Trump anuncia pré-candidatura à Presidência dos EUA em 2024

Ex-presidente enfrenta fase ruim dentro do Partido Republicano após resultados das midterms

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Washington

Mais trumpista impossível. Contrariando as expectativas, conselhos de aliados e pressões internas do Partido Republicano, Donald Trump anunciou na noite desta terça (15), em evento em seu resort de Mar-a-Lago, que vai se candidatar mais uma vez à Presidência dos Estados Unidos.

"Para fazer dos EUA um país grande de novo, anuncio nesta noite minha candidatura para presidente", afirmou, em um salão cheio de apoiadores, com faixas com o lema "Make America Great Again".

Donald Trump, ex-presidente dos EUA, em anúncio de que vai se candidatar novamente ao cargo em 2024 - Jonathan Ernst/Reuters

Adiantando o clima de 2024, o atual presidente, Joe Biden, publicou no Twitter vídeo com críticas à gestão do antecessor com a legenda "Donald Trump falhou com os EUA". A postagem foi feita enquanto ele debatia, na cúpula do G20 na Indonésia, a explosão na Polônia que elevou tensões na Guerra da Ucrânia.

No discurso em que anunciou a candidatura, Trump, que sofreu dois impeachments na Câmara e é alvo de uma série de investigações, atacou a gestão do atual presidente, fez troça de gafes do democrata e afirmou que o país perdeu prestígio desde que ele deixou o poder. "Dois anos atrás éramos uma grande nação, e em breve seremos uma grande nação outra vez."

O anúncio acontece uma semana depois das midterms, eleições de meio de mandato para uma série de governadores, senadores e parte da Câmara. O resultado do pleito foi bem abaixo das expectativas para os republicanos, já que a esperada "onda vermelha" que daria maioria à legenda no Legislativo não veio.

Os democratas mantiveram controle do Senado e na Câmara a situação ainda está indefinida, mas a provável maioria republicana será muito mais modesta do que o esperado.

O ex-presidente reconheceu as derrotas no discurso desta terça —sem questionar o resultado das urnas, como vem fazendo desde 2020 em relação ao pleito que perdeu— e afirmou que os eleitores "ainda não perceberam a extensão e a gravidade da dor que a nação tem atravessado", mas que em 2024, quando concorrerá, "os votos serão muito diferentes."

É justamente Trump quem tem sido apontado como responsável pelo resultado ruim das midterms. Ele não conseguiu eleger nenhum de seus candidatos em estados-chave para controlar o Senado: Pensilvânia, Arizona, Nevada e Geórgia.

Em todos, os candidatos da legenda eram trumpistas ferrenhos, e, com exceção de Nevada, onde Adam Laxalt foi procurador-geral (cargo que por lá é eleito), sem experiência política. A única disputa aberta é a da Geórgia, que tem segundo turno, mas o ex-jogador de futebol americano Herschel Walker passou a ele em segundo lugar.

Também houve derrota de trumpistas nas eleições para governador —a mais recente no próprio Arizona, com a apresentadora de TV Kari Lake— e de candidatos que negam que Trump tenha perdido em 2020.

É claro que o republicano teve também vitórias, mas todas eram de algum modo esperadas, como a eleição de sua ex-secretária de imprensa Sarah Sanders para o governo de Arkansas. Em Ohio, Trump conseguiu eleger ao Senado o autor de best-sellers de finanças JD Vance, um nome novo e fiel.

Mas o inegável desempenho abaixo do esperado fez com que o partido procurasse alguém para culpar. Os republicanos acusam o ex-presidente de impulsionar, com muito dinheiro e capital político, candidatos ruins, radicais de ultradireita e sem experiência, o que afastou moderados na urna.

A mostra mais recente da resistência veio na manhã desta terça. Em um encontro do partido, o ex-governador de Nova Jersey Chris Christie, antigo aliado de Trump, foi fortemente aplaudido ao culpar o político pelo resultado ruim em três eleições seguidas —midterms de 2018 e de agora e nas presidenciais de 2020.

Trump, por sua vez, tentou culpar correligionários, mirando o líder da minoria do Senado. "É culpa de Mitch McConnell", escreveu, criticando endossos do parlamentar no Alasca, por exemplo. "Ele estragou as midterms." Nesta quarta (16), em nova derrota do ex-presidente, McConnell foi reeleito para o posto, batendo o senador da Flórida —e trumpista— Rick Scott.

Na Câmara, o republicano da Califórnia Kevin McCarthy venceu na terça a disputa para liderar o partido e poderá ser apontado, no ano que vem, como novo presidente da Casa.

Com a maré ruim, aliados vinham tentando pressionar o ex-presidente a adiar o lançamento da candidatura. Trump queria tê-la anunciado no meio das midterms, mas foi convencido a aguardar o resultado. Depois, houve a pressão para que esperasse a definição do segundo turno na Geórgia, em 6 de dezembro. Mas Trump ignorou novamente.

Assim, ele busca marcar posição e afastar adversários no partido —mais claramente Ron DeSantis. O governador da Flórida acaba de ser reeleito, com expressiva margem, se consolidando internamente. Trump sabe que o rival é forte e já piscou, em tom de ameaça, que o correligionário não deveria se candidatar contra ele. "Eu diria muitas coisas sobre ele que não são muito lisonjeiras. Sei mais sobre ele do que qualquer pessoa", afirmou à Fox News.

Outra pessoa no caminho é seu ex vice, Mike Pence —hoje tido como traidor por radicais trumpistas por não ter embarcado na tentativa de golpe para impedir a posse de Biden. Ele está em turnê promovendo seu novo livro, "So Help Me God", e tem dado entrevistas indicando que estuda concorrer em 2024. Nesta quarta, disse à Associated Press ter "a sensação genuína de que o povo americano está procurando uma nova liderança".

Há ainda outros nomes com menos tração, como o da deputada Liz Cheney, filha do poderoso ex-vice-presidente Dick Cheney (2001-2009), que foi obliterada e perdeu as primárias do partido neste ano após se posicionar de maneira firme contra o ex-presidente no Congresso.

Mas ainda há um longo caminho até a candidatura de fato, já que os partidos fazem primárias para definir quem estará nas urnas.

Com o anúncio a dois anos do pleito, Trump procura também constranger investigações de que é alvo por envolvimento na invasão do Capitólio e por levar documentos ultrassecretos para sua casa na Flórida quando deixou o cargo —ele quer fazer colar a ideia de que as apurações são uma manobra política do governo Biden contra um adversário eleitoral.

Mesmo que pareça enfraquecido agora, dois anos são uma eternidade no mundo político, e tudo pode acontecer com até 2024, quando Trump terá 78 anos —inclusive ver avançar os processos. Até lá, também precisa encontrar a melhor maneira de conversar com o eleitorado, que se mostrou na última semana menos tolerante a radicais.

De todo modo, ele ainda desfruta de apoio interno. Pesquisa de boca de urna da CNN nas midterms apontou que 77% dos eleitores identificados com o Partido Republicano têm visão favorável do ex-presidente. O número, porém, cai para 30% entre os que se dizem independentes —e para 4% entre os democratas.

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