Descrição de chapéu

Desalento jovem

Parece razoável associar o desejo de brasileiros de emigrar à fase vivida pelo país

A produtora cultural Cássia Andrade, 45, vendeu seu apartamento e vai se mudar para o Canadá
A produtora cultural Cássia Andrade, 45, vendeu seu apartamento e vai se mudar para o Canadá - Bruno Santos/Folhapress

Mesmo sem uma base de comparação com resultados passados, são eloquentes o bastante os números colhidos em pesquisa do Datafolha que investigou o desejo de deixar o país entre os brasileiros.

Nada menos que 43% dos entrevistados responderam que gostariam de emigrar, se pudessem. A taxa sobe para 56% entre aqueles que têm formação superior e chega a espantosos 62% na faixa de 16 a 24 anos de idade.

Os destinos almejados, previsivelmente, estão no mundo desenvolvido. Estados Unidos (14% do total) e Portugal (8%) encabeçam as preferências, decerto pelas dimensões geográficas e econômicas do primeiro e pelas afinidades históricas e linguísticas com o segundo.

Parece razoável associar os percentuais elevados ao momento desalentador vivido pelo Brasil, que há pelo menos quatro anos presencia crises e escândalos de todo tipo. As perspectivas de progresso, afinal, mostram-se pouco palpáveis onde a renda média por habitante permanece inferior à do final da década passada.

Outras sondagens confirmam os sinais de pessimismo e insatisfação. O presidente Michel Temer (MDB) é o mais impopular desde o restabelecimento da democracia; 72% afirmam que o quadro econômico do país piorou nos últimos meses; até a confiança na conquista da Copa do Mundo é a menor nas medições feitas a partir de 1994.

Não surpreenderia, em qualquer situação, que a intenção de viver no exterior se manifestasse mais entre os jovens. Aqui, há o motivo adicional de ser esse o contingente mais afetado pela devastadora recessão de 2014-16.

Basta notar que o desemprego na faixa de 18 a 24 anos de idade saltou de 15,8%, quatro anos atrás, para exorbitantes 28,1% no primeiro trimestre deste 2018 —mais que o dobro da taxa nacional.

Afora a questão conjuntural, acumulam-se distorções nas políticas públicas em desfavor dos que estão ingressando ou prestes a ingressar no mercado de trabalho.

O gasto excessivo e crescente com Previdência, acima de 10% do Produto Interno Bruto, toma o lugar de outras finalidades. A educação básica recebe dos cofres governamentais o equivalente a 4,2% do PIB, não desprezíveis, mas com notórios problemas de eficiência.

Há mais a ser superado, pois, que a fragilidade econômica e a conflagração política. A letargia com que se encaram os desafios justifica, por ora, o desânimo com o país.

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