Será que tem nome a ausência acentuada de entusiasmo? Mesmo em dia do jogo do Brasil, o entusiasmo na expectativa não parece aquele a que eu estava acostumada a ver e sentir. O que será que significa a palavra entusiasmo? Será que tem a ver com fé e com esperança? Só a terceira virtude —caridade— é que fica fora desse meu pensamento.
Vi rostos alegres —eu diria— entusiasmados pela televisão. Parece que aqueles que se entusiasmaram foram para arena. Não vi sorrisos na quitanda, no supermercado, nem mesmo na esquina.
Como psicóloga que sou, deveria aventar hipóteses para esse fenômeno. Lembro-me de outros momentos em que via alegria no olhar e no rosto de quem passava por mim, em cima ou embaixo do Minhocão, por exemplo. Em qualquer dia, quanto mais em um dia de festa. Fico um pouco assustada: será que nunca mais verei euforia ou alegria nos olhos que estão à minha volta?
No face a face sinto ausência, mas mesmo na televisão não percebo na Sandra Annenberg o cintilar de profunda alegria (falei da Sandra porque foi a última reportagem que vi no jornal da televisão). Algo está nos impedindo de sentir euforia —que é resultante da alegria esperada.
De onde vem essa falha na nossa estrutura de alegria nacional? Claro que, se ganhássemos a Copa, veríamos euforia em praça pública. Nem poderia ser de outro jeito. Mas, na esperança da vitória, ficamos com o grito reprimido. Esse grito é tão bom de sentir.
Mas eu queria euforia, queria esperança. Não basta gol de 30 a 40 segundos. Sete ou mais gols... Tudo isto não está dando conta de nos acordar da imobilidade.
E esta eleição em que nenhum candidato desperta entusiasmo da nação? Nem aí percebo paixão em meu entorno. Sofremos de ausência de líder. Não há um nome que nos entusiasme. Estamos em uma crise de fé no nosso semelhante.
Queria tanto ter um líder, acreditar em alguém. Claro que, entre meus parentes e amigos, admiro muitos. Mas queria um líder. Queria acreditar que alguém sabe aproveitar uma posição para gerar transformações necessárias e desejadas.
Quero também um inimigo. Alguém que represente o que não quero. Também quero detestar, rejeitar.
O catecismo nos ensina que as três virtudes são: fé, esperança e caridade. Se não temos fé, não temos esperança; então, para que fazer o bem? E, não fazendo o bem, praticamente fazemos o mal.
Viver em um mundo em que não admiro nem abomino é um mundo em que a esperança foi abolida. Quero ter esperança de ver realizado um sonho. Quero querer. Quando quero uma situação ou um líder, estou imaginando também o que não quero. Estou criando um inimigo, situações, pessoas, líderes que não quero.
Esta posição de indiferença está gerando uma imobilidade que vai desde as escolhas do cotidiano até a idealização do sublime. Vida amorfa.
Anna Veronica Mautner: Entusiasmo que tarda ou falta
Será que nunca mais verei alegria à minha volta?
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