Descrição de chapéu União Europeia

Governo da Itália fica à beira do colapso após ultimato de partido populista

Instabilidade política volta após ex-premiê dizer que boicotará votação-chave para estabilidade de Draghi

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Milão

A gestão do primeiro-ministro italiano, Mario Draghi, pode estar com as horas contadas. A tradicional instabilidade política do país voltou à tona depois de o ex-premiê Giuseppe Conte, líder do Movimento 5 Estrelas (M5S), anunciar que o partido não votará, nesta quinta (14), um decreto no Senado que tem validade de um voto de confiança ao governo.

Como o partido faz parte da ampla coalizão parlamentar que sustenta Draghi, um desfecho possível é o fim do governo, depois de só 17 meses, o que pode levar à convocação antecipada de novas eleições.

O premiê italiano, Mario Draghi, fala em entrevista coletiva durante cúpula da UE em Bruxelas - Johanna Geron - 24.jun.22/Reuters

A decisão se dá depois de semanas de tensão nos bastidores, ameaças e rompimentos. O decreto em votação é chamado de Ajuda, um pacote de € 17 bilhões com medidas para aliviar o impacto do aumento dos preços de matérias-primas e da energia sobre os custos de famílias e empresas. O texto, de iniciativa do governo, foi aprovado na Câmara na segunda (11), sem a participação dos deputados do M5S, que se retiraram do plenário —ação que será repetida no Senado.

"O país está à beira do abismo, a situação mudou. Somos o único partido que pressiona o governo. Precisamos de uma fase diferente, e as declarações de Draghi não são suficientes", afirmou Conte após um dia intenso de reuniões partidárias e um telefonema com o premiê.

Ele diz não concordar com alguns pontos do decreto, mas as desavenças já vêm aumentando por outras razões. No fim de junho, o envio de armas à Ucrânia e a participação do Parlamento nesse tipo de decisão ampliaram a divisão e culminaram na saída do ministro Luigi Di Maio (Relações Exteriores), que montou um grupo parlamentar com cerca de 60 ex-M5S.

Na semana passada, em um encontro com Draghi, Conte entregou uma lista de nove pontos que o partido considera fundamentais para continuar como parte da coalizão, incluindo a criação de um salário mínimo para trabalhadores. Em resposta, o premiê afirmou que muitos dos tópicos já fazem parte das prioridades do governo e disse não trabalhar com ultimatos. "Se eles continuam, não se pode trabalhar, e o governo perde o sentido", disse, nesta terça (12).

Apesar de o governo tecnicamente ter números suficientes para aprovar o Ajuda, a ausência do voto de confiança de um partido da coalizão é considerada um sinal de perda da parte do apoio parlamentar. A uma iminente queda de Draghi podem se seguir três cenários. No primeiro, Draghi aceita formar um novo Executivo, com uma maioria menor e sem o M5S —algo que diz não estar disposto a fazer.

"Outra possibilidade é a definição de um novo primeiro-ministro, em um governo-ponte", segundo Alfonso Celotto, professor de direito constitucional da Universidade Roma Tre. O pleito parlamentar italiano está previsto para o primeiro semestre do ano que vem, possivelmente em maio.

Por fim, caso não haja acordo, o presidente da República, Sergio Mattarella, pode decidir por dissolver o Parlamento e convocar novas eleições —a Itália, porém, nunca realizou eleições em meses de verão.

Um dos defensores do voto antecipado é a única força de oposição. O partido de ultradireita Irmãos da Itália é hoje o mais bem colocado nas pesquisas, com 22,5% das intenções de voto. "Guerra, pandemia, inflação, pobreza crescente, contas altas, riscos de energia, crise alimentar. E o governo 'dos melhores' está imóvel, às voltas com os jogos palacianos", escreveu a líder Giorgia Meloni no Twitter.

A linha também tem apoio de Matteo Salvini, da Liga, também de ultradireita: "Se o M5S não votar o decreto, acabou. Vamos às urnas". Em segundo na preferência dos eleitores, o Partido Democrático, de centro-esquerda, era favorável à continuidade do governo, mas, antes do anúncio de Conte, seu líder, Enrico Letta, havia dito que, em caso de queda, a eleição antecipada é o caminho.

Eleito em 2018 como o maior partido, o M5S participou de todas as formações do Executivo desde o início da atual legislatura. Sob o primeiro governo Conte, dividiu a coalizão com a Liga. Quando Salvini provocou a queda do governo, em setembro de 2019, o premiê refez a maioria com o PD. Em fevereiro de 2021, após outra crise em plena pandemia, Draghi assumiu o chamado governo de união nacional, com todas as forças políticas exceto os Irmãos da Itália.

Em crise de identidade e com disputas de poder interna, o M5S tem 10% das intenções de voto nas pesquisas, em quarto lugar, após ter sido a preferência de 34% dos eleitores há quatro anos.

"O objetivo dos partidos é a eleição de 2023. É preciso decidir estar no governo ou na oposição, para ter um discurso para os eleitores. E aí se pega um pretexto qualquer para sair do governo", diz Celotto.

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