Descrição de chapéu

Vítimas refratárias

Enquanto desconfiar da polícia, cidadão permanecerá sem boas razões para colaborar

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Faixa alerta sobre a ocorrência de assaltos em rua no Grajaú, na zona sul paulistana
Faixa alerta sobre a ocorrência de assaltos em rua no Grajaú, na zona sul paulistana - Ronny Santos - 13.set.18/Folhapress

Estatísticas de violência tornaram-se uma poderosa ferramenta para instruir o planejamento de ações de segurança pública, em particular o trabalho policial preventivo —fazer-se presente onde a incidência de crimes for maior. Nesse sentido, obviamente, importa que sejam confiáveis, o que em São Paulo nem sempre é o caso.

A subnotificação de delitos figura entre os principais fatores a erodir a credibilidade dos dados oficiais, como evidencia pesquisa sobre vitimização divulgada nesta quarta-feira (19). O levantamento quinquenal, iniciado em 2003 pelo Centro de Políticas Públicas do Insper, se baseia em 3.000 entrevistas em domicílios paulistanos.

A situação mais gritante afeta as cifras sobre vítimas de roubos e furtos na capital paulista.

A maioria dos que sofreram furtos fora de casa (64%) ou na residência (78%) declarou aos entrevistadores ter optado por não informar a polícia sobre o acontecido. Quando a subtração de bens nesses locais envolve violência ou grave ameaça (roubo), a subnotificação cai para 52% e 59%, respectivamente, ainda assim chocantes.

A omissão soa tanto mais grave porque esses delitos estão entre os que se destacam no panorama paulistano por não observarem a tendência de queda verificada com homicídios. Considerem-se os roubos: após uma década (2003-2013) abaixo de 180 mil ocorrências anuais notificadas, galgaram um patamar entre 190 mil e 210 mil casos.

Em outros números: o nível de crimes contra o patrimônio não notificados colhido no estudo do Insper sugere que o total ultrapassa a casa de 400 mil. Uma calamidade.

As razões alegadas pelos entrevistados para não procurar as autoridades, ademais, compõem um rol também de estarrecer: não adianta; é perda de tempo; não confia na polícia; resolveu sozinho(a)...

A exceção notável fica com os furtos e roubos de veículos, em que menos de um quarto dos casos deixa de ser registrado. O motivo é que as seguradoras exigem boletins de ocorrência.

Nenhum trabalho policial, de prevenção ou de investigação, pode ser bem realizado sem o apoio da população. Enquanto esta desconfiar da eficiência —se não da lisura— do aparelho de segurança pública, as vítimas permanecerão sem boas razões para colaborar.

Em mais de duas décadas de administrações tucanas, homicídios recuaram ao tempo em que delitos contra o patrimônio progrediram. Para solucionar esse enigma, o governo estadual precisa primeiro certificar-se de que sabe com o que, exatamente, está lidando.

editoriais@grupofolha.com.br

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.