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Por que é tão difícil prever um grande terremoto como o que atingiu a Turquia?

Milhões de tremores, de diferentes intensidades, ocorrem todos os anos, mas não notamos todos eles

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BBC News Mundo

Todo ano são registrados oficialmente mais de 200 mil terremotos em nosso planeta, apesar de, na verdade, milhões deles ocorrerem nesse mesmo período.

Muitos passam ao largo dos registros oficiais porque são demasiadamente leves para que possamos senti-los ou porque acontecem em zonas remotas que não são monitoradas pelas autoridades.

Outros, como o de magnitude 7,8 que atingiu e deixou vítimas na Turquia e na Síria nesta segunda-feira (6), deixam milhares de mortos e um rastro de destruição.

Pessoas próximas a prédios que desabaram na cidade de Kahramanmaras, na Turquia
Pessoas próximas a prédios que desabaram na cidade de Kahramanmaras, na Turquia - Agência Ihlas News via Reuters

Construir casas e edifícios à prova de terremotos é, evidentemente, a melhor estratégia para evitar tanto perdas humanas quanto materiais. Mas seria possível retirar moradores com antecedência de áreas que serão afetadas —como acontece durante a passagem de um furacão, por exemplo? A resposta é não. Isso porque é impossível prever quando um terremoto vai acontecer —salvo por alguns minutos.

Lei física

A razão é que a maioria dos terremotos ocorre pela liberação repentina de uma grande tensão na crosta terrestre. Essa tensão vai se acumulando gradualmente devido aos movimentos das placas tectônicas, normalmente ao longo de uma falha geológica, explica o site da British Geological Survey.

Por isso, é impossível prever quando os terremotos vão ocorrer, "basicamente pela forma como essa energia é liberada", afirmou à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC, Richard Luckett, sismólogo da instituição. "Sabemos que a tensão está sendo acumulada nas grandes falhas e sabemos onde elas estão, mas não temos como saber quando essa energia será liberada", diz.

Luckett recorre ao exemplo que usa para explicar o fenômeno às crianças. "Se você puser um tijolo sobre uma lixa e lentamente retirá-la com algo, o tijolo vai se mover. Você pode repetir esse experimento dez vezes: embora aplique todas as vezes a mesma força, verá que o tijolo vai se movimentar repentinamente depois de diferentes intervalos de tempo", diz ele. "Em termos físicos, é completamente imprevisível."

Saber se uma placa tectônica onde um país está acumula pressão "não ajuda a prever sismos, pois não sabemos quando essa energia será liberada", diz. O que especialistas podem indicar é onde há a chance de ocorrer um terremoto de grande intensidade, "já que eles têm relação com o tamanho da falha".

Mesmo assim, isso não contribui para prever qual será a intensidade de um terremoto, já que a pressão pode ser liberada em uma série de pequenos tremores ou em um grande e único abalo.

No caso do evento que causou danos na Turquia e na Síria foram dois fortes tremores seguidos.

Sinais?

Mas há outros sinais a que devemos ficar atentos? Talvez uma mudança no clima ou o comportamento dos animais podem nos ajudar a prever um terremoto? Acredita-se que os animais possam sentir as primeiras ondas geradas pelo terremoto —e que nós não percebemos.

"Os terremotos não têm nada a ver com o estado do tempo e certamente não há uma ligação com as mudanças climáticas", esclarece o especialista. "São sistemas completamente diferentes", acrescenta.

Mas, segundo ele, o caso dos animais é interessante. Há uma série de estudos sobre como alguns bichos exibem um comportamento distinto ante a iminência de um terremoto.

Diz-se, por exemplo, que os cachorros latem mais ou que os animais de forma geral fazem mais barulho.

Segundo Luckett, "quando um forte terremoto acontece, provoca ondas distintas que viajam através da terra. As primeiras são pequenas, não causam dano, e muitas vezes nem sequer percebemos", explica. "Mas os animais, sim." Ainda assim, eles não ajudam a prever um terremoto. "Os animais sentem essas vibrações, mas isso ocorre uma vez que o terremoto já aconteceu", assegura o especialista.

"Eles nos avisam do perigo um pouco antes [o tempo depende do intervalo entre as ondas pequenas e as grandes], assim como os alarmes. Neste sentido, os dispositivos são mais sensíveis que os animais."

Luckett diz não acreditar que será possível prever terremotos. "O que poderemos fazer é aprimorar nossas formas de detectá-los."

Outras técnicas analisadas

Especialistas em geofísica têm se concentrado, entre outras áreas, nos chamados "terremotos lentos".

São "deslizamentos que ocorrem em uma falha geológica, em geral, e em particular nas zonas de subducção entre duas placas que estão em contato", explica Víctor Cruz-Atienza, pesquisador do Instituto de Geofísica da Universidade Nacional Autônoma do México.

Ele e seus colegas publicaram em 2021 um estudo sobre esse tipo de terremoto que ocorre em certas regiões sísmicas, como a do sudeste mexicano, onde duas placas interagem.

Diferentemente dos tremores que sacodem a superfície, os terremotos lentos liberam energia pouco a pouco durante semanas ou meses, o que os torna imperceptíveis e nada destrutivos.

Mas especialistas afirmam que estudá-los é muito importante para entender como os terremotos são gerados. Embora um tremor lento nem sempre antecipe um "normal", é um fator a ser levado em conta.

Em 2018, outros pesquisadores usaram com sucesso na Islândia um cabo de comunicações de fibra ótica para avaliar a atividade sísmica. O método testado pela equipe liderada por Philippe Jousset, do Centro Alemão de Pesquisas em Geociências (GFZ), com sede em Potsdam, usou 15 km de cabo de fibra ótica originalmente instalado em 1994 entre duas usinas de energia geotérmica na Islândia.

Um pulso de laser enviado por uma única fibra do cabo foi suficiente para determinar se havia alguma interferência. Quando o solo e, consequentemente, o cabo se esticou ou se comprimiu, os pesquisadores conseguiram gravá-lo. Eles detectaram o tráfego local, a atividade sísmica e até mesmo os pedestres que passavam. Também captaram o sinal de um forte terremoto na Indonésia.

O instrumento que deve ser anexado a cada cabo para tornar o monitoramento possível ainda é caro, mas os pesquisadores trabalhavam em alternativas acessíveis.

Este texto foi publicado originalmente aqui.

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