É pouco provável imaginar uma situação de vulnerabilidade social maior do que a de crianças e adolescentes que tiveram os seus direitos violados, perderam o amparo de seus pais e aguardam em instituições de acolhimento por tempo indefinido.
Atualmente, 8,7 mil crianças estão inseridas no Cadastro Nacional de Adoção (CNA) nessa situação. Ao ampliar as possibilidades de adoções interestaduais, a ferramenta, criada em 2008 pela Corregedoria Nacional de Justiça, representou um enorme avanço. Até então, quando não havia um pretendente na região, as adoções dependiam da busca manual por juízes.
Na semana passada, em que se comemorou o Dia Nacional da Adoção, celebramos o fato de o CNA ter possibilitado, na última década, a formação de 9.000 famílias. Por outro lado, precisamos chamar a atenção para os novos desafios que temos a enfrentar, e que não são poucos.
Este ano, uma nova versão do cadastro entrará em operação, pretendendo conferir mais celeridade e transparência. Pretende-se, também, estabelecer o diálogo entre as crianças reais, disponíveis em abrigos, e pretendentes que buscam seus filhos para formar famílias.
Assim, o CNA deve ter como sujeito principal a criança. E fato é que a maioria das crianças disponíveis hoje no cadastro foge ao perfil desejado pela maior parte dos 43,6 mil pretendentes —qual seja, uma criança pequena, branca e em perfeitas condições de saúde.
Isso porque, das crianças cadastradas, 48% são pardas, 17% são negras, apenas 26% têm até cinco anos e 25% têm algum tipo de deficiência ou doença. Estamos falando de buscar ampliar o olhar sobre as chamadas adoções necessárias.
Com esse foco, o cadastro pretende permitir, para esse público, a inclusão de materiais como fotos, cartas, desenhos e vídeos das crianças e adolescentes, cujo acesso estará restrito aos pretendentes, quando o juiz avaliar que pode ser um fator de aproximação e sensibilização. Além disso, a varredura automática diária entre o perfil de crianças e pretendentes representará grande economia de tempo do magistrado e dos servidores.
Outra novidade é a busca por dados aproximados, possibilitando a ampliação do perfil desejado. Por exemplo: um casal cadastrado com perfil para adoção de uma criança de até sete anos poderá eventualmente ser consultado em relação à possibilidade de conhecer uma criança de oito ou nove anos.
A Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem como princípio a construção democrática, valorizando a experiência dos magistrados e servidores que trabalham em primeira instância, em contato diário com os casos de adoção. Por isso, o novo cadastro é resultado de propostas aprovadas em debates nas cinco regiões do país.
É preciso ressaltar o árduo trabalho de juízes em todo o país. A despeito de lidarem, muitas vezes, com a falta de estrutura nas varas de infância e número insuficiente de profissionais, coordenam projetos criativos para incentivar a adoção tardia com excelentes resultados. Esses juízes têm buscado dar visibilidade às crianças mais velhas, crianças com deficiência e grupos de irmãos que não possuem nenhum pretendente interessado.
Os esforços do Judiciário têm sido maciços para a inclusão dessas crianças no seio de uma família --seja uma família adotiva, seja possibilitando o retorno seguro à família de origem.
A morosidade processual é uma realidade e requer enfrentamento por todo o sistema de Justiça para evitar injustiças irreparáveis e os graves casos de devoluções. Para tanto, são imprescindíveis o preparo cuidadoso dos pretendentes e o acompanhamento de todo o processo de adoção.
Sandra Silvestre Torres: Cadastro Nacional de Adoção e o foco na criança
Nova versão quer facilitar contato com pretendentes
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