O debate em torno da descriminalização de drogas ganha novo e importante capítulo com a legalização do uso recreativo da maconha no Canadá. Não se trata, afinal, de um país periférico como o Uruguai, nem de estados norte-americanos notoriamente liberais, como Califórnia ou Massachusetts.
A adesão dos canadenses à política de liberação se reveste de destacado significado simbólico por dois motivos. Primeiro, por ocorrer num país do G7, o clube tradicional das nações mais desenvolvidas.
Depois, porque se pautou por razões de saúde e segurança, e não tanto por convicções libertárias, como parece ser o caso nos nove estados dos EUA que já deram tal passo, além da capital, Washington (Distrito de Colúmbia) —sem mencionar que o uso medicinal também encontra respaldo em três dezenas deles.
Evidencia-se que a tendência para descriminalização veio para ficar. Como entende esta Folha, a mera repressão, ou guerra contra as drogas, se revelou tão cara quanto ineficaz, tendo chegado o tempo de tratar da questão pelo prisma da saúde pública.
Com controles similares aos existentes para tabaco e álcool, e começando prudentemente pela maconha, esses produtos poderão ser taxados e gerar recursos para prevenção e tratamento de dependentes, assim como para campanhas de esclarecimento sobre riscos dirigidas aos jovens.
A experiência de países como Portugal, onde apenas a posse de drogas foi despenalizada e se instituíram políticas de controle de danos (como a distribuição de seringas), indica que tais providências têm bastado para reduzir o número de mortes por overdose.
Além disso, a venda regulamentada de drogas elimina o prêmio hoje franqueado a traficantes pela natureza criminosa de sua operação.
Há, no entanto, modelos diversos para a comercialização legal. No Uruguai, partiu-se para o controle estatal sobre a produção e a distribuição, e a venda ali exige que o usuário se registre oficialmente como consumidor, o que decerto terá contribuído para a manutenção marginal do tráfico.
Nos EUA, prevalece a iniciativa privada. No Canadá, depende da regulamentação em cada uma das 13 províncias. A maioria dá preferência para lojas controladas pelo governo e comércio online, mas há opções também por estabelecimentos particulares.
O Brasil, onde esse debate público não dá mostras de que amadurecerá tão cedo, poderá um dia beneficiar-se com a avaliação crítica de tais experimentos.
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