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Renato Sérgio de Lima: Pelo fim dos improvisos na segurança

Há que se mobilizar para reduzir a violência, sem cair em proposta de candidatos 

Soldados do Exército em uma rua de Natal, com pedestres passando ao lado
Tropas do Exército patrulham as ruas de Natal, após pedido de ajuda do governo potiguar - Nuno Guimarães/FramePhoto/Folhapress
RENATO SÉRGIO DE LIMA

Em meio a recentes rebeliões nas prisões, chacinas, tiroteios e paralisações policiais em Goiás, Rio Grande do Norte, Ceará e Rio, soa repetitivo falar do quão ineficiente é o poder público brasileiro. Em todas as esferas, nossos gestores são incapazes de propor soluções para um cenário de medo e violência que ceifa mais de 61 mil vidas anualmente, sobretudo entre os mais pobres, os negros e os jovens, conforme mostram os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Convivemos com patamares ultrajantes de violência letal e sexual, com policiais que morrem e matam em números assustadores, e presos de mais e punição de crimes violentos de menos. O que sobressai é uma enorme desconexão entre o mundo real, os discursos políticos e as práticas institucionais.

Esse cenário letal é usado como refúgio de interesses corporativos, demagógicos e ideológicos daqueles que exploram o medo da população em defesa de projetos particulares de poder e influência. Guerreamos contra "inimigos internos". E a culpa sempre é do outro; ou da falta de dinheiro, ou do poder do crime organizado.

Por tudo isso, fica difícil acreditar nas cobranças de governadores por mais recursos federais; ou na afirmação de ministros de que a União faz a sua parte e que o problema é a corrupção local ou a má gestão estadual; ou nos discursos indignados e pouco objetivos do Judiciário e de congressistas.

Nessa queda de braço, nenhum lado tem razão, pois quase não há planejamento, coordenação e gestão no setor. Ninguém constrói respostas públicas mais integradas e inteligentes, e poucos aceitam assumir compromissos na segurança. Pior: não há lideranças nacionais, e sobra improviso diante das crises.

O Plano Nacional de Segurança Pública, lançado às pressas pelo governo Temer na sequência da crise prisional de 2017 (e vale lembrar, com 70% das ações requentadas de outros planos), completa um ano sem nenhuma ação prática. Foi apresentado como proposta de maior integração e cooperação na área, mas seus resultados foram um documento de Power Point e o sumiço do Ministério da Justiça do debate sobre o tema.

A pasta perdeu espaço para o Ministério da Defesa, pois as Forças Armadas são recorrentemente convocadas para operações de garantia da lei e da ordem, um expediente bastante perigoso, caro e que está sendo banalizado no país.

Com a desculpa da crise fiscal, o Ministério da Justiça abriu mão da articulação das atividades federais e do papel de coordenador e indutor de ações na segurança pública.

Agora, para evitar prestar contas do que não foi feito, o governo Temer promete uma pasta específica para a área, empurrando o problema à espera de um milagre ou de uma nova crise.

Neste ano eleitoral, temos que nos mobilizar para reduzir a violência no Brasil, sem cair na tentação de propostas irresponsáveis de candidatos a salvadores da pátria. Valentias retóricas e promessas mirabolantes não ajudarão em nada.

É hora de promovermos mudanças cidadãs profundas na atual política criminal e penitenciária e revolucionar a governança do sistema de segurança pública, com um novo e mais efetivo pacto federativo e republicano contra a violência.

O ponto de partida para sairmos dessa mórbida letargia seria o reconhecimento de demandas e esforços de vários segmentos sociais. Apenas argumentos técnicos e racionais não bastarão. Precisamos de lideranças e projetos políticos com capacidade de gerar empatia e oferecer uma perspectiva crível de mudança. Vamos tentar?


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RENATO SÉRGIO DE LIMA, professor da Fundação Getulio Vargas, é diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública 

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