O Parlamento da África do Sul rejeitou, nesta terça-feira (13), o relatório de um painel de especialistas que apontava que o presidente do país, Cyril Ramaphosa, teria burlado a legislação ao guardar grande montante de moeda estrangeira em sua fazenda. Com a decisão, o político se livra de um processo de impeachment.
A rejeição já era esperada desde a semana passada, quando o partido de Ramaphosa, o Congresso Nacional Africano (CNA), decidiu apoiar o presidente no Parlamento. Como a legenda tem maioria confortável na Casa, eventual afastamento dependeria do apoio dos próprios correligionários.
No início da sessão desta terça a oposição pediu que os votos fossem secretos, o que facilitaria defecções entre parlamentares do CNA, mas a solicitação foi negada.
Ainda assim, cinco congressistas da legenda votaram a favor do impeachment; entre eles, Nkosazana Dlamini-Zuma, ex-mulher do antecessor de Ramaphosa, Jacob Zuma. Outros três não estavam no Parlamento quando foram chamados a votar, inclusive a ministra do Turismo, Lindiwe Sisulu. Ao todo, 214 deputados votaram contra o impeachment, 148 a favor e 2 se abstiveram; a Casa tem 400 assentos.
O resultado pode fortalecer o presidente num momento em que o CNA se prepara para dar início à disputa pela liderança do partido e o candidato no pleito de 2024. O político chefia a sigla hoje e deve tentar a reeleição —mas o desgaste nesse processo poderia influenciar a escolha.
Um porta-voz de Ramaphosa disse que ele considera que a decisão do Parlamento reafirmou o compromisso da Casa com o devido processo legal. A oposição, por sua vez, afirmou que contestaria a votação na Justiça.
As suspeitas contra o presidente começaram em junho, após o ex-chefe de espionagem do país acusar Ramaphosa de lavagem de dinheiro e corrupção em decorrência do encobrimento de um roubo na fazenda do político —o caso foi apelidado de "farmgate" e Phala Phala, nome da propriedade.
Arthur Fraser disse que ladrões invadiram o local em fevereiro de 2020 e fugiram com ao menos US$ 4 milhões em dinheiro, quantia que estaria escondida em móveis como um sofá. Ramaphosa não teria prestado queixa do assalto, o que levantou especulações na imprensa local. Até aqui, a origem da quantia permanece incerta, mas a possibilidade de haver relação com eventuais episódios de corrupção deu gás para parlamentares da oposição contestarem a legitimidade do político no cargo.
Ramaphosa, que por ora não foi formalmente acusado de nenhum crime, nega irregularidades. Ele alega que o dinheiro é proveniente da venda de búfalos e que a quantia roubada é bem menor do que a reportada por Fraser —seria de US$ 580 mil, mas o relatório votado no Congresso contestava a informação.
Fato é que as suposições chegaram ao CNA, que governa a África do Sul desde 1994, quando o regime de apartheid na África do Sul acabou e Nelson Mandela foi eleito presidente. Há quase 30 anos, as brigas políticas na nação africana se baseiam, principalmente, nos bastidores do partido.
No último dia 5, quando o Comitê Executivo Nacional da sigla anunciou que apoiaria o presidente, o tesoureiro-geral Paul Mashatile disse que a decisão não havia sido unânime.
Apesar da decisão, era incerto se os 230 parlamentares do CNA votariam da mesma forma. Até por isso, o partido tentou conter filiados que se manifestaram publicamente contra Ramaphosa. Carl Niehaus, ex-porta-voz de Mandela e membro da sigla nos últimos 43 anos, por exemplo, foi expulso na segunda-feira, acusado de má conduta.
A sessão desta terça impediu a ida do presidente aos EUA, que recebem nesta semana dezenas de líderes do continente na Cúpula de Líderes EUA-África. Ramaphosa enviou ao evento sua ministra de Relações Exteriores, Naledi Pandor.
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