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Pedro Guasti e Alecsandro Araújo de Souza

Tabelamento de fretes: uma medida arcaica

Desastrosa, decisão é uma clara intervenção na economia

Com a aprovação da medida provisória n.º 832, o Brasil se vê diante de uma amarga experiência de nossa história contemporânea: o tabelamento de preços!  A MP 832, que instituiu a política de preços mínimos de fretes no último dia 11 de julho de 2018, ainda aguarda a sanção do presidente da República, Michel Temer, para entrar em vigor. Mas tudo indica que será aprovada sem nenhum veto em breve.

A MP 832 determina à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), entre outros pontos, elaborar a tabela de preços mínimos. Tarefa essa que a própria ANTT, em 2015, por meio de notas técnicas, havia afirmado que, em virtude da multiplicidade de situações, seria algo de difícil formulação. Ou seja, a MP 832 obriga a própria ANTT a assumir um papel contrário ao que ela mesma acredita por força de uma medida provisória.

Ao revogar —cabe destacar, por medida provisória— a lei da oferta e da procura no mercado de fretes rodoviários, a MP 832 se configura, para além de uma decisão desastrosa, uma clara intervenção do governo na economia.

Nada justifica uma decisão dessa natureza no mercado de fretes rodoviários. O mercado enfrenta o excesso de oferta de caminhões em relação à demanda por transporte de cargas, fruto da grave crise econômica que atravessamos nos últimos anos. Um ajuste ocorreria livremente e, agora, pode ser perigosamente distorcido pela mão pesada do governo, cujos impactos já sentimos nos preços dos produtos refletidos na inflação e na queda do PIB, divulgados recentemente.

Mais uma vez, o setor produtivo e, em especial, os consumidores brasileiros pagarão o custo dessa decisão eminentemente política, que, por sua natureza e força, ignora quaisquer avaliações econômica e jurídica sobre o assunto. Uma medida provisória que distorce a economia, gerando externalidades negativas e aumento de custos em todas as cadeias produtivas e criando uma imensa insegurança jurídica.

Os comerciantes de bens e serviços deverão nos próximos meses ajustar suas ofertas de produtos tendo em vista um aumento expressivo nos custos dos fretes. Aumento este que terão grandes dificuldades de repassar aos clientes, que já vivem num regime de contenção de despesas. Para se ter uma ideia, os operadores logísticos que atendem às principais empresas de comércio eletrônico do Brasil estimam um acréscimo nos preços de fretes das cargas expressas na ordem de 18% a 20%, em média.

Apesar de a MP 832 ter sido aprovada sob pressão dos caminhoneiros, a FecomercioSP (Federação de Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo ) não perde a esperança de que a Suprema Corte a vete por ser inconstitucional ou de que o próprio governo recue na formulação proposta, tornando a tabela de fretes mínimos um referencial, e não uma determinação imposta pelo Estado na economia, fixando, de forma artificial, os preços dos fretes.

A FecomercioSP, por meio de seu Conselho de Comércio Eletrônico, não tem medido esforços para fazer chegar aos parlamentares e membros do Poder Executivo em diversas instâncias o impacto que tal propositura irá trazer para os operadores logísticos do país, em particular para os próprios Correios e, sobretudo, para a competitividade do varejo brasileiro face à concorrência internacional (comércio crossborder).

O governo do presidente Michel Temer, ao apagar das luzes, bem poderia ter deixado de herança ao futuro postulante a presidente da República um exemplo de firme convicção no livre-mercado e na capacidade de livre iniciativa, conforme previstos em nossa Constituição Federal de forma cristalina; mas, ao contrário, deixará uma medida provisória arcaica, intervencionista e longe de ser digna das virtudes republicanas que conformam a República Federativa do Brasil. 

Pedro Guasti e Alecsandro Araújo de Souza

Presidente do Conselho de Comércio Eletrônico da FecomercioSP (Federação de Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo) e diretor de relações institucionais da Ebit; Assessor técnico do Conselho de Comércio Eletrônico da FecomercioSP

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