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Estudo prevê quase 1 milhão de mortes na China com o fim da Covid zero

Relatório da Universidade de Hong Kong apresenta saídas para minimizar cenário, que incluem vacinação e tratamento antiviral

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Igor Patrick
Washington

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Quase 1 milhão de mortes. É esse o número esperado na China após a recente flexibilização das normas de controle da pandemia. A estatística foi apresentada pela Faculdade de Medicina da Universidade de Hong Kong, que considerou a baixa oferta de leitos de UTI e as disparidades entre províncias para atender os casos graves da Covid.

Segundo os pesquisadores, se a China continental reabrir totalmente até janeiro do ano que vem, 965 mil pessoas devem morrer. Para chegar ao número, um programa de computador simulou vários cenários levando em consideração a experiência de Hong Kong, onde um surto de coronavírus infectou ao menos metade da cidade no início do ano.

Pessoas alojadas em camas na parte externa de um hospital em Hong Kong após a lotação dos leitos durante uma das ondas mais graves da doença, no início de 2022 - Peter Parks 16.fev.2022/AFP

O relatório apresenta saídas para minimizar mortes e proteger os mais vulneráveis. Segundo Gabriel Leung, referência em estudos epidêmicos no território e um dos professores que lideraram o estudo, a cobertura vacinal de 85% da população com quarta dose (hoje disponível apenas para maiores de 60 anos) e a disponibilização de antivirais para pelo menos 60% dos infectados poderia reduzir a mortalidade entre 26% e 35%.

  • "Uma saída mais segura da Covid zero dinâmica pode ser alcançada adotando uma abordagem multifacetada que inclui vacinação, tratamento antiviral, saúde pública e medidas sociais e reabertura sequencial", defende o estudo.

Os pesquisadores também defendem que o governo implemente um amplo programa de vacinação até um mês antes da reabertura, concluindo-o em até 60 dias. Além disso, "um grau moderado de medidas para promover o distanciamento social" (isolamentos pontuais e restrição à circulação de pessoas) poderia reduzir a transmissão do vírus entre 47% e 69%.

Como contei na semana passada, a China caminha a passos largos para encerrar a política de Covid zero, desabilitando plataformas de rastreamento de contatos e pondo fim à obrigatoriedade de testes a cada 48 ou 24 horas. A flexibilização acontece após atos em todo o país pelo fim dos lockdowns e a criação de uma tática para coexistência com o vírus.

Por que importa: confiante de que conseguiria reabrir o país quando o índice de vacinação mundial estivesse alto e o coronavírus perdesse força, Pequim não mapeou o cenário em que variantes mais transmissíveis fariam ser impossível controlar totalmente a doença e sacrificou o crescimento econômico e a estabilidade em prol de uma política de contenção da Covid.

O número alto de mortes projetado com a reabertura, porém, assusta e deve causar desgaste político ao Partido Comunista Chinês. Será necessário acompanhar com atenção como os líderes do país vão reagir à situação, após anos de propaganda que mostravam a China como superior ao Ocidente pelo cuidado que teve em controlar a doença.

O que também importa

Um dos principais epidemiologistas da China previu nesta semana que o país deve progredir para o "novo normal" pós-pandêmico já em meados do ano que vem.

Segundo Zhong Nanshan, pneumologista que descobriu o vírus da Sars em 2001 e hoje é um dos principais conselheiros das autoridades sanitárias chinesas, doses de reforço podem impedir um crescimento descontrolado da Covid, e a estratégia será priorizada às vésperas do Ano-Novo Chinês no ano que vem (programado para 22 de janeiro).

"Perguntaram-me quando nossas vidas podem voltar para onde estávamos em 2019. Na primeira metade do ano que vem, depois de março. Não posso garantir, mas a tendência diz que deve ser nessa época", disse Zhong, citado pelo jornal South China Morning Post.

A projeção ressoa as falas de Zhang Wenhong, que, ouvido na semana passada pelo mesmo jornal, disse que Xangai atingirá o pico das infecções pela Covid até janeiro e depois levará entre três e seis meses para um cenário pós-pandêmico.

Um tribunal em Hong Kong adiou para setembro de 2023 o julgamento de Jimmy Lai, fundador do jornal pró-democracia Apple Daily. Ele foi preso em 2021 sob acusações de sedição e conluio com forças estrangeiras para desestabilizar o governo na cidade.

Lai quer ser defendido pelo famoso advogado britânico Timothy Owen, algo que era comum no território, uma ex-colônia do Reino Unido. O governo alega agora, contudo, que permitir estrangeiros em julgamentos de segurança nacional pode colocar em risco o vazamento de "segredos de Estado". O caso então precisará ser avaliado pelo Legislativo em Pequim.

Lai já tinha sido condenado a cinco anos e nove meses de prisão no último sábado por outras acusações. O magnata foi considerado culpado de ter quebrado o contrato de aluguel da sede do jornal ao arrendar parte do prédio a uma empresa de consultoria.

Fique de olho

A visita de Xi Jinping à Arábia Saudita na semana passada selou US$ 50 bilhões em investimentos chineses no país do Oriente Médio. Xi também elevou as relações sino-sauditas ao nível de "parceria estratégica", dizendo em discurso que "a China vê a Arábia Saudita como uma força importante no mundo multipolar e atribui grande importância ao desenvolvimento de laços mais fortes" com o país.

Por que importa: Além da importância estratégica de aprofundar a presença chinesa no Oriente Médio, região historicamente sob as esferas americana e europeia, os acordos têm um segundo motivo importante: a intenção da China em internacionalizar o yuan.

Ele deixou claro em seu discurso na Cúpula do Conselho de Cooperação China-Golfo que a Bolsa de Petróleo e Gás Natural de Xangai seria utilizada para facilitar as negociações em yuan. Lançada em 2016, a bolsa foi criada para ampliar transações no mercado energético.

Contudo, segundo a revista Caixin, a ambição chinesa deve esbarrar em um antigo acordo entre Riad e Washington que proíbe os sauditas de vender petróleo em outra moeda que não o dólar e obriga o país a manter parte das suas reservas em títulos do Tesouro.

O líder chinês Xi Jinping em encontro com o rei Salman bin Abdulaziz Al Saud na Arábia Saudita - Huang Jingwen 8.dez.2022/Xinhua

Para ir a fundo

O Conselho Empresarial Brasil-China lançou nesta quinta (15) um documento em que analisa as transições políticas nos dois países e as oportunidades econômicas advindas do momento para o Brasil. O texto na íntegra pode ser acessado aqui. (gratuito, em português e chinês)

O Centro Brasileiro de Relações Internacionais publicou um extenso artigo da professora Karin Vazquez, que leciona na Universidade Fudan, em Xangai. Ela analisa oportunidades para o desenvolvimento sustentável no Brasil e explora opções de cooperação dentro do Brics. (gratuito, em português)

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