Justiça permite que Reino Unido siga plano de mandar imigrantes a Ruanda

Criticada por grupos de direitos humanos, medida representa vitória para primeiro-ministro conservador, Rishi Sunak

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Londres | Reuters

O Tribunal Superior de Londres atestou nesta segunda-feira (19) a legalidade do controverso plano do Reino Unido de extraditar para Ruanda imigrantes que entrarem no país de forma irregular. Segundo os juízes, o projeto não fere nem a legislação de direitos humanos do país, estabelecida em 1998, nem Convenção das Nações Unidas sobre Refugiados, de 1951, a que a nação subscreve.

A decisão representa uma vitória para o primeiro-ministro recém-empossado, Rishi Sunak, que tem como uma das principais metas de sua gestão lidar com um número recorde de expatriados.

Imigrantes irregulares são enviados de volta à França de ônibus após serem flagrados atravessando a fronteira com o Reino Unido - Daniel Leal - 15.abr.22/AFP

A política de imigração havia sido anunciada em abril, ainda durante o mandato de Boris Johnson. Ela consiste em enviar requerentes de asilo em situação irregular para Ruanda —país que, localizado no centro do continente africano, a 7.000 quilômetros de distância da ilha britânica, tem o 160º pior índice de desenvolvimento humano do mundo.

O projeto horrorizou a oposição, grupos de direitos civis, líderes religiosos e caridades, que o classificaram de desumano. ONU e Anistia Internacional condenaram o plano, e até mesmo o rei Charles 3º teria se oposto à iniciativa, descrevendo-a em uma conversa particular como "aterradora".

Críticos apontaram ainda que a política não leva em conta o fato de que o país africano pode ser extremamente afetado pelas mudanças climáticas nos próximos anos, o que incluiria riscos à segurança alimentar e à saúde da população em geral.

A justificativa oficial do governo é que o projeto dificultaria a vida de organizações criminosas que praticam tráfico humano. Na prática, porém, ela é um aceno ao eleitorado do Partido Conservador, que se opõe a políticas de imigração. A decisão do Tribunal Superior de Londres representa, portanto, um triunfo para Sunak, que hoje lida com altas taxas de inflação e anúncios frequentes de mobilizações e greves.

A vitória na Justiça não significa, porém, que o plano será posto em prática imediatamente. O governo britânico ainda pode enfrentar novas apelações nos tribunais, e a Corte Europeia de Direitos Humanos determinou que nenhuma deportação aconteça até a conclusão do processo legal no Reino Unido. Em junho, liminares da mesma corte concedidas a uma série de imigrantes obrigaram ao cancelamento do primeiro voo com destino a Ruanda a poucas horas de sua decolagem.

ONGs que moveram processos contra o governo junto a imigrantes em situação irregular da Síria, Irã, Albânia e Vietnã declararam que devem apelar da decisão —o Tribunal Superior de Londres volta a se reunir em 16 de janeiro para avaliar novos pedidos que desafiam o veredicto. Outra vitória parcial para os opositores da medida foi que os juízes disseram que o governo precisa considerar as circunstâncias de cada requerente de asilo e levá-las à corte para revisão.

Após o anúncio da decisão, a ministra do Interior britânica, Suella Braverman, afirmou que o foco do governo agora era proceder com a política de deportação "assim que possível", e que ele segue pronto para defendê-la em quaisquer novos processos judiciais no futuro.

Enquanto isso, Yolande Makolo, porta-voz do governo de Ruanda, elogiou a decisão da corte, e disse que seu país deseja oferecer aos imigrantes uma chance para construir uma vida nova.

A pequena nação de 13 milhões de habitantes tem, segundo a agência das Nações Unidas que cuida da temática, "uma política aberta a refugiados" e oferece a eles regularização e permissão de trabalho para se integrarem economicamente. Hoje são cerca de 130 mil pessoas nessa situação, a maioria da República Democrática do Congo e de Burundi, muitas delas vivendo há décadas no país.

Na prática, porém, não é simples acessar esses direitos. Os campos de refugiados, onde vivem 90% dessa população, têm problemas de infraestrutura, especialmente os mais antigos, nos quais as famílias foram crescendo ao longo dos anos sem que houvesse uma adaptação para comportá-las. Refugiados no país também têm sido vítimas das violações de direitos humanos que o governo de Paul Kagame é acusado de impor à população.

O tema da imigração tem dominado a política do Reino Unido com frequência na última década, e é provável que ele volte com força com a aproximação das próximas eleições gerais, marcadas para 2024. Estatísticas mostram que mais de 40.000 imigrantes tentaram entrar na ilha pelo Canal da Mancha este ano, um recorde.

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