Descrição de chapéu

Escola com evidências

Parlamentares não podem se dar ao luxo de gastar tempo com debates que não se amparam em estudos e comparações internacionais

Alunos de colégio estadual Maestro Fabiano Lozano na Vila Mariana, em São Pau
Alunos de colégio estadual Maestro Fabiano Lozano na Vila Mariana, em São Paulo - : Zanone Fraissat/Folhapress

Em boa hora, remeteu-se à gaveta o projeto de lei conhecido como Escola sem Partido, do qual se ocupava uma comissão especial da Câmara dos Deputados. Debatido desde 2014, o texto não obteve o apoio necessário para ser votado ainda neste ano. 

Baseada na percepção de que professores, nos diferentes níveis de ensino, despejam em seus alunos propaganda partidária e teses de esquerda, a proposta quer limitar as possibilidades de tratar de política em sala de aula.

No mesmo pacote restritivo se inclui a educação sexual, encarada como um assunto familiar que, portanto, deve ficar fora da escola.

De objetivos mais amplos que o projeto, o movimento Escola sem Partido convida os alunos a gravar exposições e denunciar docentes.

Tal agenda parte de uma preocupação justificável —não são poucos os pais que já observaram excessos ideológicos nos conteúdos apresentados aos filhos. Entretanto não se conhece a dimensão do problema e, pior, o enfrentamento proposto tende a gerar o efeito muito mais nocivo da censura.

Ainda que momentânea, a paralisação do debate na Câmara representa uma perda simbólica para o próximo governo. O projeto, como se sabe, tem o apoio do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).

Em um breve trecho sobre educação no seu plano de campanha, o então candidato criticava a doutrinação nas escolas e se opunha à “sexualização precoce”.

Não há, na literatura científica, base para a proibição de debates específicos em sala de aula. Na contramão, encontram-se fartas evidências de que educação sexual no ambiente escolar ajuda a prevenir episódios de abuso, a transmissão de doenças e a gravidez precoce.

Esta última constitui uma das principais causas de evasão escolar entre meninas no Brasil —1 em cada 5 nascidos no país é filho de adolescente. Não por acaso, a Organização Mundial de Saúde recomenda educação sexual nas escolas a partir dos 12 anos.

O ensino brasileiro se ressente de deficiências mais documentadas e urgentes. Só 8% dos estabelecimentos públicos contam com algum tipo de laboratório de ciências; 31% delas têm bibliotecas; 49% têm internet de banda larga. As sem banheiro representam 18% do total.

Os próprios cacoetes esquerdistas compõem apenas uma parcela da má formação dos professores, que demanda providências de longo prazo. Enquanto isso, parlamentares e gestores não podem se dar ao luxo de gastar tempo com debates que não se amparam em estudos e comparações internacionais.

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