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Paulo Câmara

Transnordestina: um caminho equivocado

É preciso ligar ferrovia ao porto de Suape (PE)

Vagões de trens parados da Transnordestina em Salgueiro (PE), em março de 2017 - Eduardo Knapp - 13.mar.17/Folhapress
Paulo Câmara

O novo cronograma da Ferrovia Transnordestina, proposto pela concessionária Transnordestina Logística (TLSA), prioriza a ligação entre a jazida de minério de ferro no Piauí e o porto de Pecém (CE), com conclusão em 2021. A retomada é uma boa notícia; porém, a chegada ao porto de Suape (PE) apenas no ano de 2027 é mais uma lamentável frustração nessa obra iniciada há mais de 20 anos --e sem motivos para tamanho atraso na frente pernambucana.

Suape fica 80 km mais próximo da jazida mencionada do que Pecém. Esses 80 km a mais de transporte ferroviário representariam algo em torno de R$ 50 milhões/ano adicionais de custo de transporte --ou R$ 500 milhões em valor presente. A logística não justifica esse atraso.

A explicação poderia residir no menor volume de investimento. Mas a obra está mais avançada em direção a Pernambuco. O trecho entre Salgueiro e Suape, com 544 km, tem 41% prontos e está mais avançado que o segmento Missão Velha a Pecém, que tem 527 km. 

Outro argumento é que os lotes de chegada ao porto de Suape não teriam seus projetos aprovados na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Entre 2012 e 2013, o traçado original da ferrovia precisou de variantes em virtude de uma barragem e de conflitos urbanos. 

Essa revisão coube à própria empresa --e se arrasta há muito tempo. Segundo o TCU, a concessionária deve complementações de projetos e orçamentos na obra toda, e não só em Pernambuco, o que suscitou a suspensão de repasse federal até sua aprovação. 

Resta, então, a questão portuária. Aqui, o caso é mais problemático. Suape é um Porto Organizado submetido a intensa regulação federal e listado no Sistema Federal de Viação. Pecém é um Terminal de Uso Privado, não sujeito à mesma sorte de controle federal e detentor de maior flexibilidade. Essa assimetria na regulação supõe que os portos organizados, mais controlados, sejam os destinatários dos investimentos da União, mas a proposta vai no sentido contrário.

Ainda que haja preferência por um modelo mais flexível para viabilizar a verticalização da cadeia logística, a União poderia transformar o Terminal de Minério de Suape num terminal privado, de modo a oferecer condições iguais aos dois ramais. Em vez disso, aprisiona-se Suape na burocrática legislação portuária e se propõe retirá-lo da prioridade dos investimentos federais.

Suape tem condições para receber a Transnordestina. É o quinto porto do país, o maior do Nordeste, lidera no Brasil a movimentação de líquidos e de cabotagem e, no Nordeste, a de contêineres. Já tem terminal para movimentar os grãos da região do Matopiba e, desde 2012, desenvolveu os projetos necessários à licitação do Terminal de Minério --licitação cuja responsabilidade desde a nova Lei dos Portos de 2013, e sob protestos de Pernambuco, é do governo federal. 

Retornando-se ao início: não existem razões para que o governo federal aprove o cronograma proposto. É ótimo que se viabilizem as obras em direção a Pecém, mas não a postergação de uma ferrovia tão esperada em Pernambuco.

Defendemos que esta seja executada em direção a ambos os portos, e é preciso que se apresente uma solução nesse sentido, dialogando com os estados.

Espera-se que os órgãos que irão se debruçar sobre o tema tomem a decisão correta para que a retomada desse projeto, tão importante para o Brasil e para Pernambuco, não passe mais anos travada por decisões equivocadas.

Paulo Câmara

Economista e governador de Pernambuco (PSB) desde 2015, reeleito em 2018

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