Descrição de chapéu

Javali protegido

Na prática, lei autorizou a continuada proliferação dos bichos e a destruição que ocasionam

Grupo de caçadores diante de javali abatido em Monte Azul Paulista (SP)
Grupo de caçadores diante de javali abatido em Monte Azul Paulista (SP) - Avener Prado - 24.ago.15/Folhapress

Indicador do grau de civilização dos povos, a compaixão pelo sofrimento dos animais tem —ou deve encontrar— limites. Ninguém em sã consciência defenderia salvar a vida de roedores que transmitem a peste. Mas e o javali?

Se depender das autoridades paulistas, de ora em diante essa espécie terá salvo-conduto para vagar pelos campos e matas. O governador Márcio França (PSB) sancionou lei que proíbe a caça no estado “em todas as suas modalidades, sob qualquer pretexto, forma e para qualquer finalidade”.

Soubessem ler e se importar com normas legais, esses suínos teriam muito o que celebrar. Como não é o caso, humanos é que temos com que nos preocupar diante dessa legislação algo desequilibrada.

Verdade que a lei estadual 16.784 abre exceção para os chamados animais sinantrópicos —ou seja, aqueles que, adaptados ao convívio em assentamentos humanos, podem implicar risco para a população. Ratos e pombos surgem como os exemplos mais notórios, por transmitirem doenças.

Javalis representam um caso à parte. A espécie originária da Europa, da Ásia e do norte da África foi introduzida na América do Sul para fins de pecuária e pode reproduzir-se com porcos comuns, gerando os híbridos que ficaram conhecidos como “javaporcos”.

O javali não tem predadores naturais nos ecossistemas brasileiros e proliferou, após escapar de criadouros (ou por soltura intencional, após proibição de manter rebanhos). Bandos ferais passaram a arrasar lavouras de cana e milho, entre outras; supõe-se, ainda, que possam transmitir doenças como a febre aftosa a criações domésticas.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) autorizou em 2013 a caça ao suíno selvagem, para controlar sua população. Defensores de direitos dos animais se levantaram contra o abate, alegando sofrimento intenso com os ferimentos a bala e a mutilação de cães atacados pelos seres perseguidos.

A exposição de motivos do deputado estadual Roberto Tripoli (PV), autor do projeto sancionado, deixa claro que a libertação dos javalis era o alvo principal. O texto admite o controle populacional, mas veda o emprego de meios cruéis e exclui da ação pessoas físicas e jurídicas não governamentais.

Na prática, autorizou-se em território paulista a continuada proliferação dos bichos e a destruição que ocasionam. Ninguém imagina que o governo estadual vá organizar brigadas só para capturá-los —a não ser, talvez, políticos em busca de votos piedosos.

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