Deputados dos EUA planejam pedir à Casa Branca deportação de Bolsonaro

Democrata Raúl Grijalva diz à Folha que Biden tem chance de 'permitir que ex-presidente seja responsabilizado por ataque à democracia'

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São Paulo

Deputados americanos pretendem se reunir nesta semana para discutir um pedido de deportação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que está na Flórida desde o final do ano passado. O democrata Raúl Grijalva afirmou à Folha que boa parte da bancada do partido apoia a ideia de tirar o líder de extrema direita do país para que ele possa ser investigado e eventualmente julgado por seu papel nos ataques contra a democracia no Brasil.

A ideia é pedir à Casa Branca que inicie o processo. "É preciso tirar Bolsonaro dos EUA para que enfrente no Brasil as consequências de ter instigado os ataques à democracia no Brasil, de forma semelhante ao que o ex-presidente Donald Trump fez nos EUA e que culminou [na insurreição] no Capitólio", diz Grijalva. "Os brasileiros e a democracia do país têm o direito de julgar a responsabilidade de Bolsonaro."

O deputado democrata Raúl Grijalva participa de audiência na Câmara dos EUA, em Washington
O deputado democrata Raúl Grijalva participa de audiência na Câmara dos EUA, em Washington - Bonnie Cash - 29.jun.22/Reuters

Outros dois congressistas pediram publicamente a deportação de Bolsonaro —Joaquín Castro, que representa a minoria democrata no Comitê de Hemisfério ocidental, e Alexandria Ocasio Cortez, conhecida como AOC. À CNN americana Castro afirmou que "os EUA não deveriam ser um refúgio para o autoritário que inspirou terrorismo doméstico no Brasil". Já AOC, no Twitter, escreveu: "Os EUA precisam deixar de dar guarida a Bolsonaro".

De acordo com Grijalva, para que Bolsonaro seja deportado, basta uma decisão da Casa Branca e do Departamento de Segurança Interna, órgão que, de acordo com o democrata, decide "deportar inúmeras pessoas todos os dias, inclusive brasileiros pedindo refúgio com motivos legítimos para tal, mas que estão encurralados na fronteira com o México".

O presidente Joe Biden, aliás, está em viagem justamente ao vizinho ao sul, para uma cúpula de líderes da América do Norte.

"O ex-presidente do Brasil não deveria ter o luxo de estar de férias nos EUA, tirando fotos da Flórida e fingindo que não está envolvido nos ataques à democracia. Ele precisa ser responsabilizado", afirma Grijalva. "Devemos fazer com ele o que o governo Trump sempre fazia com migrantes: removê-lo do país."

O democrata afirma que essa seria uma oportunidade para Biden provar que sua defesa da democracia é consistente. O presidente americano deve realizar a segunda edição da Cúpula para a Democracia, nos EUA, no final de março. "O que aconteceu no dia 6 de janeiro de 2021 nos EUA está sendo exportado, e o Brasil é o exemplo mais gritante; Biden deveria enviar a mensagem de que estamos comprometidos com a defesa da democracia não apenas no nosso país."

Para o congressista, as ligações entre as duas insurreições são inegáveis –elas compartilham a mesma narrativa de eleição roubada e fomentam ressentimentos políticos e culturais, além de mentiras que "criaram o que vimos neste domingo em Brasília e o que vimos no 6 de Janeiro", episódio que acaba de completar dois anos.

"Os esforços para responsabilizar Trump no sistema judicial dos EUA por seu papel nos ataques contra o Capitólio continuam. Até agora, ele conseguiu evitar a responsabilização."

Grijalva diz ainda que a extradição também seria uma opção, caso o governo brasileiro faça um pedido. "O Brasil tem uma democracia que merece ser defendida, e estamos prontos para ajudar."

Bolsonaro, de todo modo, disse nesta segunda que pretende antecipar seu retorno ao Brasil, depois de ter sido internado em Orlando com dores abdominais —em entrevista à CNN Brasil, o político afirmou que está bem.

"Essa já é a minha terceira internação por obstrução intestinal grave. Vim passar um tempo fora com a família, mas não tive dias calmos. Primeiro, houve esse lamentável episódio ontem [domingo] no Brasil e depois essa minha internação no hospital", disse. "Eu vim [aos EUA] para ficar até o final do mês [janeiro], mas pretendo antecipar minha volta. Porque, no Brasil, os médicos já sabem do meu problema de obstrução intestinal por causa da facada. Aqui, os médicos não me acompanharam."

Em ataque à democracia brasileira, manifestantes extremistas e apoiadores do ex-presidente entraram na Esplanada dos Ministérios e invadiram o Palácio do Planalto, o Congresso e o STF (Supremo Tribunal Federal), depredando as sedes dos Três Poderes na capital federal.

Os atos golpistas provocaram repúdio de uma série de líderes internacionais e, nos EUA, de autoridades da diplomacia e do Congresso. O senador Bob Menendez, presidente do Comitê de Relações Exteriores do Senado americano, disse que a ação foi incitada por Bolsonaro, a quem chamou de demagogo.

"Condeno o ataque ultrajante aos edifícios do governo no Brasil incitado pelo desrespeito imprudente do demagogo Bolsonaro aos princípios democráticos. Dois anos após o 6 de Janeiro, o legado de Trump continua a envenenar nosso hemisfério", escreveu o democrata nas redes sociais.

O senador democrata Chris Murphy também associou o ataque no Brasil à invasão do Capitólio. Em 6 de janeiro de 2021, insuflados pelo então presidente Donald Trump, manifestantes invadiram o prédio do Legislativo americano em uma tentativa de impedir a certificação da vitória de Joe Biden na eleição de 2020 —o republicano e seus seguidores sustentam até hoje o discurso mentiroso de que o pleito foi fraudado.

"Aqueles que estão tentando derrubar o governo legitimamente eleito no Brasil devem ser responsabilizados, assim como os traidores foram aqui. Os EUA estão com Lula e o estado de direito brasileiro", escreveu Murphy. "Quando os americanos mostram desprezo pela democracia, o desprezo se espalha."

Dois anos após o episódio que representa um dos maiores ataques de todos os tempos à democracia dos EUA, o FBI prendeu mais de 950 pessoas —a investigação é considerada a maior da história do órgão. No Brasil, a Polícia Federal informou que cerca de mil golpistas serão indiciados.

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