O mundo caminha, ainda que lentamente, para precificar a poluição. Mas o Brasil dá marcha à ré.
A eliminação da Cide para o óleo diesel, acordada entre o governo e caminhoneiros, vem se somar à sanção da Lei 13.586, de dezembro de 2017. Essa lei ampliou os subsídios à indústria de petróleo e gás e os estendeu por 22 anos —até 2040—, inclusive desrespeitando a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que limita a concessão de benefícios fiscais a, no máximo, 5 anos.
O Brasil está perdendo a oportunidade de fazer uma transição suave para uma economia de baixo carbono. Deixa de desenvolver mercados em que já possui tecnologia, como biocombustíveis, biomassa, energia eólica e solar, e construir as bases para ampliar a competitividade da economia a partir da geração limpa e de baixo custo.
A recente crise gerada pelo preço dos combustíveis fósseis demonstra que esse quadro traz vulnerabilidade ao país. Os preços internacionais do petróleo e a taxa de câmbio jogam a favor da ampliação do uso de fontes energéticas renováveis —e não do diesel e dos outros fósseis.
Na década de 1970, ocorreram dois choques causados pelo aumento dos preços dessa commodity internacional. Como resposta, o Brasil criou o Programa Nacional do Álcool combustível, o pró-álcool, e fomentou a indústria nacional de etanol.
Passados 40, temos razões extras para construir alternativas ao uso de combustíveis de origem fóssil. Além da volatilidade do preço do petróleo e de sua cotação em moeda estrangeira, muitas nações avançaram no sentido de combater as emissões de gases de efeito estufa derivadas da queima de combustíveis fósseis.
A humanidade deve zerar as emissões de gases de efeito estufa até 2050. Para alcançar esse objetivo, mecanismos de preços são os mais eficientes no arsenal da política econômica. Preços têm o poder de afetar comportamentos de maneira sistêmica. E há duas formas reconhecidas para se estabelecer um preço para as emissões de carbono, a chamada precificação do carbono.
A primeira é por meio de um sistema de mercado, o chamado cap-and-trade. Os setores poluentes teriam de respeitar um teto de emissões, regulado pelo Estado. Quem emitir acima do teto estabelecido precisa adquirir permissões daqueles que poluem menos que o permitido ou de quem tirou carbono da atmosfera por meio de projetos florestais ou de captura e estoque de carbono.
A segunda alternativa é o estabelecimento de um tributo sobre o conteúdo de carbono emitido por produtos e serviços. É uma forma menos popular —apesar de mais simples de implementar— para o setor privado por gerar impacto tributário direto. A Cide poderia ser utilizada para isso se suas alíquotas refletissem as emissões de cada combustível.
Qualquer que seja a alternativa escolhida, um mecanismo de precificação do carbono permitiria alcançar o objetivo de reduzir as emissões sem a necessidade de implementação de metas de redução mandatória. A precificação também ofereceria arrecadação ao governo, que poderia ser aplicada na adaptação de grupos em maior situação de vulnerabilidade aos impactos climáticos.
Hoje, 42 nações e 25 jurisdições subnacionais já precificam o carbono de alguma maneira, o que representa 15% das emissões globais de gases de efeito estufa, segundo o Banco Mundial. Isso será discutido no Encontro Internacional sobre Precificação de Carbono, em São Paulo, nesta terça (19), organizado pelo Instituto Clima e Sociedade, pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável e pela Embaixada da Alemanha no Brasil.
A recomendação ao Brasil é que avance junto com o restante do mundo, rumo à precificação do carbono. E que busque o preço certo para orientar a transição de produtores e consumidores para uma economia de baixo carbono até a metade do século.
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