para as relações com os EUA, afirma que a nomeação de Amr é vista como uma meia-medida. O nome do servidor circula bem entre palestinos, e ele é visto como uma figura justa na mediação das desavenças, "mas não tem o mesmo peso diplomático que reabrir o consulado".

A liderança palestina tem poucas saídas hoje, além de continuar a expressar seu desgosto. Biden tampouco tem muitas opções para resolver esse impasse. Os israelenses interpretariam a reabertura do consulado como uma sinalização americana de que enxergam Jerusalém como possível capital de um Estado palestino —uma ideia que a eles causa horror.

Os EUA não querem desagradar Israel, em parte porque os países vivem hoje um momento excepcional. "A relação entre o governo de Biden e o do primeiro-ministro Naftali Bennett está fortíssima", afirma Dov Waxman, professor na Universidade da Califórnia em Los Angeles. "É impressionante, se você comparar com o amargor e as disputas entre Barack Obama e Binyamin Netanyahu", diz, citando o ex-presidente americano, democrata como Biden, e o ex-premiê israelense.

Nesse contexto, afirma Waxman, a possível nomeação de Amr como enviado especial seria uma maneira de "apaziguar a frustração palestina sem prejudicar as relações americanas com Israel".

Há ainda mais um fator no cálculo de Washington. A reabertura do consulado em Jerusalém poderia causar reações tão fortes que ameaçariam a frágil coalizão que mantém Bennett no poder –e Netanyahu fora dele. "O governo Biden prefere o premiê atual e sabe que, se pressionar muito com o tema do consulado, essa coalizão pode se desintegrar, o que seria uma escolha ruim", afirma Eytan Gilboa, professor de relações internacionais na Universidade Bar-Ilan, em Israel.

A aliança, que reúne siglas da esquerda à ultradireita, incluindo parlamentares de origem árabe, registrou defecções e sofreu abalos recentes, em meio a críticas pela ação da polícia em confrontos com palestinos na Esplanada das Mesquitas.

Como os demais ouvidos pela Folha, Gilboa diz não acreditar que os EUA vão reabrir o consulado em Jerusalém nos próximos meses. Biden deve continuar a priorizar suas boas relações com Israel e se debruçar sobre o que o professor descreve como as duas questões urgentes da diplomacia americana na região: o acordo nuclear com o Irã e os Acordos de Abraão entre Israel e países árabes.

"O tema dos palestinos é o menos importante, hoje", afirma.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.