Japão vai investigar Igreja da Unificação, citada por assassino de ex-premiê Shinzo Abe

Entidade de reverendo Moon é acusada de empobrecer fiéis; quase metade dos políticos do partido no poder tem ligação com culto

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Tóquio | Reuters e AFP

O primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida, ordenou nesta segunda-feira (17) uma investigação sobre a Igreja da Unificação, depois que o assassinato do ex-premiê Shinzo Abe trouxe à tona laços entre a entidade e políticos do partido governista.

Kishida instruiu a ministra da Educação e Cultura, Keiko Nagaoka, a preparar um inquérito sobre a organização sob o guarda-chuva da Lei das Corporações Religiosas. "Quero resolver questões relacionadas à igreja", disse ao Parlamento, acrescentando que a investigação deve começar neste ano.

A igreja está no centro das atenções desde a divulgação de que o assassino de Abe teve, entre as motivações para o crime, um ressentimento contra a instituição, acusada de pressionar seus membros a fazerem grandes doações em dinheiro.

Casamento coletivo organizado pela Igreja da Unificação na província de Gapyeong, na Coreia do Sul - Ed Jones - 27.ago.18/AFP

Segundo Tetsuya Yamagami, assassino confesso de Abe, sua mãe foi à falência por causa desses pagamentos. De acordo com a imprensa japonesa, ela vendeu a casa e terrenos para fazer uma doação do equivalente a US$ 700 mil (R$ 3,8 milhões). A Igreja da Unificação afirma que todas as contribuições são voluntárias.

Yamagami também culpou Abe por promover a igreja. O ex-premiê chegou a participar como palestrante pago em um dos muitos eventos organizados pelo grupo religioso.

Após a morte do político, em julho, quase metade dos deputados do LDP (Partido Liberal Democrata), sigla à qual era filiado, divulgaram conexões com a Igreja da Unificação. Kishida, da mesma legenda, afirmou não ter relacionamento pessoal com o grupo, e o LDP fez o mesmo em relação a vínculos organizacionais.

O premiê acrescentou que está levando a sério as alegações de que a igreja deixou seguidores empobrecidos. "O governo esclarecerá a situação, oferecerá medidas de socorro às vítimas e tomará ações para evitar que situação semelhante aconteça novamente", afirmou. Segundo ele, a administração recebeu mais de 1.700 pedidos de ajuda para problemas financeiros e de saúde mental ligados à entidade.

Responsável pela investigação, a ministra da Cultura afirmou que a dissolução da igreja deve ser uma opção para os investigadores, caso se encontrem fatos que justifiquem a medida. Isso retiraria da congregação o status de organização religiosa isenta de impostos.

O apoio ao governo de Kishida está no menor nível desde que ele assumiu o cargo, há um ano, devido à crescente indignação pública pelo fato de membros do LPD ocultarem seus laços com a igreja. O premiê se desculpou por muitos partidários estarem ligados ao culto —reconhecendo que isso minou a confiança pública na sua administração.

Grupo religioso com negócios milionários, a Igreja da Unificação foi fundada em 1954 por Sun Myung Moon. É uma variação da teologia cristã baseada na ideia de que, ao pecar, Adão e Eva falharam no plano divino —e que o mundo precisa de um novo messias, que seria o próprio Moon.

O culto tem a família como pilar fundamental da sociedade e do desenvolvimento espiritual, razão pela qual atribui grande importância ao matrimônio —e é conhecido mundialmente por organizar grandes casamentos coletivos.

Da Coreia do Sul, a instituição passou para o Japão e, no final da década de 1950, começou a se deslocar para o Ocidente. Conseguiu se estabelecer nos EUA, onde Moon morou na década de 1970, e desde os anos 1980 está presente em vários países da América Latina, especialmente no Brasil.

Fieis da Igreja da Unificação protestam em Seul pela cobertura crítica que o culto recebeu da imprensa após a morte de Shinzo Abe - Anthony Wallace - 18.ago.22/AFP

A Igreja da Unificação é conhecida por sua capacidade de captar recursos financeiros, tarefa na qual tem sido muito bem-sucedida no Japão, onde, segundo especialistas, originam-se cerca de 70% dos fundos que administra, estimados em centenas de milhões de dólares.

Críticos afirmam há anos que a instituição é perigosa e questionam a origem das finanças. A igreja diz não aceitar mais doações que causem dificuldades financeiras aos seguidores. Também relata que seus membros vêm enfrentando ameaças de morte desde o assassinato de Abe, em julho.

Moon morreu em 2012, e sua viúva, Hak Ja Han, assumiu a chefia da instituição.

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