Steve Bannon é condenado por desacato ao Congresso dos EUA

Ex-estrategista de Trump foi considerado culpado por se recusar a depor e a entregar documentos a comitê que investiga o 6 de Janeiro

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Washington | Reuters

Steve Bannon, um dos principais aliados do ex-presidente dos EUA Donald Trump e figura de influência na direita global, foi condenado nesta sexta-feira (22) por desacato, por desrespeitar intimações do comitê da Câmara que apura o ataque ao Capitólio. A decisão é uma vitória para o painel liderado pelos democratas.

O júri considerou Bannon, 68, culpado nas duas acusações que enfrentava: recusa em depor e em entregar documentos ao colegiado parlamentar que investiga o ataque à democracia americana promovido por apoiadores de Trump em 6 de janeiro de 2021, numa tentativa de reverter os resultados do pleito presidencial de 2020 e a derrota eleitoral do republicano.

Steve Bannon, ex-estrategista da Casa Branca, durante entrevista coletiva em Washington após ser condenado por desacato ao Congresso
Steve Bannon, ex-estrategista da Casa Branca, durante entrevista coletiva em Washington após ser condenado por desacato ao Congresso - Jonathan Ernst/Reuters

Cada desrespeito ao Congresso é punível com pena de 30 dias a um ano de prisão, bem como multa entre US$ 100 (R$ 549) e US$ 100 mil (R$ 549 mil) —a sentença de Bannon deve ser fixada em 21 de outubro.

O veredicto do júri, formado por oito homens e quatro mulheres, foi dado após menos de três horas de deliberações, marcando o primeiro processo bem-sucedido por desacato ao Congresso desde 1974, quando um juiz considerou culpado G. Gordon Liddy, um conspirador no escândalo de Watergate, episódio que levou à renúncia do presidente Richard Nixon.

"Podemos ter perdido a batalha, mas não perdemos a guerra", disse o condenado após a decisão desta sexta. Ele não falou em sua própria defesa no julgamento. O comitê da Câmara chamou a decisão de "vitória do Estado de Direito", evocando a responsabilização de quem for responsável pelo 6 de Janeiro tanto quanto de quem tentar obstruir as investigações. "Ninguém está acima da lei", disseram em comunicado os líderes do colegiado, Bennie Thompson e Liz Cheney. A Casa Branca não comentou.

Bannon foi um dos principais conselheiros da campanha presidencial de Trump em 2016 e no ano seguinte atuou como seu estrategista-chefe na Casa Branca, até o republicano se irritar com ele devido a declarações dadas à imprensa. O americano também desempenha papel de destaque na mídia de direita e é próximo da família Bolsonaro; criou um projeto chamado "O Movimento", para unir líderes populistas de direita pelo mundo, e nomeou o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, como seu representante no Brasil.

Nos argumentos finais do processo, nesta sexta, a equipe de defesa sugeriu aos jurados que o agora condenado era um alvo político e pintou a principal testemunha de acusação como um democrata com motivações políticas e ligações com um dos promotores. A acusação respondeu que Bannon mostrou desdém pela autoridade do Congresso e precisava ser responsabilizado pelo desrespeito às leis.

A promotora Molly Gaston disse aos jurados que a invasão do Capitólio representou um "dia sombrio" para os EUA e que "não há nada de político em descobrir por que o 6 de Janeiro aconteceu e em garantir que casos do tipo nunca aconteçam novamente". Por outro lado, Evan Corcoran, um dos advogados do aliado de Trump, questionou a razão pela qual só Bannon teria sido escolhido para ser alvo de uma ação legal.

O comitê disse que o ex-estrategista falou com Trump pelo menos duas vezes no dia anterior ao ataque e participou de uma reunião de planejamento em um hotel em Washington. O painel também exibiu um vídeo no qual ele diz, em seu podcast, no dia 5 de janeiro de 2021, que "o inferno vai acontecer amanhã".

A condenação deve fortalecer o comitê da Câmara na busca de depoimentos e documentos de outros nomes na órbita de Trump. No ano passado, o ex-presidente pediu a aliados que não cooperassem com o órgão, acusando-o de tentar prejudicá-lo politicamente; vários deles atenderam ao chamado. Em junho, outro ex-assessor do republicano, Peter Navarro, também foi acusado de desacato ao Congresso por se recusar a comparecer a um depoimento no comitê. O julgamento dele está marcado para novembro.

O Departamento de Justiça optou por não acusar outros dois aliados de Trump, Mark Meadows e Daniel Scavino, também por desrespeito a intimações do comitê, apesar de uma votação da Câmara recomendar a medida. Mas, diferentemente de Bannon, Meadows entregou algumas comunicações ao painel.

O órgão da Câmara pode fazer diversos encaminhamentos ao Departamento de Justiça para buscar acusações criminais, inclusive contra Trump, de acordo com sua vice-presidente, Liz Cheney.

A principal testemunha de acusação foi Kristin Amerling, uma das principais funcionárias do comitê. Ela disse que Bannon desprezou os prazos para responder à intimação, feita em setembro de 2021, não buscou prorrogar o limite e ofereceu uma justificativa inválida –baseada numa alegação de Trump, que evocou a ferramenta do privilégio executivo para manter certas comunicações presidenciais sob sigilo.

O juiz limitou o escopo do caso que a equipe de Bannon poderia apresentar aos jurados, movimento que um de seus advogados disse ter "impedido gravemente" a defesa. Assim, o ex-estrategista da Casa Branca não pôde argumentar que suas comunicações com o ex-presidente estavam sujeitas a privilégios executivos e que ele se baseou em aconselhamento jurídico de um advogado para se recusar a cumprir as intimações.

A defesa de Bannon argumentou ainda que ele acreditava que os prazos das intimações eram flexíveis e sujeitos a negociação com o comitê. Mas, em uma mudança de rumo de última hora, com a aproximação da data do julgamento, se disse disposto a depor em uma audiência pública perante o comitê, uma oferta que os promotores disseram não mudar o fato de que ele já havia infringido a lei.

Em um outro processo, em 2020, Bannon foi acusado de ter participado de uma fraude numa campanha virtual de doações relacionada à construção de um muro na fronteira entre os EUA e o México, uma promessa de campanha de Trump, que deu a ele o perdão presidencial antes que o caso fosse julgado.

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