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Paulo Feldmann

Desalentados e o cartel das empreiteiras da Lava Jato

Infraestrutura precisa da concorrência estrangeira

O professor Paulo Feldmann, em seminário promovido pela Folha em 2014 - Moacyr Lopes Junior/Folhapress

Os dados mais recentes do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que o número de pessoas que desistiram de procurar emprego —os desalentados— chegou a 4,8 milhões, a grande maioria com menos de 30 anos de idade.

Somando-se com os que ainda estão procurando emprego mas não o encontram, chegamos a 18 milhões de brasileiros que hoje não conseguem trabalhar. Isso representa 17% da PEA (População Economicamente Ativa). Apenas cinco países estão numa situação pior no mundo, mas entre esses figuram a Síria e a Venezuela.

A palavra desalento passou a ser usada pelo próprio IBGE porque, ao contrário de outras épocas, em que o jovem desistia de procurar emprego para se dedicar aos estudos ou a universidade, agora o que se verifica é uma apatia e um desânimo enormes justamente junto a essa faixa etária.


Talvez o pior aspecto desse fenômeno nem sejam as estatísticas, mas sim o fato de que parece estar havendo uma acomodação geral ao problema: assim como os jovens se tornaram desalentados, o governo federal desistiu de encontrar uma solução, empurrando o problema para o seu sucessor e torcendo para que a situação não piore muito.

Acontece que o desempregado e o desalentado são fortes candidatos a caírem no mundo do crime e das drogas.

Quem acha que o problema não é grave não conhece as estatísticas sobre a violência no Brasil, onde 62 mil pessoas foram assassinadas em 2017. Somos apenas 3 % da população do globo, mas 12 % dos assassinatos ocorridos no mundo aconteceram em nosso território.

Por outro lado não se pode esperar que de uma hora para outra as empresas consigam gerar os quase 20 milhões de empregos que se fazem necessários, mesmo porque o crescimento do PIB neste 2018 será, quando muito, de apenas 1,5 %.

O que fazer então? Claro que a solução é muito difícil, mas não somos o primeiro país no mundo que passa pela dificuldade. É preciso conhecer o que os outros fizeram.

A solução mais comumente adotada é a de investir em obras de infraestrutura como estradas, ferrovias, metrôs etc., pois dessa forma os empregos gerados são de baixa qualificação e atenuam o problema da grande maioria.

A questão é que para investir é necessário que haja recursos financeiros e de capitais, os quais inexistem no Brasil de hoje, principalmente devido ao enorme déficit público do próprio governo federal.

No entanto, há muito capital para isso em países como China, Alemanha, Estados Unidos e querendo vir para o Brasil; e o melhor, para ajudar a construir a nossa infraestrutura. O que precisa ser feito é uma política emergencial que atraia capitais e empresas de fora especializadas nessa área.

A maior resistência a esse tipo de política se origina no cartel das empreiteiras brasileiras, as mesmas que estão hoje às voltas com a Operação Lava Jato. Para elas, a vinda das estrangeiras representa a morte, porque significa que finalmente vai haver competição e concorrência no segmento da infraestrutura.

Obrigar a existência de competição nas obras de infraestrutura não é, pois, apenas uma questão moral e eticamente importante. Ela é fundamental para que as obras aconteçam e para que se gerem empregos de forma rápida como hoje o país precisa.

Paulo Feldmann

Professor de economia da USP e ex-presidente da Eletropaulo (1995-96, governo Covas)

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