Provocou grande polêmica o uso, por parte da Polícia Federal, de algemas nos pés e nas mãos do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, quando conduzido para exame no Instituto Médico Legal de Curitiba.
O episódio gerou questionamentos, e o juiz Sérgio Moro informou ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) que o uso de algemas em réus da Lava Jato não deve se repetir, salvo em circunstâncias muito excepcionais.
No Brasil, a utilização de algemas envolve garantias constitucionais asseguradas pelo Estado de Direito, vinculada a cautelas adotadas para a escolta de presos, sem que se possa resvalar no exagero ou na espetacularização.
O artigo 5º da Constituição Federal estabelece que é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral, de maneira que a aplicação das algemas deve observar, prioritariamente, este princípio.
Sempre houve uma lacuna legislativa acerca desse tema. Desde 1984, a Lei de Execuções Penais (Lei nº 7.210), em seu artigo 199, dispõe que o emprego de algemas será disciplinado por decreto federal, sem determinar, contudo, qualquer regramento.
Somente em 2008, o Supremo Tribunal Federal aprovou a súmula vinculante nº 11, estabelecendo o uso de algemas apenas em determinadas situações excepcionais, desde que justificadas, como em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros.
Naquele mesmo ano de 2008, a lei nº 11.689 incluiu o 3º no artigo 474 do Código de Processo Penal, proibindo algemas durante o julgamento no plenário do júri, exceto se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes.
Todavia, foi somente em 2016 que se regulamentou o tema, pelo decreto nº 8.858, regra geral legislativa em vigor atualmente no Brasil.
Ainda de forma tímida, o artigo segundo estabeleceu que algemas só seriam permitidas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia.
Já o artigo terceiro da mesma norma proibiu o uso em mulheres presas, em qualquer unidade do sistema penitenciário nacional, durante o trabalho de parto, no trajeto da parturiente da unidade prisional até a unidade hospitalar, após o parto e durante o período em que se encontrar hospitalizada.
Inspirada no dispositivo acima, no ano passado a lei nº 13.434 acrescentou o parágrafo único ao artigo 292 do Código de Processo Penal, a fim de proibir que mulheres sejam algemadas durante o parto.
O que se observa de forma unânime nos dispositivos legais mencionados é o caráter excepcional da utilização de algemas.
Na prática, espera-se o bom senso da autoridade ou do agente, em observância aos princípios da dignidade da pessoa humana e da proibição de submissão ao tratamento desumano e degradante, previstos na nossa Constituição Federal.
O debate está longe do final e volta ao Judiciário, à polícia e à sociedade. O emprego inadequado de algemas poderá caracterizar um abuso de autoridade, independente de quem seja o indivíduo algemado.
Não pode ocorrer na condução de réus da Lava Jato nem em qualquer outro caso, devendo sempre o Poder Judiciário punir os excessos, mesmo quando houver o aval da opinião pública.
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