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Falta de embaixador dos EUA no Brasil mostra problema de Biden no Congresso, diz diplomata

Para Anthony Harrington, Lula teria na Presidência política externa mais ativa que a de Bolsonaro

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Washington

A ausência de um embaixador de fato dos Estados Unidos no Brasil não mostra desinteresse por parte de Washington, mas a dificuldade de articulação no Congresso do presidente Joe Biden, na visão de Anthony Harrington, que ocupou esse mesmo posto entre 1999 e 2001.

O cargo está vago desde julho do ano passado. A indicada por Biden, Elizabeth Bagley, foi barrada no Senado e quem ocupa a função de maneira interina é Douglas Koneff, encarregado de negócios.

Presidente do conselho de administração da consultoria Albright Stonebridge, Harrington pede para não comentar candidatos específicos nas eleições brasileiras —o primeiro turno será realizado no domingo (2)—, mas diz que o presidente Jair Bolsonaro (PL) é "muito pró-EUA".

O presidente Joe Biden em evento na Casa Branca - Oliver Contreras - 28.set.22/AFP

O que não significa que uma eventual eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vá mudar o cenário entre os países. O petista, segundo sua avaliação, "é um internacionalista e seria mais ativo na política externa".

Que avaliação o senhor faz das eleições no Brasil? É preocupante. Há a polarização, também presente nos EUA e nos países vizinhos da América Latina. Mas, até agora, o desempenho de instituições brasileiras, especialmente o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, têm respondido aos desafios, e o Congresso está em linha com a democracia. De fora, parece que as instituições estão funcionando da maneira como se imaginaria em um país do porte do Brasil. Ao mesmo tempo, o setor privado e organizações da sociedade civil tomaram a iniciativa de se posicionar em defesa de democracia. Tudo isso é muito encorajador. As pesquisas mostram que a maioria dos brasileiros confia no sistema eleitoral.

Temos visto uma movimentação por setores da esquerda no Congresso americano, e o governo Biden também fez manifestações públicas demonstrando confiança no processo eleitoral. Esse tipo de manifestação é efetivo? O governo dos EUA age bem? Sim. O governo tem sua política externa. O secretário Lloyd Austin [Defesa] foi ao Brasil e falou em defesa do processo democrático. A subsecretária Victoria Nuland [chefe de assuntos políticos no Departamento de Estado] também esteve em Brasília e demonstrou confiança no sistema brasileiro. O que eu acho que não precisamos é de ameaças sobre o que pode acontecer [em caso de golpe]. Precisamos de diplomacia.


Acredita que uma eventual eleição de Lula vai mudar as relações entre os países? O ex-presidente Lula é um internacionalista. Pela experiência que vimos durante seu governo, ele viajou o mundo, estabeleceu relações bilaterais muito boas, especialmente sul-sul. Acredito que seria mais ativo na política externa do que o atual governo. Acho que isso vai abrir muito espaço. Ele tem uma equipe que conhece os EUA muito bem; haverá um foco maior no cenário internacional, mas também haverá espaço para os EUA.

Como o sr. compara as relações Brasil-EUA hoje e no período em que foi embaixador? É quase injusto comparar. A relação era extraordinariamente positiva. Fernando Henrique Cardoso e sua família eram amigos próximos da família presidencial [dos Estados Unidos, com Bill Clinton no governo]. Isso facilitava a relação.

Por outro lado, o presidente Jair Bolsonaro sempre foi, desde o começo, muito pró-EUA e interessado em ampliar essa relação. Mas os dois governos hoje estão mais preocupados com as próprias necessidades. Quando eu estava no Brasil, não havia pandemia, não havíamos percebido ainda a ameaça existencial da crise do clima, não tínhamos a polarização e líderes autocratas que temos agora.

Mas Brasil e EUA são as duas maiores democracias do hemisfério, cooperam em múltiplas frentes —militar, na área da saúde. Eu estive envolvido em projetos de investimentos americanos em hospitais brasileiros, na área farmacêutica, parcerias público-privadas. Há o acordo para explorar o posicionamento único no Brasil no lançamento de satélites [no Maranhão]. Estou otimista que consigamos manter ou até fortalecer um relacionamento positivo em meio a esses desafios globais da atualidade.

O ex-embaixador dos EUA no Brasil Anthony Harrington - Divulgação Wilson Center

Ao mesmo tempo o cargo de embaixador no Brasil está vago até hoje. Isso não mostra que o país é menos importante hoje? Temos essa mesma situação em uma série de países. É sinal de problemas em movimentar a agenda no Congresso. Eu conheço bem Elizabeth Bagley. Foi embaixadora em Portugal, tem a vantagem de falar português e longa e respeitada experiência. Não receber a confirmação é mais fator de dinâmica no Congresso do que dela própria. Ela tem capacidade, e se por algum motivo não acontecer [sua nomeação] espero que o governo indique outra pessoa em breve. Temos um ótimo encarregado de negócios, de qualquer forma.


Raio-x | Anthony Harrington

Embaixador dos EUA no Brasil entre 1999 e 2001, é chefe do Conselho de Administração da Albright Stonebridge Group, consultoria para corporações com investimentos no exterior

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