Descrição de chapéu

Alessandra Nilo, Fabio de Almeida Pinto e Jorge Abrahão: Brasil, um gigante que ficará para trás?

País tem trilhado caminho incoerente com a Agenda 2030

Nuvens refletidas no prédio da sede da ONU, em Nova York
Nuvens refletidas no prédio da sede da ONU, em Nova York - Chip East - 24.set.12/Reuters

Está sendo realizado em Nova York, até o dia 18 de julho, o Fórum Político de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável. O evento é o mecanismo central estabelecido pelas Nações Unidas para acompanhar o avanço da Agenda 2030 e de seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Este ano, 47 países reportarão os avanços de seus relatórios voluntários, com foco no tema “Transformação por meio de sociedades sustentáveis e resilientes”.

No Brasil, o Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para Agenda 2030 (GT SC A2030) lança nesta semana o Relatório Luz 2018 (RL 2018). Elaborado por uma equipe de especialistas das organizações que integram o GT e outras organizações convidadas, a partir dos dados oficiais disponíveis, o relatório apresenta a análise de 121 das 169 metas estabelecidas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e aponta que o caminho trilhado nos últimos três anos pelo Brasil é incoerente com a Agenda 2030.

O relatório apresenta ainda recomendações da sociedade civil para que o Brasil avance na implementação dos ODS, tanto em nível nacional como subnacional.

Apesar do funcionamento da Comissão Nacional dos ODS —que já conta com seu plano de ação— e o fomento à criação das comissões subnacionais, é necessário reverter as atuais crises política e econômica nas quais o país está mergulhado.

Os desafios são muitos, estruturantes e complexos. Políticas e programas que vinham contribuindo para a redução da pobreza sofreram cortes orçamentários drásticos ou foram descontinuados. Os abismos sociais entre ricos e pobres se aprofundam; consolida-se a exclusão história baseada em raças, etnias, identidade de gênero e orientação sexual.

Os índices brasileiros de violência e desigualdade seguem entre os maiores do mundo, e os problemas se intensificam, à medida que o Congresso, o Legislativo e o Executivo atuam no desmonte dos principais mecanismos de proteção social e ambiental, conquistados ao longo de décadas —mudanças em sua maioria promovidas sem debates e sem participação social.

A Lei 13.467/17, que institui a reforma trabalhista; a Emenda Constitucional 95/2016, que estabelece um limite de reajuste no orçamento público federal (incluindo gastos sociais, nas áreas da saúde e educação); a Lei 13.34/16, que extingue todos os ministérios de agenda transversal (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e Secretaria de Políticas para Mulheres); a manutenção de subsídios a combustíveis fósseis e setores intensivos em emissões de gases de efeito estufa e uso de recursos não renováveis são símbolos incontestáveis do descompromisso do atual governo e do Congresso Nacional e apontam para a escolha do caminho da insustentabilidade e do retrocesso.

De acordo com o estudo lançado recentemente, assinado por dez pesquisadores brasileiros na Nature Climate Change (uma das mais renomadas publicações científicas sobre mudança do clima), em troca de apoio político o governo brasileiro assinou medidas provisórias e decretos que diminuíram as exigências para o licenciamento ambiental e suspendeu a demarcação de terras indígenas, facilitando que grileiros se beneficiem dos recursos de áreas desmatadas ilegalmente, colocando em risco a contribuição do país para o Acordo de Paris.

Essas evidências apontadas tornam cada vez mais frágil o discurso dos Poderes Executivo e Legislativo de adesão aos ODS.

Aliados à opacidade dos arranjos público-privados e ao rechaço às propostas de tributação progressiva, evidenciam os desafios de implementar uma política econômica voltada à sustentabilidade e à melhoria da qualidade de vida da população.

É urgente transformar este cenário. E é esta realidade que nós, do GT SC A2030, temos atuado para transformar. O que queremos é possível e viável: políticas públicas planejadas para curto, médio e longo prazos e fundamentadas na redução das desigualdades, na equidade, na igualdade de gênero, na promoção dos direitos humanos, na participação social, no combate às mudanças climáticas, no respeito ao meio ambiente e na transparência. Esse futuro somente será possível com novos arranjos transparentes e inclusivos, entre todos os setores do Estado.

Seguiremos articulados e monitorando a implementação da Agenda 2030 no Brasil. O Brasil tem imensas potencialidades, é um gigante que não pode ser deixado para trás. Um outro Brasil, sustentável e justo, é possível.

Alessandra Nilo

Coordenadora-geral da Gestos e integrante do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para Agenda 2030 (GT SC A2030)

Fabio de Almeida Pinto

Coordenador-executivo do Instituto Democracia e Sustentabilidade e integrante do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para Agenda 2030 (GT SC A2030)

Jorge Abrahão

Coordenador-geral da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.