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Sergio Duarte

Guerra da Ucrânia reforça importância de Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares

Risco global cresceu em meio à deterioração diplomática e a emergência de 'armas táticas'

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Sergio Duarte

Embaixador, foi alto representante das Nações Unidas para Assuntos de Desarmamento. É presidente das Conferências Pugwash sobre Ciência e Assuntos Mundiais

Desde a época de sua elaboração, o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP) revela graves divergências entre seus membros, que transparecem nas conferências de exame realizadas a cada cinco anos. A décima começa nesta semana e vai até 26 de agosto, em Nova York.

O TNP é considerado a "pedra angular" do regime internacional de não proliferação e desarmamento. Todos os membros da comunidade internacional, com exceção de Coreia do Norte, Israel, Índia e Paquistão, são partes do instrumento.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, discursa na abertura da conferência de revisão do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, em Nova York - Ed Jones - 1º.ago.22/AFP

Apesar do clima conturbado devido à guerra movida pela Rússia contra a Ucrânia, existe grande interesse na permanência e no fortalecimento do tratado, o que poderá contribuir para desanuviar o ambiente dos debates. Um dos principais motivos de insatisfação dos países não dotados dessas armas é a ausência de mostras convincentes da intenção dos países armados de adotar medidas eficazes que levem ao desarmamento.

A partir da Conferência de Exame do TNP em 2010, o debate sobre as consequências humanitárias do uso de armas nucleares ganhou força na comunidade internacional. Em 2021 entrou em vigor o Tratado de Proibição de Armas Nucleares (TPAN), que tem 86 signatários, dos quais 62 já o ratificaram. Todos esses certamente desejarão incluir menções positivas ao novo instrumento em um eventual documento final, apesar da forte oposição dos países nucleares.

Nos últimos anos, diversos acordos sobre armas nucleares foram sendo sucessivamente abandonados. Restou apenas o importante tratado Novo START, entre EUA e a Rússia, cuja vigência foi prorrogada por cinco anos em 2021 No entanto, não parece haver clima para novas reduções de armamentos no futuro imediato.

O risco de uso de armas nucleares cresceu significativamente não apenas devido à deterioração do relacionamento entre as principais potências mas também porque novas armas denominadas "táticas" poderiam ser empregadas em ações militares limitadas, o que causaria uma escalada incontrolável.

Austrália, EUA e Reino Unido anunciaram em setembro passado um acordo de segurança que tem sido criticado por muitos países, especialmente a China, por envolver riscos de proliferação de armas atômicas na região. A questão é de interesse para o Brasil, que está construindo um submarino a propulsão nuclear.

Parece extremamente difícil reviver o acordo conhecido pela sigla JCPOA entre o Irã e um grupo de países ocidentais, mas um desfecho positivo das atuais negociações seria um elemento importante para o sucesso da décima conferência.

Para o êxito da conferência será importante desenvolver fórmulas construtivas em relação ao TPAN e às considerações humanitárias que ele incorpora, sem a hostilidade até aqui demonstrada pelos países nuclearmente armados, assim como levar adiante um debate objetivo sobre a complementaridade entre os dois tratados.

Avanços no cumprimento dos propósitos do artigo 6º do TNP serão essenciais para frear e reverter a erosão da credibilidade da arquitetura internacional nesse campo. Sugeriu-se para esse fim a adoção de uma Declaração de Alto Nível que reafirmaria os compromissos assumidos por todos os membros do tratado, especialmente no campo do desarmamento. Algo semelhante teria efeito declaratório significativo, mas é necessário que seja acompanhada por mostras concretas de adesão àqueles compromissos.

A simples repetição de expressões de fidelidade aos objetivos do tratado será provavelmente insuficiente para mitigar antigas frustrações e desconfianças.

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