Irã retoma rigor maior no controle do uso do véu por mulheres após onda de protestos

Com arrefecimento de manifestações contra o regime, hijab será obrigatório até dentro de carros

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Teerã | AFP

Mais de cem dias após a morte de Mahsa Amini e ante certo arrefecimento dos protestos contra o regime desencadeados pelo episódio, a polícia moral do Irã retomou o controle do uso do hijab pelas mulheres até em veículos, informou nesta segunda-feira (2) a imprensa local.

"A polícia iniciou a nova fase do programa Nazer-1 [vigilância, em persa] em todo o país", informou a agência de notícias Fars, ligada ao regime.

Mulheres com hijab caminham pelas ruas de Teerã
Mulheres com hijab caminham pelas ruas de Teerã - Atta Kenare - 12.jul.22/AFP

O programa tem como objetivo detectar a ausência do uso de hijab para, então, enviar uma mensagem de alerta às mulheres que não estiverem vestidas de acordo com as normas impostas pela teocracia. "Foi detectada a ausência do uso do véu em seu veículo. É preciso respeitar as normas da sociedade e não repetir esse ato", será a mensagem disparada a quem for considerado infrator, segundo a Fars.

A agência informa que, em caso de reincidência no desrespeito às normas, medidas legais e judiciais poderão ser aplicadas. O programa Nazer foi lançado pela polícia moral iraniana em 2020.

A medida deve alterar o comportamento da entidade em relação ao que foi observado nos últimos meses. Ativistas afirmam que, em resposta aos atos desencadeados pela morte de Amini, as autoridades suspenderam a detenção de mulheres que não se vestiam de acordo com as normas.

Relatos também dão conta de que a presença da polícia moral nas ruas se tornou menos frequente. O alívio na repressão seria uma tática do regime para ajudar a arrefecer as manifestações.

Amini foi morta enquanto estava sob custódia da polícia moral, após ser detida por supostamente violar as normas de vestimenta para mulheres no país —autoridades dizem que ela tinha problemas de saúde preexistentes, o que teria provocado o óbito, mas a família sustenta que a jovem foi agredida na prisão.

Diante das manifestações recentes, a União do Povo Islâmico do Irã, principal legenda reformista do país, pediu a flexibilização da lei que obriga o uso do hijab. A sigla, formada por aliados do ex-presidente Mohamed Khatami, pediu às autoridades que preparassem "os elementos legais para a anulação da lei".

Mas a proposta é rechaçada pelo presidente do Irã, o ultraconservador Ebrahim Raisi. Em julho, ele pediu a "todas as instituições estatais" que aumentassem a fiscalização do uso do véu. "Os inimigos do Irã e do islã querem minar os valores culturais e religiosos da sociedade espalhando a corrupção", disse, à época.

Raisi, assim como outros líderes do regime, é alvo dos protestos que desafiam a teocracia do Irã.

Na repressão do regime aos atos, um general iraniano admitiu em novembro que ao menos 300 pessoas morreram, incluindo dezenas de agentes das forças de segurança. Outras milhares foram presas.

Organizações de defesa dos direitos humanos sediadas fora do Irã, porém, apresentam números ainda maiores. Pela conta da agência ativista HRANA, seriam ao menos 507 manifestantes mortos pela polícia e por militares, incluindo 69 menores, além de 66 agentes das forças de segurança. Em relação às detenções, seriam mais de 18,5 mil —a maioria das quais já foi solta, na versão do regime.

Nas contas oficiais, ao menos 13 dos presos acabaram condenados à morte pelo regime –e pelo menos dois já foram executados. Nesta segunda, a ONG Direitos Humanos no Irã, baseada na Noruega, apontou que a Justiça sentenciou mais dois jovens à forca por participação nos protestos.

Mehdi Mohammadifard, 18, foi acusado de incendiar um posto da polícia de trânsito na cidade de Nowshahr. A sentença de morte foi proferida por um tribunal em Sari, que declarou o jovem culpado das acusações de "praticar corrupção na Terra" e "inimizade contra Deus".

Outro manifestante, Mohammad Ghobadlou, 19, também foi condenado à morte, segundo a agência Mizan Online. Ele era acusado de ter ferido, com uma faca, um guarda "com a intenção de matá-lo", além de ter "semeado o terror entre os cidadãos" e "incendiado a sede do governo na cidade de Pakdasht".

A ONG havia informado na semana passada que pelo menos cem manifestantes correm o risco de serem executados. Os primeiros enforcamentos provocaram repúdio internacional, e grupos de direitos humanos pedem que o Irã seja pressionado para evitar novas execuções.

A insatisfação com o regime havia crescido antes mesmo da morte de Amini, com a publicação de vídeos que mostram a polícia moral arrastando mulheres para vans, levando-as à força a centros de reeducação.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.