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José Eustáquio Diniz Alves

Felizmente, multiplicação generalizada de pessoas está com dias contados

Autodeterminação reprodutiva e fim do consumismo são a chave da sobrevivência e da harmonia entre cultura e natureza

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José Eustáquio Diniz Alves

Doutor em demografia pela UFMG e pesquisador aposentado do IBGE

Em 2011, quando mundo atingiu a marca de 7 bilhões de habitantes, a Folha convidou dois demógrafos para explicar suas visões sobre o crescimento populacional de então. José Eustáquio Diniz Alves tinha uma visão otimista e George Martine, pessimista. Onze anos depois, com o planeta superando os 8 bilhões, ambos foram chamados novamente para contar se mantêm ou revisam sua posição.

Leia abaixo a opinião de Alves e, neste link, a de Martine.

A população mundial era de apenas 4 milhões de habitantes no ano 10 mil antes de Cristo e demorou 12 mil anos para chegar a 1 bilhão de pessoas, por volta de 1800, com crescimento médio de 0,05% ao ano.

Mas depois da Revolução Industrial e Energética, a população acelerou o ritmo de crescimento, atingindo 3 bilhões de habitantes em 1960 e 4 bilhões em 1975, uma variação anual de 2% em 15 anos, a maior taxa média de crescimento da história do homo sapiens.

Pessoas comemoraram as celebrações de um festival em Ile-Ife, cidade da Nigéria - Samuel Alabi - 23.set.22/AFP

De acordo com as projeções da Divisão de População da ONU, no dia 15 de novembro de 2022 a população global vai atingir a marca de 8 bilhões de habitantes, duplicando de tamanho em relação a 1974, mas com taxa de crescimento menor, de 1,4% ao ano nas últimas cinco décadas e abaixo de 1% em 2022. Portanto, a fase de aceleração do crescimento demográfico global passou e já estamos na etapa de desaceleração. As projeções indicam crescimento zero em 2086, com pico de 10,4 bilhões de pessoas.

Em 2087, será inaugurada uma fase inédita de decrescimento da população mundial.

A despeito do alto volume populacional alcançado na modernidade, o lado positivo é que houve avanço qualitativo do bem-estar. Globalmente, a mortalidade na infância (de 0 a 5 anos) era de 43% em 1800 e caiu para menos de 4% atualmente. A expectativa de vida ao nascer estava em torno de 25 anos e praticamente triplicou, devendo chegar a 75 anos em 2030.

Mais de 90% da população mundial estava abaixo da linha de extrema pobreza em 1800 e menos de 10% atualmente. Houve grande avanço na educação, nas condições de moradia, no sistema de proteção social, assim como enorme desenvolvimento da ciência e da tecnologia.

Mas todo o avanço socioeconômico ocorreu de forma desigual e ambientalmente insustentável, pois o progresso humano ocorreu às custas do retrocesso ecológico. O relatório sobre a pirâmide da riqueza, do banco Credit Suisse, de 2022, mostra que 13% dos adultos do mundo concentram 86% da riqueza global e 87% ficam com apenas 14% do estoque de riqueza.

A humanidade já superou a capacidade de carga da Terra, e a sexta extinção em massa das espécies ameaça a biodiversidade do planeta, podendo inviabilizar a sobrevivência dos próprios seres humanos.

Nesse quadro geral, o decrescimento demográfico é uma janela de oportunidade que pode conciliar os direitos humanos e os ambientais. A população brasileira —que cresceu cerca de 50 vezes entre 1800 e 2000— vai atingir o pico na década de 2040 e deve perder 50 milhões de pessoas na segunda metade do século 21. A China terá a população reduzida em mais de 600 milhões de habitantes entre 2023 e 2100.

Felizmente, a multiplicação generalizada de pessoas está com os dias contados. A maior parte dos países do mundo já possui taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição. A autodeterminação reprodutiva e o fim do consumismo são a chave da sobrevivência e da harmonia entre cultura e natureza.

O cenário futuro para o nosso planeta pode ser, idealmente, menos desigual, com mais árvores e menos pessoas e com maior qualidade de vida humana e ambiental.

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