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07/09/2011 - 13h14

O 11 de Setembro e o milagre chinês

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MINXIN PEI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os historiadores debaterão incessantemente se o 11 de setembro mudou mais os Estados Unidos ou o mundo.
Mas concordarão quanto a uma coisa: a ascensão da China teria sido muito menos espetacular caso o 11 de setembro não houvesse ocorrido. O contraste entre o poderio econômico chinês em 2001 e o atual desperta atenção para uma questão: como a China pode ter ganho tanta influência econômica e geopolítica em apenas uma década?

Os números contam uma história convincente. Em 2001, o Produto Interno Bruto (PIB) chinês era de 9,6 trilhões de yuan (US$ 1,16 trilhão); em 2010, havia quadruplicado, para 39,8 trilhões de yuan (US$ 6,04 trilhões pela taxa de câmbio corrente).

No mesmo período, o comércio externo chinês quase sextuplicou, de US$ 500 bilhões para US$ 3 trilhões. As reservas cambiais do país explodiram, de US$ 212 bilhões em 2001 a US$ 3,2 trilhões em julho de 2011.

Tendo em conta as dimensões desse crescimento, Pequim pôde quadruplicar seus gastos militares. O orçamento oficial de defesa disparou de US$ 17 bilhões em 2001 a US$ 78 bilhões em 2010 (e os gastos militares reais são muito mais altos).

Os chineses mesmos sem dúvida gostariam que todos acreditassem que teriam se saído igualmente bem sem o 11 de setembro. Argumentariam, por exemplo, que a economia chinesa, com seu índice elevado de poupança e mão-de-obra barata e abundante, estava posicionada para um rápido crescimento bem antes do 11 de setembro. E existe um elemento de verdade nisso.

Mas dada a posição central que os Estados Unidos ocupam em termos de crescimento e segurança nacional, com relação à China, é difícil imaginar que o 11 de setembro, e as guerras a que ele conduziu subsequentemente no Afeganistão e Iraque, não tenham beneficiado a China, tanto em termos geopolíticos quanto economicamente.

Uma maneira pela qual o 11 de setembro mudou a China foi ao desviar o foco estratégico norte-americano.

Antes que os terroristas da Al Qaeda derrubassem as torres gêmeas do World Trade Center, uma década atrás, os neoconservadores do governo do presidente George W. Bush estavam completamente obcecados com a ascensão da China.

Propunham uma estratégia de contenção contra Pequim. E os neoconservadores evidentemente se viram forçados a desviar suas atenções depois do 11 de setembro. Sem os ataques, o relacionamento entre Estados Unidos e China teria sido muito mais contencioso, até mesmo hostil.

A concorrência estratégica resultante entre China e Estados Unidos teria produzido muitos efeitos adversos para os chineses. Pequim teria sido forçada a dedicar mais recursos a rebater os esforços norte-americano para conter a ascensão chinesa. Washington concebivelmente poderia ter adotado uma estratégia mais belicosa a fim de limitar os ganhos de influência da China na América Latina e África, e os esforços chineses para conquistar segurança em termos de demanda de recursos naturais teriam encontrado menos sucesso.

Outra maneira pela qual os Estados Unidos poderiam ter dificultado a vida da China seria na forma de apoio concreto, e não apenas retórico, aos vizinhos hostis do país. Por exemplo, sem o desperdício de mais de US$ 1 trilhão no Iraque e Afeganistão, Washington teria muito dinheiro para reforçar seus elos com a Índia e o Vietnã, amargos rivais regionais da China.

Sem o 11 de setembro, o poder de negociação norte-americano com relação á China teria crescido e não declinado, em termos relativos. Isso teria permitido que Washington mantivesse uma linha dura crível com relação a Pequim sobre diversas questões bilaterais, especialmente o comércio. A China não teria sido capaz de resistir à pressão norte-americana por uma cotação cambial mais alta para o yuan ou pela redução das barreiras à importação de produtos norte-americanos.

Ainda que o 11 de setembro tenha sido um evento geopolítico, a resposta dos Estados Unidos aos ataques teve efeitos econômicos momentosos. A elevação significativa dos gastos militares, imediatamente depois da aprovação dos imensos cortes de gastos propostos pelo presidente Bush, devastou as finanças públicas do país e transformou um superavit orçamentário em imenso deficit.

Para financiar os cortes de impostos de Bush e duas dispendiosas guerras, os Estados Unidos passaram a captar dinheiro no exterior em escala maciça.

E esse foi o papel assumido pela China.

Quando alguém pergunta "de que modo a China conseguiu acumular US$ 2 trilhões em ativos denominados em dólar no prazo de 10 anos", a resposta não é difícil de encontrar. A interpretação convencional é de que a
China tem um excedente de poupança (devido ao índice elevado de crescimento da economia). Mas esse é apenas um lado da moeda.

Ter poupança elevada mas baixa demanda por empréstimos não beneficiaria a China. Então surgiram os Estados Unidos pós-11 de setembro, que queriam reduzir impostos, derrotar o terrorismo e derrubar as piores ditaduras, tudo ao mesmo tempo.

Assim nasceu a relação de co-dependência econômica entre os Estados Unidos e a China: os imensos rombos no orçamento de Washington criavam forte necessidade de captação; a China podia emprestar aos Estados Unidos a maior parte do dinheiro arrecadado com seu florescente comércio externo, para financiar a bolha econômica e a guerra contra o terrorismo, mas sob uma condição: que os norte-americanos não se queixassem muito da taxa de câmbio subvalorizada da moeda chinesa.

A combinação entre o yuan baixo e a bolha econômica alimentada pelo crédito barato reforçou a demanda norte-americana por produtos chineses de exportação, e isso propeliu o crescimento chinês. E é esse o quadro final: se não tivesse acontecido o 11 de setembro, o milagre econômico chinês tampouco teria ocorrido.

MINXIN PEI é professor de governança no Claremont McKenna College, nos EUA.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

 

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