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América em qual lugar?

Donald Trump depõe contra si mesmo ao depreciar instituições norte-americanas

Os presidente dos EUA, Donald Trump, e da Rússia, Vladimir Putin, ao final de entrevista à imprensa em Helsinque, na Finlândia
Os presidente dos EUA, Donald Trump, e da Rússia, Vladimir Putin, ao final de entrevista à imprensa em Helsinque, na Finlândia - Alexander Zemlianichenko/Associated Press

Que a inédita reunião bilateral desta segunda-feira (16) se prenunciava mais favorável a Vladimir Putin, já era sabido. Não se esperava, entretanto, que Donald Trump se empenhasse tanto em depor contra si mesmo ao depreciar instituições norte-americanas, sem se preocupar com o fato de o congênere russo estar ao lado.

Na entrevista após o encontro, o presidente dos EUA uma vez mais pôs sob suspeição a conclusão de seu serviço de inteligência segundo a qual hackers do país europeu agiram para interferir nas eleições em que ele venceu Hillary Clinton.

Segundo o republicano, Putin se mostrou "forte e poderoso" ao negar envolvimento do Kremlin.

Aparentemente determinado a dizer o que o outro gostaria de ouvir, chamou de desastre a investigação do FBI sobre suposto conluio entre agentes da Rússia e a equipe de campanha republicana. Tal apuração, aliás, seria uma das razões pelas quais os dois países vivem momento conturbado.

Difícil não observar com certa ironia que críticas dessa magnitude ao trabalho de autoridades americanas venham do homem que reiteradas vezes promete colocar a América em primeiro lugar.

Até faz sentido Trump vislumbrar ganhos futuros para os EUA se conseguir manter relação amistosa com um rival. Decerto, um entendimento melhor entre Washington e Moscou, detentores dos maiores arsenais atômicos do mundo, poderia ser benéfico a toda a comunidade internacional. 

Há que se questionar, porém, os meios empregados pelo mandatário para alcançar o objetivo.

Em sua muito particular visão de diplomacia, é preciso tirar da frente todas as peças incômodas para a outra parte se sentir à vontade, ainda que isso implique destratar publicamente aliados europeus ou mesmo se contrapor a quem, por princípio, está a serviço dos EUA.

O foco da cúpula na questão da ingerência no pleito de 2016 não só deixou em segundo plano temas desagradáveis ao Kremlin, como a tomada da Crimeia e a guerra na Síria; para o chefe da Casa Branca, dar razão a Putin significou ampliar a insatisfação de boa parte do Congresso, inclusive líderes republicanos, com seu governo.

Convém lembrar que haverá eleições em novembro, nas quais toda a Câmara e um terço do Senado serão renovados.

Na hipótese de os democratas recuperarem a maioria em uma das Casas, ganha corpo a articulação pelo impeachment —principalmente se o inquérito dessa “coisa da Rússia”, como já definiu Trump, se aproximar dele ainda mais.

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