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Pesquisas eleitorais devem sofrer mais restrições? Não

Circulação de informações é fundamental 

Diogo Rais

A intensa e justa preocupação com a busca da igualdade entre os candidatos na campanha eleitoral muitas vezes provoca excessos que, ironicamente, ampliam a desigualdade neste cenário, tornando mais vulneráveis os seus verdadeiros protagonistas: o eleitor e a democracia.

Uma pesquisa eleitoral não se confunde com uma mera enquete ou sondagem; não se trata de um aglomerado de opiniões sem rigor, métodos ou modelos estatísticos consolidados.

Para divulgar o levantamento é necessário registrá-lo na Justiça Eleitoral sob pena de multa que ultrapassa R$ 50 mil. Para efetivar esse registro, é indispensável a transparência no método, além de indicação dos valores e pessoas envolvidas na contratação e de detalhes sobre as amostras, questionários e o procedimento utilizado.

Vista do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília (DF)
Vista do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília (DF) - Folhapress

A pesquisa eleitoral não deveria ser livre de qualquer controle e fiscalização, mas o excesso de restrições poderia desestimular ou tornar ineficaz a sua realização, o que criaria uma arena fértil para a proliferação de desinformação sobre a corrida eleitoral.

Em um cenário tão polarizado e já repleto de notícias falsas, essa diminuição de informação deixaria o eleitor vulnerável, sozinho em cenário incerto e ainda mais confuso a respeito do processo.

Um argumento corrente dos defensores das restrições é que a pesquisa eleitoral manipularia o eleitor, sobretudo no chamado voto útil. Ou seja, o eleitor destinaria seu voto não ao candidato que avalia ser o mais capacitado para o cargo, mas ao candidato com melhor colocação nas pesquisas —em tese, com mais chance de vencer.

A democracia, entretanto, pressupõe não apenas a liberdade do voto mas também a liberdade para que o cidadão decida usando os meios que quiser. Enquanto seus motivos forem lícitos, sua autonomia é plena. 
O que atenta contra a liberdade não é a realização de pesquisa, mas sim sua fraude ou ilegalidade. Para isso, a normatização já prevê controle, fiscalização e punição.


O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) editou uma resolução normatizando a matéria para este ano.

Diferentemente das últimas eleições, exigiu, de modo genérico e abstrato, a restrição temática do questionário das pesquisas. 

Diante da reação a essa medida e atento aos possíveis efeitos colaterais, o TSE revogou esses dispositivos específicos, sob a alegação de que poderiam ocasionar dúvidas razoáveis e insegurança em parte significativa da sociedade. O debate, contudo, permanece. 

O voto livre é indispensável à democracia. O temor de interferência nessa liberdade não deveria autorizar órgãos controladores a interferirem na geração de informações —afinal, estas servem para o esclarecimento do eleitor.

Não se nega a necessidade de regular a matéria, o que nossa legislação já faz há décadas; ir, porém, além das restrições existentes, com o objetivo de alcançar previamente o teor do questionário de modo genérico e abstrato, retiraria do eleitor uma de suas maiores imunidades: a informação.

Afinal, vale lembrar os tradicionais efeitos colaterais dos excessos e não esquecer que a diferença entre o remédio e o veneno está, apenas, na dose.

DIOGO RAIS é professor de direito eleitoral do Mackenzie e da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas

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