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César Borges: Solução para infraestrutura deve vir de todos

Paralisação dos caminhoneiros deixa lições valiosas

O presidente da ABCR, César Borges, durante seminário promovido pela Folha
O presidente da ABCR, César Borges, durante seminário promovido pela Folha - Keiny Andrade - 22.jan.18/Folhapress

A dramática experiência vivida em maio pelos brasileiros, com a paralisação dos caminhoneiros por dez dias, deixou lições valiosas. Em meio ao caos que se formou no país, infelizmente não foram poucos os exemplos de individualismo, falta de empatia em relação ao próximo e visão distorcida sobre o todo.

Segundo estimativa da consultoria 4E, cada dia de paralisação custou em torno de R$ 3 bilhões a menos no PIB deste ano. Certamente, parte desse prejuízo poderia ser evitada, caso prevalecesse o interesse público. Ficaram claras, também, nossa extrema dependência do transporte rodoviário e as carências que ainda persistem na infraestrutura do país.

Algumas dessas lições devem ser aproveitadas por todos os envolvidos na gestão da infraestrutura. Sabemos que concessão é a solução para o desenvolvimento de nossas rodovias. Não à toa, a CNT (Confederação Nacional do Transporte) indica que as 19 melhores rodovias do país são concedidas.
 

No entanto, hoje enfrentamos entraves políticos que desestimulam o investimento privado em novas concessões. Fatores como a "infantilização do agente público" —falta de capacitação bem apontada pelo ministro do TCU Bruno Dantas— e o "apagão das canetas", em que as agências reguladoras se ausentam de suas responsabilidades para evitar o atrito com órgãos controladores, reduzem as perspectivas do setor privado em investir no Brasil.

Não são barreiras técnicas ou econômicas, mas dificuldades políticas que podem ser superadas se houver empatia entre as partes e uma visão sistêmica e republicana sobre as reais necessidades do país.

Hoje, não falta recurso para o setor privado investir, mas é preciso estruturar projetos com critérios técnicos definidos, apoiados no planejamento de longo prazo e priorizados pela relação resultado/benefício. Para que haja essa otimização, a máquina pública deve recuperar a capacidade de engenharia, com servidores experientes na execução de obras e elaboração de projetos e estudos técnicos de editais.

Com isso, será possível considerar, de forma factível, necessidades como licenças ambientais, orçamento dos investimentos, custos operacionais e eventuais desapropriações.

É importante também equilibrar a matriz de riscos, evitando que flutuações excessivas sejam repassadas às concessionárias, e flexibilizar cronogramas de investimentos, além de direitos e obrigações necessárias em contratos de longo prazo, como a inclusão ou exclusão de obras que venham a ser identificadas durante o contrato.

Por fim, um ponto essencial é garantir a segurança jurídica durante o tempo do contrato, dando clareza e transparência às regras e protegendo as concessões de leis oportunistas e eleitoreiras, como os diversos pedidos de isenção de tarifa de pedágio para públicos diversos.

A sociedade brasileira necessita de bons projetos de infraestrutura, adequados à sua realidade, com agências reguladoras autônomas atuando para a concretização de contratos que ajudem o país. Não falta interesse por parte do setor privado, conforme indica estudo da consultoria Grant Thornton, que estima um novo ciclo de aportes de até R$ 2 trilhões na infraestrutura do Brasil nos próximos oito anos.

O desafio de tornar a esfera pública federal adequada a receber esses investimentos e de ampliar o processo bem-sucedido de abertura ao setor privado realizado pelos estados —superando as dificuldades dos contratos de concessão existentes— deverá ser uma prioridade para os próximos governantes, bem como a todos os órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

César Borges

Presidente-executivo da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR); ex-governador da Bahia (1998-2002), ex-senador da República (2003-2011) e ex-ministro dos Transportes (2013-2014, governo Dilma)

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