Betty Lago: Escolho a vida
Numa tarde chuvosa aqui no Rio, me encontro diante do computador com a missão de escrever sobre Angelina Jolie versus câncer. Talvez seja o assunto mais comentado nesta semana, não só no Brasil, mas mundo afora.
Aceitei a incumbência muito pelo fato de ter tido câncer, e de como isso transformou a minha vida. Mas isso é uma outra conversa. Voltemos a Angelina e sua atitude cheia de coragem.
Sua mensagem é clara. Viver, ser mãe e alertar milhares de mulheres sobre mais possibilidades para evitar contrair essa terrível doença, o câncer de mama, que, segundo a Organização Mundial da Saúde, mata 458 mil mulheres por ano. Número devastador.
Podemos mudar essa estatística. Não de uma forma banal ou desinformada. Nem achando que a solução seja a mastectomia, porque a maior estrela do planeta Terra a fez. Mas nos informando, pesquisando e ajudando aqueles que têm menos acesso e menos recursos também.
Todos deveriam ler o artigo publicado no jornal "The New York Times", escrito por Angelina Jolie. Ele se chama "My medical choice" ("Minha escolha médica"), mas deveria se chamar "Escolho a vida". É bem escrito, simples, direto e cheio de amor. Me emocionei.
Inesperado? Sim e não. Sempre fui fã com o distanciamento de quem não quer ser tiete. Afinal de contas, não pega bem. Mas sempre fui muito mais fã do lado humanitário de Angelina, de sua disposição e força para fazer diferença num mundo cada vez mais indiferente a tudo.
Nesta semana, perguntei-me inúmeras vezes se teria coragem de fazer uma mastectomia e depois vir a público com tanta tranquilidade, mesmo que seja apenas aparente.
A resposta que encontrei dentro de mim mesma foi sim. Sim, teria coragem de fazer essa cirurgia. Pela vida, pelos filhos, pelos netos que quero conhecer.
E também escreveria sobre o assunto, porque aprendi com o Reynaldo Gianecchini, bem antes da Angelina, que falar sobre o assunto, além de ajudar aos outros, ajuda a nós mesmos.
No meu caso, falei pouco porque fiquei mais concentrada no tratamento do que em falar sobre ele. Tenho a sorte de ter uma família incrível, amigos pacientes e carinhosos e médicos mais incríveis ainda.
Meu câncer foi na vesícula, e aconteceu muito pelo fato de eu ter protelado a retirada da mesma. Sempre tinha uma novela para fazer, uma viagem incrível depois da novela e depois mais novelas e mais viagens...
Como? Não existe viagem mais incrível do que estar viva e com saúde. Mas isso eu não tinha a capacidade de enxergar, porque, sem querer, me acreditava imortal.
Nós vamos vivendo e nem percebemos o tempo passar. Não enxergamos nossa vulnerabilidade, ou não queremos enxergá-la. Clichê? Sim, mas é a pura verdade.
A atitude de Angelina foi um wake up call, não só para o universo feminino, mas para todos nós, seres humanos, cheios de medos e preconceitos.
Claro que o fato de ter Brad Pitt como seu partner e de ser bilionária ajuda. Mas como disse antes, nada pode diminuir o seu gesto.
Long live the queen Jolie.
BETTY LAGO, 57, é atriz e apresentadora
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