Lula vai apresentar a Biden ideia de 'clube da paz' para Ucrânia com participação da China

Brasileiro falará sobre fórum para negociar fim da guerra, a despeito da rivalidade entre Washington e Pequim

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Washington (Estados Unidos)

Em conversa no Salão Oval da Casa Branca na sexta-feira (10), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende apresentar ao seu homólogo americano, Joe Biden, a proposta de um "clube da paz" para negociar uma saída para o conflito na Ucrânia. O fórum incluiria países como Índia e China –e Lula deve propor a ideia também ao líder chinês, Xi Jinping, em sua visita a Pequim, que acontecerá em março.

O petista quer reunir um grupo de países que, na visão do governo brasileiro, não estão diretamente envolvidos na guerra para discutir uma perspectiva de longo prazo e uma solução para o conflito. O Brasil reconhece que a Rússia foi um país agressor ao invadir a Ucrânia, mas acha que a imposição de sanções e o envio de armas ou munições não ajudarão a chegar na paz.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante cerimônia na sede do BNDES no Rio de Janeiro - Mauro Pimentel - 6.fev.23/AFP

Brasília considera que Pequim estaria entre esses países, ainda que o regime chinês não tenha condenado a agressão da Rússia contra a Ucrânia e tenha optado por se abster em resoluções do Conselho de Segurança da ONU que condenavam Moscou. Recentemente, o embaixador chinês na ONU, Zhang Jung, disse que a guerra é "o resultado de desequilíbrios de segurança de longa data na Europa" e que esses desequilíbrios necessitam de "uma solução política".

Na visão do governo brasileiro, a China é incontornável na negociação de paz. Outros países que devem ser convidados para a iniciativa são a Índia, que não aderiu às sanções ocidentais e aumentou suas compras de petróleo, carvão e fertilizante da Rússia, e a Turquia, que intermediou o acordo para que a Ucrânia voltasse a exportar grãos.

Para um interlocutor, o "clube da paz" proposto por Lula para pôr fim à Guerra da Ucrânia teria de ser como uma negociação para a resolução do conflito entre Israel e Palestina, exemplifica um interlocutor: não poderia ter países diretamente alinhados a nenhuma das partes.

Não está claro de que forma Biden vai receber a proposta de Lula. Washington e Pequim vivem há anos uma escalada crescente de tensões, agravadas mais recentemente pelas disputas comerciais, pela posição americana em relação a Taiwan e até pelo balão chinês que os EUA abateram em seu espaço aéreo.

Nesta quarta-feira (8), John Kirby, do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, disse que a Guerra da Ucrânia estará na pauta da conversa entre os dois presidentes. Enquanto o governo americano articula um novo pacote de armamentos para Kiev na casa de US$ 1,75 bilhão, o brasileiro manteve a política do ex-presidente Jair Bolsonaro de evitar interferência mais direta no conflito e negou pedido da Alemanha para envio de munição a tanques do lado ucraniano.

Questionado pela Folha se a neutralidade do Brasil incomoda Biden, Kirby afirmou que a postura do país é parte de "decisões soberanas que as nações têm de tomar". "E respeitamos isso", disse ele, antes de descrever a guerra como "totalmente desprezível" e deixar clara a posição americana: "Só posso falar pelos EUA. Não acreditamos que seja momento para ‘business as usual’ [agir de modo habitual]".

Lula já havia lançado a ideia de um clube da paz após encontro com o premiê alemão, Olaf Scholz, em 30 de janeiro, em Brasília. Na ocasião, ele disse que o Brasil não tem interesse em enviar munições à Ucrânia porque não quer ter qualquer participação no conflito, mesmo que indireta.

"Temos que criar outro organismo, da mesma forma que criamos o G20 quando ocorreu a crise [econômica] de 2008", disse Lula em entrevista coletiva. "A gente tenta criar, a gente cria um clube ecológico e a gente cria um clube das pessoas que vão querer construir a paz no planeta." O presidente disse que Pequim poderia ter um papel importante para intermediar o fim do conflito. "Está na hora de a China colocar a mão na massa e tentar ajudar a encontrar a paz entre Rússia e Ucrânia."

A divergência em relação à abordagem brasileira da guerra se estende também à Europa. "Deixe-me ser muito clara: existe um país que foi atacado, a Ucrânia, e um agressor, a Rússia", disse em entrevista à Folha a chanceler da França, que foi a Brasília nesta quarta-feira (8) em viagem preparatória para a visita do presidente francês, Emmanuel Macron. "Ao promover uma guerra ilegal contra um país soberano e independente, a Rússia, membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, violou deliberadamente os princípios da Carta das Nações Unidas. Ao mirar deliberadamente a infraestrutura civil, a Rússia está cometendo crimes de guerra. É nossa responsabilidade garantir que esses crimes não fiquem impunes."

Lula chega a Washington nesta sexta, acompanhado dos ministros Mauro Vieira (Relações Exteriores), Fernando Haddad (Fazenda), Marina Silva (Meio Ambiente) e Anielle Franco (Igualdade Racial), além do assessor especial Celso Amorim. Também viajam o secretário do Ministério do Desenvolvimento Econômico Marcio Elias Rosa e o senador Jaques Wagner.

Ele se hospedará na Blair House, residência do governo americano em frente à Casa Branca onde ficam chefes de Estado estrangeiros. O brasileiro afirmou que preferia ficar em um hotel, mas foram levadas em conta questões de segurança, devido à agressividade de alguns apoiadores de Bolsonaro e à possibilidade de manifestações. Na Blair House, o esquema de segurança não permite nenhum tipo de protesto não pacífico, e o acesso à praça onde fica a residência costuma ser restringido durante a visita de delegações estrangeiras.

No local, o petista receberá o senador americano Bernie Sanders de manhã e se encontrará com deputados do Partido Democrata logo depois. À tarde, participa de encontro com representantes da AFL-CIO (Federação Americana de Trabalho e Congresso de Organizações Industriais), maior central sindical do país. Depois, será recebido por Biden na Casa Branca. Ele volta ao Brasil no sábado (11).

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