Saúde pública na berlinda

Crédito: Zanone Fraissat/Folhapress SAO PAULO/SP BRASIL. 17/01/2018 - Parque linear em Mairipora, cidade epicentro da crise da febre amarela em São Paulo.(foto: Zanone Fraissat/FOLHAPRESS, COTIDIANO)***EXCLUSIVO***
Parque linear em Mairiporã (SP), cidade onde começou o surto de febre amarela em São Paulo

Dengue, febre maculosa, leishmaniose, zika, chikungunya, febre amarela, tuberculose e mais várias outras doenças ameaçam o ambiente urbano do mundo moderno, na contramão das expectativas dos anos dos meados do século 20, quando, então, essas seriam doenças erradicadas nas cidades e restariam restritas aos longínquos "sertões. Eis que elas estão de volta, batem às nossas portas.

Por suposto cá não estão por destino traçado pelo divino nem por falta de alerta das autoridades sanitárias. Decorrem da incúria do desenvolvimento econômico em lidar e respeitar o meio ambiente.

Grandes desastres ambientais —lembrem-se de Mariana— e essas doenças resultam do desmatamento sem limites, do aquecimento global, do crescimento urbano desordenado.

Aos serviços de saúde cabem as obrigações éticas de manter a sociedade informada dos eventos causais, prevenir os casos e as mortes, diagnosticar e tratar pacientes. Mas é preciso a participação de todos, de modo relevante a imprensa e entidades de representação.

Quando o ciclo silvestre da febre amarela, como acontece agora em São Paulo, se estabelece em áreas onde a fronteira entre o urbano e a mata é esmaecida, a necessidade de ações de prevenção e de tratamento é urgente e excepcional.

Há mais de uma década, no Brasil, pela destruição das barreiras naturais, a população de macacos que sofre a infecção pelo vírus da febre amarela periodicamente expande-se em direção aos grandes centros como São Paulo, Rio, Minas, Bahia, onde a população não imune é de dezenas de milhões de pessoas.

A principal arma de combate é a vacina desenvolvida em 1936, que contém vírus vivo atenuado, com alguns efeitos colaterais potencialmente graves —ainda que raros—, mas com muita eficiência imunogênica, ou seja, altamente protetora.

Nos últimos dois anos, durante epidemias em países africanos, o uso de doses fracionadas mostrou-se capaz de garantir imunidade de prazo suficiente para se controlar a agudização epidêmica.

Hoje a capacidade mundial de produção da vacina é limitada perante a demanda. No mundo são produzidos entre 70 a 90 milhões de doses por ano, mas devido ao enfrentamento de várias epidemias nos últimos anos os estoques estão reduzidos.

Assim, a Organização Mundial da Saúde, cuja reserva estratégica de 6 milhões de doses se esgotou, recomendou o fracionamento do conteúdo da dose clássica, de forma que seja possível garantir cobertura vacinal adequada das populações em risco que cresceu exponencialmente.

Casos graves de febre amarela não são raros. Surgem após período inicial de infecção branda, seguida de aparente cura. Um contingente importante dos casos evolui com complicações que impõem assistência médica complexa.

Em situações de ameaça grave à saúde de muitos, são fundamentais a transparência das informações pelos órgãos responsáveis pela vigilância epidemiológica; comando unificado na imunização de milhões de pessoas; e, fundamentalmente, apoio dos formadores de opinião, como a imprensa e os profissionais de saúde. Isso tem sido feito. O Brasil vai vencer a febre amarela.

HÉLIO BACHA, médico infectologista, é doutor em doenças infecciosas e parasitárias pela USP

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