A democracia estabelecida em 1985 herdou da ditadura a economia estatizada e autárquica, traços anticompetitivos logo reforçados com doses de populismo monetário e fiscal, nos primeiros anos do governo civil, e de protecionismo e corporativismo, na Carta de 1988.
Desde então, sucessivas administrações federais puseram em marcha um lento processo de abertura e modernização. A trajetória, interrompida pela euforia irresponsável a partir da segunda metade da década passada, foi retomada com o presidente Michel Temer (MDB).
Espera-se que seu sucessor, Jair Bolsonaro (PSL), tenha a sabedoria de reconhecer essa agenda e, sem patrocinar rupturas que apenas dissipam energia, aprofundá-la.
Se o mal crônico que enrijece as engrenagens da atividade econômica no Brasil tivesse de ser atribuído a uma só causa, a candidata seria a multiplicação de salvaguardas financeiras, burocráticas e normativas que, ao beneficiarem categorias diversas, inibem a concorrência e transferem custos para a porção mais pobre da população.
Entre as terapias para essa moléstia está a reforma das leis trabalhistas, fruto de uma convergência de iniciativas do Planalto e do Congresso. Sindicatos que viviam do dinheiro assegurado pelo imposto extinto terão agora de mostrar eficiência para sobreviver.
A litigância abusiva na Justiça passou a ter um custo inibidor. Contratos mais flexíveis podem abrigar na formalidade quem antes contava com a própria sorte. O princípio da negociação entre empregados e patrões ganhou relevo sobre a tutela estatal.
Também os vastos subsídios concedidos por meio do BNDES, pelo qual empresas eram beneficiadas contornando a dieta rígida e solar do Orçamento, tendem a desaparecer com a lei que igualou o custo do empréstimo do banco às taxas praticadas pelo mercado na relação com o Tesouro.
Nas estatais, a farra das nomeações políticas e da gestão perdulária dos negócios foi inibida com a fixação de requisitos legais de competência para os indicados e com alterações na governança das empresas que a aproximaram das melhores condutas do setor privado.
O realismo orçamentário, que revelou o status deplorável das contas federais, foi reinserido na rotina da comunicação do governo. Um cuidadoso trabalho de harmonização e exposição dos balanços dos estados mostrou um quadro calamitoso, que não se pode mais ignorar.
Ainda dentro das medidas aprovadas sob Temer para explicitar os graves problemas nacionais, o limite constitucional para o crescimento das despesas da União tornou mais claro e didático o resultado das escolhas orçamentárias.
Os principais fracassos da gestão atiçaram justamente a escalada dos gastos e decorreram de sua fraqueza, ou falta de vontade, para resistir a assédios corporativistas.
O governo Temer foi inconsequente ao conceder aumentos ao funcionalismo e subsídios aos caminhoneiros amotinados. Mostrou-se incapaz, após o presidente se envolver num escândalo que lhe ameaçou o mandato, de aprovar a mudança na Previdência.
Desse fio de meada deveria principiar o esforço reformista da administração que toma posse nesta terça (1º). Desatar o nó do sistema de aposentadorias, cujos parâmetros estão em franco desacordo com o rápido envelhecimento da população, assume a condição de prioridade incontrastável num cotejo judicioso das tarefas à frente.
Não se trata apenas de equilibrar as contas, sem o que o peso do conjunto das pensões sobre as gerações trabalhadoras do futuro vai se tornar insuportável.
Cumpre, sobretudo, adotar o princípio republicano da isonomia: todos, trabalhem no setor público ou na iniciativa privada, deveriam se submeter ao mesmo regime de contribuição e benefícios.
Há dois anos retomado, o programa de abertura econômica avança devagar e está sempre sujeito a retrocessos, porque encontra opositores poderosos pelo caminho.
Não têm faltado organizações empresariais, trabalhistas, sociais e culturais eficientes nas tarefas de arrancar e preservar suas rendas polpudas à custa do desaviso e da desproteção da maioria.
Que passem a dedicar mais energia ao aperfeiçoamento de suas atividades próprias, num ambiente aberto a quem deseja participar, governado por regras simples, impessoais e seguras. Aí deve estar, no fim das contas, o objetivo fundamental da agenda modernizadora do Brasil.
Fortalecimento da política econômica
Feito
- Teto de gastos deu horizonte
- para o controle da dívida pública
- Banco Central recuperou autonomia e credibilidade
- Metas de inflação assumiram trajetória declinante
- Reforma da CLT aboliu imposto sindical e privilegiou negociação
- Lei aprimorou governança das empresas estatais
- Subsídios no crédito do BNDES foram revistos
A fazer
- Conter, com reforma, a escalada dos gastos previdenciários
- Buscar queda do juro bancário e maior competição no setor
- Incentivar o crédito com regras para recuperação de garantias
- Tornar o sistema tributário mais simples e progressivo
- Promover revisão geral de subsídios e benefícios fiscais
- Retomar a venda de empresas e acelerar concessões
- Reduzir barreiras e ampliar acordos comerciais
- Reformar o serviço público, com revisão de privilégios
- Derrubar burocracia para abertura de empresas
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