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Importunação impune

Faz sentido diferenciar situações de estupro, mas pena de prisão ainda pode ser excessiva

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Mulher vítima de estupro é fotografada na ONG Cruzada do Menor, no Rio
Mulher vítima de estupro é fotografada na ONG Cruzada do Menor, no Rio - Ricardo Borges - 3.jun.2016/Folhapress

Suscitou justificada revolta o caso do ano passado em que um jovem ejaculou sobre uma passageira de ônibus em plena avenida Paulista, região central de São Paulo. Não somente pelo fato repulsivo em si, mas também porque o indivíduo foi libertado por um juiz, segundo o qual não se cometera crime nenhum.

De um ponto de vista técnico, talvez fosse possível encontrar razoabilidade na decisão do magistrado. Impossível discordar, contudo, que a vítima sofreu uma agressão digna de punição.

Sob pretexto de sanar lacunas da legislação sobre estupro que permitem deixar impunes violações como essa, a Câmara dos Deputados aprovou projeto que cria a figura da importunação sexual. A proposição vai agora para a apreciação do Senado.

Pela nova regra, torna-se crime “praticar na presença de alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer sua própria lascívia ou a de terceiro”. 

Se agregar mais um tipo penal à já copiosa legislação brasileira pode auxiliar a diminuir a impunidade, que assim seja. Faz sentido, em tese pelo menos, diferenciar tais situações do estupro —e também de manifestações políticas ou artísticas que envolvam nudez.

De todo modo, a pena de prisão de um a cinco anos ainda parece excessiva, em especial quando não houver violência física ou ameaça grave; sanções alternativas, como multas ou prestação de serviço, parecem mais adequadas.

Convém, ademais, não alimentar expectativas exageradas quanto à capacidade da lei criminal de servir como desestímulo eficaz contra esse tipo de agressão sexual.

Muitos dos atos em questão decorrem de compulsões doentias dificilmente erradicáveis pela mera perspectiva de punição.

Por fim, nem sempre é trivial produzir provas para casos do gênero, principalmente quando não ocorre contato direto entre perpetrador e vítima.

A experiência internacional indica que, nos países onde se introduziram normas similares sobre importunação sexual, como Portugal, Finlândia e Bélgica, a quantidade de condenações tem sido decepcionante.

O Código Penal brasileiro contém diversos exemplos de normas criadas em meio à comoção da opinião pública, não raro inócuas ou exageradas —neste caso elevando desnecessariamente a superlotação dos presídios nacionais.

Entende-se a demanda por punições a essas investidas vergonhosas, em geral contra mulheres. É questão de achar a medida correta.

editoriais@grupofolha.com.br

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