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Gustavo Pinheiro: Mudar a direção rumo a uma economia de baixo carbono

Brasil está perdendo a oportunidade de fazer transição suave

Operários especializados entornam ferro derretido em altíssima temperatura em moldes para fazer peças de freio para trens, em fábrica em Barueri (SP)
Operários especializados entornam ferro derretido em altíssima temperatura em moldes para fazer peças de freio para trens, em fábrica em Barueri (SP) - Eduardo Knapp - 21.nov.16/Folhapress

O mundo caminha, ainda que lentamente, para precificar a poluição. Mas o Brasil dá marcha à ré.

A eliminação da Cide para o óleo diesel, acordada entre o governo e caminhoneiros, vem se somar à sanção da Lei 13.586, de dezembro de 2017. Essa lei ampliou os subsídios à indústria de petróleo e gás e os estendeu por 22 anos —até 2040—, inclusive desrespeitando a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que limita a concessão de benefícios fiscais a, no máximo, 5 anos.

O Brasil está perdendo a oportunidade de fazer uma transição suave para uma economia de baixo carbono. Deixa de desenvolver mercados em que já possui tecnologia, como biocombustíveis, biomassa, energia eólica e solar, e construir as bases para ampliar a competitividade da economia a partir da geração limpa e de baixo custo.

A recente crise gerada pelo preço dos combustíveis fósseis demonstra que esse quadro traz vulnerabilidade ao país. Os preços internacionais do petróleo e a taxa de câmbio jogam a favor da ampliação do uso de fontes energéticas renováveis —e não do diesel e dos outros fósseis.

Na década de 1970, ocorreram dois choques causados pelo aumento dos preços dessa commodity internacional. Como resposta, o Brasil criou o Programa Nacional do Álcool combustível, o pró-álcool, e fomentou a indústria nacional de etanol.

Passados 40, temos razões extras para construir alternativas ao uso de combustíveis de origem fóssil. Além da volatilidade do preço do petróleo e de sua cotação em moeda estrangeira, muitas nações avançaram no sentido de combater as emissões de gases de efeito estufa derivadas da queima de combustíveis fósseis.

A humanidade deve zerar as emissões de gases de efeito estufa até 2050. Para alcançar esse objetivo, mecanismos de preços são os mais eficientes no arsenal da política econômica. Preços têm o poder de afetar comportamentos de maneira sistêmica. E há duas formas reconhecidas para se estabelecer um preço para as emissões de carbono, a chamada precificação do carbono. 

A primeira é por meio de um sistema de mercado, o chamado cap-and-trade. Os setores poluentes teriam de respeitar um teto de emissões, regulado pelo Estado. Quem emitir acima do teto estabelecido precisa adquirir permissões daqueles que poluem menos que o permitido ou de quem tirou carbono da atmosfera por meio de projetos florestais ou de captura e estoque de carbono.

A segunda alternativa é o estabelecimento de um tributo sobre o conteúdo de carbono emitido por produtos e serviços. É uma forma menos popular —apesar de mais simples de implementar— para o setor privado por gerar impacto tributário direto. A Cide poderia ser utilizada para isso se suas alíquotas refletissem as emissões de cada combustível.

Qualquer que seja a alternativa escolhida, um mecanismo de precificação do carbono permitiria alcançar o objetivo de reduzir as emissões sem a necessidade de implementação de metas de redução mandatória. A precificação também ofereceria arrecadação ao governo, que poderia ser aplicada na adaptação de grupos em maior situação de vulnerabilidade aos impactos climáticos.

Hoje, 42 nações e 25 jurisdições subnacionais já precificam o carbono de alguma maneira, o que representa 15% das emissões globais de gases de efeito estufa, segundo o Banco Mundial. Isso será discutido no Encontro Internacional sobre Precificação de Carbono, em São Paulo, nesta terça (19), organizado pelo Instituto Clima e Sociedade, pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável e pela Embaixada da Alemanha no Brasil.

A recomendação ao Brasil é que avance junto com o restante do mundo, rumo à precificação do carbono. E que busque o preço certo para orientar a transição de produtores e consumidores para uma economia de baixo carbono até a metade do século.

Gustavo Pinheiro

Coordenador da área de economia de baixo carbono do iCS (Instituto Clima e Sociedade)

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