Editorial: Pena medieval
Autoridades indonésias executaram o brasileiro Marco Archer Moreira, que enfrentou o pelotão de fuzilamento há uma semana. Outro compatriota, Rodrigo Gularte, pode ter o mesmo destino, talvez no próximo mês.
Ambos levaram drogas para a Indonésia conhecendo a pena que a legislação local reserva para o crime de tráfico. Fizeram a pior aposta de suas vidas –e perderam.
Países sem dúvida têm o direito de elaborar suas leis, e quem as violar em determinada circunscrição estará sujeito às sanções cabíveis. Reconhecer a soberania de Jacarta, entretanto, não interdita discussões sobre as sentenças impostas por seu sistema judicial.
No plano moral, a pena de morte é um fóssil jurídico, uma prática que deveria ser abolida por qualquer país que se pretenda civilizado –e a história o mostra com clareza.
Como descreve Steven Pinker, da Antiguidade ao início da Idade Moderna, quase todas as nações aplicavam prodigamente a punição capital. Mais que isso, cuidavam para que o sofrimento do condenado fosse o maior possível, recorrendo a execuções tão cruéis como a queima na estaca e a crucificação.
Os delitos sujeitos a essa pena eram quase todos, incluindo caça ilegal, falsificação e derrubada não autorizada de árvores.
A partir do final do século 18, as ideias humanistas começaram a ganhar corpo. França e Inglaterra, por exemplo, adotaram mecanismos com vistas a atenuar o sofrimento, como a guilhotina e a forca com patíbulo. Depois, a sanção capital passou a ser reservada apenas para crimes mais graves.
Após a Segunda Guerra, a abolição, ao menos na Europa, veio como uma avalanche. Hoje, naquele continente, apenas Belarus continua executando prisioneiros.
O principal motivo para rejeitar a punição capital é que ela simplesmente não funciona. Ainda que possa ter, em certas situações específicas, algum efeito dissuasório, ela jamais se revelou indispensável para controlar a criminalidade.
As nações com as menores taxas de homicídio e de outros delitos estão na Europa ocidental, onde a pena de morte deixou de ser aplicada há décadas.
Além disso, quando se consideram a possibilidade de erros judiciais e a irrevogabilidade de uma execução, o princípio da prudência exige que o Estado jamais penda para o irremediável.
O governo brasileiro fez bem em insistir no pedido de clemência; infelizmente descobriu que, em termos civilizacionais, a Indonésia estacionou na primeira metade do século 19 –e não faz nenhum esforço para agir como a democracia moderna que pretende ser.
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