Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Rússia anuncia conquista de cidade na Ucrânia e abre crise com mercenários

Grupo Wagner diz que Forças Armadas querem roubar crédito pela tomada de Soledar; Kiev nega derrota

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São Paulo

O Ministério da Defesa russo anunciou nesta sexta-feira (13) a tomada da estratégica cidade de Soledar, em Donetsk, proporcionando um trampolim estratégico para tentar controlar toda a província no leste da Ucrânia.

Ainda há pontos de resistência relatados na cidade. "A situação é muito difícil, isso é a batalha de Verdun do século 21", disse o assessor presidencial ucraniano Andrii Iermak, em referência ao ataque alemão à frente ocidental na Primeira Guerra desenhado para "sangrar a França até a morte" —que fracassou.

Os sinais, porém, são de que Soledar de fato caiu. Mas um efeito colateral inesperado veio do poderoso líder do grupo mercenário Wagner, escancarando uma crise militar sob as asas de Vladimir Putin.

Parentes e amigos no funeral do soldado ucraniano Denis Gauchko, morto em Bakhmut, em igreja de Kiev
Parentes e amigos no funeral do soldado ucraniano Denis Gauchko, morto em Bakhmut, em igreja de Kiev - Dimitar Dilkoff - 12.jan.23/AFP

Na quarta-feira (11), Ievguêni Prigojin havia postado uma foto dentro de uma das minas de sal que fazem a fama da vila, que tinha 10 mil habitantes antes da guerra, clamando tê-la tomado somente com suas forças —compostas por muitos condenados retirados de cadeias russas.

O "chef de Putin", apelido do tempo em que sua empresa cuidava dos serviços de alimentação do Kremlin, divulgou uma nota inusual após o anúncio do ministério liderado por seu rival, Serguei Choigu. "Eles constantemente tentam roubar a vitória do Grupo Wagner e diminuir seus méritos. Lutas internas, corrupção, burocracia e autoridades agarradas às suas cadeiras são uma ameaça significativa para a existência [do grupo]", disse.

O comunicado não falava no Wagner, mas o mal-estar ficou. Horas depois, "devido a questionamentos da mídia", a pasta enfim disse que o assalto às áreas de Soledar "foi realizada com sucesso e ações altruístas pelas unidades voluntárias da companhia militar privada Wagner".

Na quarta, Prigojin vira um aliado, Serguei Surovikin, perder o posto de comandante da campanha militar russa para o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Valeri Gerasimov —um dos principais alvos do "chef de Putin" e de outro linha-dura com forças próprias na Ucrânia, o tchetcheno Ramzam Kadirov.

A mexida é mais política que militar, tanto que Surovikin permanece na guerra como um dos três adjuntos de Gerasimov. De quebra, Putin ganha uma figura de proa da Defesa para culpar se as coisas derem errado.

Outra avaliação é que o novo chefe, o número 3 das Forças Armadas, depois do presidente e do ministro, tem maior envergadura como autoridade caso as forças da ditadura da Belarus, ao norte da Ucrânia, entrem na guerra ao lado da Rússia —como diversos movimentos nas últimas semanas sugerem.

O tratamento dispensado ao Grupo Wagner, visto como brutal mas de eficiência tática questionável na Ucrânia, mostra que Putin segue com sua política de estimular rivalidades entre subordinados, permanecendo numa posição imperial.

Politicagem à parte, a conquista de Soledar, se confirmada, é uma vitória importante para os russos, não só pelo controle das ricas minas de sal do local. A partir dali, será possível em tese cortar o suprimento das forças ucranianas em Bakhmut, cidade dez vezes maior que fica 15 km a sudoeste de lá.

Desde outubro, Bakhmut é o centro do que militares ucranianos chamam de moedor de carne de Donetsk, com baixas altíssimas de lado a lado. A cidade, diz o presidente Volodimir Zelenski, foi reduzida a ruínas.

Se cair, as chances de Putin conquistar os talvez 45% restantes de Donetsk que não estão em suas mãos crescem muito, na avaliação do analista militar Ivan Barabanov, de Moscou. A região é uma das quatro anexadas ilegalmente pelo Kremlin em setembro e compõe, com Lugansk o Donbass, a área mais russófona da Ucrânia depois da Crimeia —esta absorvida em 2014.

Nem todo mundo pensa assim. O analista Michael Kofman, do think tank CNA (em Arlington, nos EUA), diz que o custo em vidas e material da ofensiva pode exaurir o esforço russo, apesar do influxo gradual dos 320 mil recrutas convocados no fim do ano passado. Por outro lado, aponta, o mesmo cenário pode acontecer com os ucranianos, que não têm tal capacidade de mobilização.

"Mesmo que Bakhmut e Soledar caiam, isso não terá impacto estratégico na guerra em si e não irá parar os ucranianos", afirmou o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional americano, John Kirby. Ele pode estar certo em sua primeira asserção, mas a segunda é torcida: Kiev tem tido dificuldades de avançar desde que teve uma série de vitórias entre setembro e dezembro.

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