Descrição de chapéu China Coronavírus

Protestos fora da China aumentam pressão sobre política de Covid zero de Xi

Diplomacia de Pequim nega conhecimento de atos no exterior e minimiza manifestações em âmbito doméstico

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Ribeirão Preto

Os protestos contra a política de Covid zero da China se espalharam para ao menos uma dúzia de cidades ao redor do mundo. Trata-se de uma demonstração de solidariedade aos manifestantes do país asiático que, ao longo do fim de semana, protagonizaram a maior onda de desafio ao regime comunista desde que o líder Xi Jinping ascendeu ao poder.

De acordo com levantamento da agência de notícias Reuters, vigílias e protestos, ainda que em pequena escala, foram realizados em cidades da Ásia, da Europa e da América do Norte, como Londres, Paris, Tóquio e Sydney. Os atos têm sido organizados, em sua maioria, por dissidentes e estudantes expatriados.

Manifestante durante protesto contra Covid zero em Pequim, na China - Noel Celis - 28.nov.22/AFP

"Quando vi tantos cidadãos e estudantes chineses saindo às ruas, minha sensação foi de que eles aguentaram muito mais que nós. Agora estamos mostrando apoio a eles do exterior", disse Chiang Seeta, estudante de pós-graduação que organizou um ato em Paris neste domingo (27), com mais de 200 pessoas.

Do lado de fora do Centro Pompidou, na capital francesa, manifestantes depositaram flores e acenderam velas em memória dos dez mortos em um incêndio em Urumqi, uma das maiores cidades da província chinesa de Xinjiang.

A tragédia foi o gatilho para a atual onda de protestos, em parte porque as mortes foram relacionadas às duras restrições impostas para conter a infecção por coronavírus —isoladas em seus apartamentos, as vítimas não conseguiram escapar das chamas.

Autoridades locais negam a relação entre a Covid zero e as mortes no incêndio, mas, assim como no ato em Paris, os manifestantes têm culpado Xi e o Partido Comunista pela sequência de reveses.

Em Tóquio, cerca de 90 manifestantes se reuniram em Shinjuku, uma das estações de trem mais movimentadas da capital japonesa. Segundo a Reuters, os presentes concentraram o foco dos protestos contra a Covid zero no Partido Comunista Chinês.

O local escolhido por centenas de manifestantes em Londres foi a rua em frente ao prédio da embaixada chinesa no Reino Unido. Vídeos publicados nas redes sociais mostram o grupo entoando palavras de ordem e pedindo, em mandarim, a renúncia de Xi.

Horas depois do ato, o premiê Rishi Sunak elevou o tom contra Pequim, citando a detenção de um jornalista da BBC em Xangai.

"A China representa um desafio sistêmico a nossos valores e interesses, e isso se torna mais agudo conforme ela se dirige para um autoritarismo cada vez maior", disse. "Não podemos ignorar a importância de Pequim em muitos assuntos globais [...], mas sejamos francos, a chamada 'era de ouro' [nas relações sino-britânicas] acabou, junto com a ideia ingênua de que o comércio levaria a reformas sociais e políticas."

As pautas dos atos, porém, se mostraram menos beligerantes em outras cidades. Uma das organizadoras de um protesto na Universidade Columbia, em Nova York, disse que questões ainda mais sensíveis para a China, como a independência de Taiwan e as denúncias de violação de direitos humanos de uigures em Xinjiang, devem ficar de fora das manifestações.

Um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, questionado sobre o assunto em entrevista coletiva nesta segunda, disse que Pequim não está ciente de nenhum protesto no exterior pelo fim da política de Covid zero.

Em relação às manifestações em âmbito doméstico, o representante da diplomacia desconversou e disse que a pergunta "não reflete o que realmente aconteceu" e que a China acredita que a luta contra o coronavírus será bem-sucedida com a liderança do Partido Comunista e com a cooperação da população.

Ainda que a chancelaria tenha minimizado a dimensão dos protestos, a resposta do regime se tornou mais visível. Na noite de domingo, o centro comercial de Xangai, cidade mais populosa da China e palco de um severo lockdown entre abril e maio, foi tomado pelo confronto entre policiais e manifestantes. Nesta segunda, parte das ruas foi fechada com barreiras de metal e, de acordo com relatos de comerciantes locais, alguns estabelecimentos receberam ordens de manter as portas fechadas.

A China registrou nesta segunda o quinto recorde diário consecutivo de novos casos de Covid. Foram 40.052, acima dos 39.506 do domingo. As megacidades de Guangzhou e Chongqing, com milhares de casos, lutam para conter surtos, enquanto centenas de infecções foram registradas em outras cidades do país.

Em Genebra, na Suíça, um porta-voz do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU pediu que as autoridades chinesas respondam às manifestações de acordo com leis e padrões internacionais e ressaltou que "ninguém deve ser detido arbitrariamente por expressar pacificamente suas opiniões".

Dos EUA, o Conselho de Segurança Nacional também defendeu o direito à livre manifestação e lançou dúvidas sobre a eficácia das ações chinesas contra o coronavírus. "Achamos que será muito difícil para a China conseguir conter esse vírus por meio de sua estratégia Covid zero."

Mais tarde, o porta-voz John Kirby disse que os americanos apoiam o direito dos chineses de protestar pacificamente e que, por ora, não consideram que as manifestações causarão impactos econômicos.

O chanceler do Reino Unido, James Cleverly, afirmou que Pequim deve prestar atenção à pauta dos protestos, fazendo a ressalva de que atos de desobediência civil na China são raros. "Está claro que o próprio povo chinês está profundamente descontente com o que está acontecendo, com as restrições impostas a eles pelo governo", disse. "São as vozes do povo chinês falando com seu governo, e acho certo que o governo chinês ouça o que essas pessoas estão dizendo."

Devido ao seu alcance territorial —agora para além das fronteiras da China—, a onda de protestos já vem sendo considerada a mais importante do país asiático desde as manifestações de 1989, marcadas pelo massacre da praça da Paz Celestial.

Embora incomuns e rapidamente reprimidos e censurados na China, os atos contra o regime e, especificamente, contra Xi, têm chamado a atenção para Pequim desde a semana que antecedeu o Congresso do Partido Comunista, em que o dirigente foi coroado com um inédito terceiro mandato. Na ocasião, cartazes espalhados em alguns pontos de Pequim chamavam-no de ditador e de traidor.

O regime chinês opta por manter a política de Covid zero, com duras restrições de liberdade e circulação, como sua principal estratégia para conter os efeitos da pandemia —a despeito do impacto econômico e de críticas de entidades como a OMS, cujo diretor-geral classificou as medidas de insustentáveis.

Com AFP e Reuters

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.