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Donald Trump ficou ainda mais radical durante exílio das redes sociais

Ex-presidente dos EUA intensificou discurso de desinformação na Truth Social e agora pode voltar para as maiores plataformas

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Ken Bensinger Maggie Haberman
The New York Times

Em setembro, Donald Trump compartilhou em sua plataforma, a Truth Social, uma imagem dele próprio usando um broche com a letra Q e uma frase associada ao movimento de teoria conspiratória QAnon: "A tempestade está chegando".

Assim, Trump garantiu que a mensagem –postada inicialmente numa conta alinhada ao QAnon— fosse amplificada para seus mais de 4 milhões de seguidores. Além disso, endossava o movimento, que afirma falsamente e com violência que democratas de destaque são adoradores do diabo que comem bebês.

O ex-presidente Donald Trump durante ato de campanha em Columbia, na Carolina do Sul
O ex-presidente Donald Trump durante ato de campanha em Columbia, na Carolina do Sul - Logan Cyrus - 28.jan.23/AFP

Na semana passada, a Meta, empresa dona do Facebook e do Instagram, anunciou que Trump será admitido de volta –uma iniciativa que se seguiu à revogação de sua proibição de postar no Twitter, mesmo que ele ainda não tenha voltado para o site. Mas não há sinal algum de que ele tenha freado seus comportamentos ou deixado de divulgar o tipo de mensagem que o levou a ser "exilado" anteriormente.

De fato, dois anos após ter sido expulso das maiores mídias sociais devido à incitação à invasão do Capitólio, sua presença online ficou ainda mais radical –embora muito menos visível para a maioria dos americanos, que nunca usam as plataformas obscuras nas quais o ex-presidente vem postando.

Desde que lançou sua própria plataforma social, em fevereiro de 2022, Trump já compartilhou centenas de posts de contas que promovem ideias do QAnon. Ele continua a insistir falsamente que a eleição de 2020 foi fraudada e a se dizer vítima de agências policiais federais corruptas. E lançou ataques pessoais contra muitos que considera ser inimigos, incluindo cidadãos particulares cujos nomes ressaltou.

Agora seu retorno cada vez mais provável às grandes plataformas sociais levanta a perspectiva de que ele leve seu comportamento mais radicalizado para um público muito maior no Facebook e no Instagram, com um total somado de 5 bilhões de usuários ativos, e Twitter, com 360 milhões.

A possibilidade de isso acontecer preocupa especialistas em extremismo e levou as plataformas a explicar que instalaram barreiras para impedir a publicação de posts incendiários.

Uma eventual volta às redes gerou também questões sobre como as afirmações de Trump, após passar muito tempo restritas à arena de direita, serão recebidas pelos eleitores, especialmente no momento em que uma parcela grande de seu partido assinala uma disposição de seguir adiante à revelia dele.

"Trump não alterou significativamente seu comportamento online. Na realidade, ele se radicalizou ainda mais", diz Jared Holt, pesquisador do think tank Institute for Strategic Dialogue, que estuda tecnologia e extremismo nos EUA. "Acho que ninguém deve esperar que ele seja diferente se voltar ao Facebook e ao Twitter. E, em matéria de disseminar teorias conspiratórias, Trump é o rei."

Steven Cheung, porta-voz de Trump, disse na quinta-feira (26) que "a Truth Social é um sucesso porque o presidente Trump criou uma plataforma que permite a verdadeira liberdade de expressão, diferentemente dos oligarcas das big techs que censuram as vozes conservadoras". E acrescentou: "O presidente Trump nunca deveria ter sido banido dessas plataformas sociais. Todo o mundo sabe que as decisões delas foram injustas e, no fim das contas, destruíram a integridade de nossa democracia."

Em carta enviada neste mês a três dos principais executivos da Meta, incluindo Mark Zuckerberg, o CEO da empresa, um advogado de Trump argumentou que a expulsão dele "distorceu e inibiu o discurso público drasticamente". A petição para a reintegração às plataformas foi programada para coincidir com o segundo aniversário da decisão de bani-lo, tomada um dia após o ataque contra o Capitólio. Na época, a empresa disse que a presença do republicano em suas redes criava um risco para a segurança pública.

Democratas dizem que Trump ainda é perigoso. No mês passado, quatro parlamentares democratas exortaram a Meta a não permitir a volta de Trump, escrevendo em carta que o ex-presidente "ainda está enfraquecendo nossa democracia".

Para tentar impedir Trump de provocar turbulência futura, a Meta disse que vai impedir o compartilhamento de posts que, entre outras coisas, questionem a legitimidade de eleições ou promovam conteúdos do QAnon. Violações de suas políticas também podem levar Trump a ser barrado do site novamente, disse a Meta. Conservadores elogiaram a decisão, e a iniciativa foi defendida pela União Americana de Liberdades Civis (ACLU) e pelo senador Bernie Sanders.

Não há restrições desse tipo impostas a Trump no Twitter, que o barrou pouco após a insurreição no Capitólio mas o autorizou a voltar em novembro passado, depois de Elon Musk, o novo proprietário da empresa, conduzir enquete pública sobre seu possível retorno.

O ex-presidente publicou o primeiro post da Truth Social, na qual ele tem uma participação financeira importante, em fevereiro de 2022: "Preparem-se! Seu presidente favorito verá vocês em breve!"

Ele só retornou depois de dois meses, mas então as comportas se abriram. Trump faz postagens e compartilha posts dezenas de vezes por dia. A atividade é descrita como "truthing" (revelar verdades) e "retruthing" (repostar verdades). No último 31 de agosto, por exemplo, fez mais de 50 postagens em seu site, lançando declarações desvairadas sobre o laptop de Hunter Biden, as urnas eletrônicas da Dominion e supostos vínculos do presidente Joe Biden e da vice Kamala Harris com a Rússia.

Com frequência ele repete mentiras sobre a eleição de 2020. Se Trump retornar às grandes plataformas sociais, aumentarão as chances de candidatos e políticos eleitos do Partido Republicano –que passaram a Presidência dele fugindo de perguntas sobre seus tuítes incendiários— serem pressionados a explicitar o que pensam sobre o que ele diz. Trump também terá que decidir como administrar sua presença na internet. Segundo registros regulatórios, ele tem a obrigação de publicar seus posts exclusivamente na Truth Social e não compartilhá-los em outros sites por seis horas.

Mas há uma exceção significativa prevista nesse contrato que lhe permite postar em outros sites materiais "especificamente relacionados a mensagens políticas, levantamento de fundos para fins políticos ou esforços para mobilizar o voto".

Trump ainda não aproveitou essa brecha, postando exclusivamente para seus 4,8 milhões de seguidores na Truth Social e às vezes repostando esses conteúdos para seus quase 800 mil assinantes no Telegram.

Essas bases são minúsculas quando comparadas a seu alcance potencial em outras plataformas. Uma análise feita em outubro pelo Centro Pew de Pesquisas constatou que só 2% dos americanos usam Truth Social ou Telegram como fonte regular de notícias, contra 28% que usam o Facebook, e 14%, o Twitter.

Os números do próprio Trump destacam essa diferença. Ele tem quase 88 milhões de seguidores no Twitter, e sua conta no Facebook, 34 milhões. Sua página no Instagram, que tendia a dar mais destaque a fotos de família, tem 23 milhões de seguidores.

Segundo pessoas próximas de Trump, ele tem consciência de que seu possível retorno a essas plataformas correria o risco de privar a Truth Social de sua maior atração. Mas, segundo elas, é possível que seu desejo de conseguir mais renda fique em segundo plano diante da atenção enorme que Facebook e Twitter podem lhe proporcionar em sua candidatura a presidente.

Rashad Robinson, presidente da organização de direitos civis Color of Change, diz que a enorme base de seguidores de Trump talvez explique parcialmente a decisão da Meta. "Corporações como o Facebook continuam a encontrar maneiras de lucrar com Trump, mesmo o tendo condenado", diz Robinson, cuja entidade pressionou o Facebook a modificar suas políticas com boicotes a anunciantes. "Não é apenas que elas deixaram Donald Trump voltar à sua plataforma –é que elas se beneficiam disso."

Ele e outros apontaram para o fato de a campanha de Trump ter gastado US$ 89 milhões (R$ 451 milhões) para publicar anúncios no Facebook e no Instagram durante a eleição de 2020 e US$ 56 milhões (R$ 284 milhões) para anunciar no Google e no YouTube. O Google, que também suspendeu Trump do YouTube em janeiro de 2021, não anunciou planos para autorizá-lo a voltar. "O Facebook tem mais seguidores que o cristianismo. Não existe uma comparação em termos de alcance e poder de publicidade."

A Meta se negou a comentar as críticas de Robinson. Mas executivos da empresa destacaram no passado que a publicidade política representa uma fração minúscula da receita total da empresa, que admitiu que nos últimos anos alterou seu algoritmo para dar menos destaque a conteúdos políticos.

É possível que Trump modere sua enxurrada de posts incendiários se retornar às grandes plataformas. Mas ainda é bastante nebuloso se fará isso. Na quarta, ele não deu sinais de estar desacelerando o ritmo: postou ou repostou 19 vezes na Truth Social sobre a eleição de 2020, a mídia noticiosa e o fim de sua "desplataformização", como define, do Facebook. "Uma coisa assim não deveria acontecer nunca mais."

Tradução de Clara Allain

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