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João Carlos Jarochinski Silva

O Brasil deve fechar em caráter temporário a fronteira com a Venezuela para conter a imigração? NÃO

Além das razões humanitárias

Em virtude da entrada e do aumento da presença de venezuelanos no Brasil, principalmente pelo e no estado de Roraima, muito tem se debatido sobre a melhor forma de lidar com esse fluxo no sentido de conferir proteção aos imigrantes e refugiados recém-chegados, mas também atender aos anseios dos brasileiros que vivem nessa região.

Uma das alternativas apresentadas foi a do fechamento temporário da fronteira, sob a alegação de que Roraima não teria mais capacidade de receber as pessoas oriundas do país vizinho, visto que já teria esgotado seus recursos e não teria mais como suportar o aumento da demanda trazida por esses indivíduos em alguns serviços públicos.

Tal proposta tem sido criticada pelo governo federal, sob a argumentação de que feriria acordos internacionais firmados pelo Brasil, além do fato de que o país estabelece uma série de princípios em suas normas que seriam contrários a essa medida. Entretanto, como tal argumentação não parece suficiente para encerrar o apelo dessa ação em Roraima, há que se apontar outras perspectivas para analisar a temática.

Merece ser destacado que o fechamento da fronteira abalaria o prestígio internacional brasileiro, prejudicando sua atuação no nível internacional e regional. Destaca-se, ainda, o fato de a ação ser mais constrangedora quando se observa que outros países da região com população, PIB e renda per capita bem menores, como Equador e Peru, receberam um contingente mais expressivo.

A tomada de uma decisão como essa marcaria a relação com a Venezuela, dificultando a participação no processo de reconstrução da nação vizinha, pois a crise, embora aguda, não será permanente, e a retomada econômica oferecerá interessantes oportunidades ao Brasil.

Há mais um fator fundamental para condenar tal ideia: a sua ineficiência. Experiências históricas demonstram que os locais que tentaram implementar essa política não obtiveram resultado na empreitada, ou, quando conseguiram algum grau de sucesso, conquistaram-no por meio de operações muito custosas, mais caras que os recursos necessários para integrar imigrantes, o que não é conveniente em um quadro no qual os recursos são escassos.

A incapacidade de impedir a circulação, principalmente em um contexto de migração forçada como é o atual dos venezuelanos, levaria a um cenário no qual a entrada não deixaria de ocorrer; ela simplesmente mudaria de rota, às vezes por caminhos mais perigosos, e levaria os imigrantes a se sujeitarem a buscar coiotes para adentrar no Brasil.

Vale destacar que as cidades de fronteira na Amazônia, distantes dos centros dirigentes do país, acabam se ajudando mutuamente para superar a ausência de bens e serviços que marcam essas regiões.

Um eventual fechamento da fronteira traria como consequência um volume de pessoas não regularizadas, as quais o Estado não saberia quantificar, diminuindo a capacidade de propor ações focadas, além de dificultar a busca por oportunidades em outras partes do país.

Isso os levaria a ficar em Roraima, em situação de vulnerabilidade que representaria maiores riscos para os próprios imigrantes e para os brasileiros, tais como a não formalização das relações laborais e a maior possibilidade de serem cooptados para a prática de atividades ilícitas.

Portanto, dada a inadequação dessa medida, há que se pensar em ações que possibilitem aos lá residentes e aos que estão de passagem direitos e serviços públicos de qualidade.

João Carlos Jarochinski Silva

Professor do curso de relações internacionais e do mestrado em Sociedade e Fronteiras da UFRR (Universidade Federal de Roraima)

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