Limites abaixo do céu

Sob Bolsonaro, política externa brasileira ensaia maior alinhamento aos EUA

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, e o assessor de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton, no Rio, no fim de novembro
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, e o assessor de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton, no Rio, no fim de novembro - 29.nov.18/Associated Press

No final de novembro, Eduardo Bolsonaro, filho do presidente eleito, visitou integrantes do governo Donald Trump em Washington e se deixou fotografar usando um boné com o slogan do republicano, “Faça os EUA grandiosos de novo”. 

Na quinta-feira (6), após raro voto do Brasil a favor de Israel na ONU, em moção que condenava a facção radical Hamas, o deputado elogiou o Itamaraty e a embaixadora americana, Nikki Haley. Na véspera, em evento em São Paulo, o futuro chanceler, Ernesto Araújo, afirmara que “o céu é o limite” para a relação com Washington.

Os episódios insinuam prontidão em se alinhar ao governo Trump. Estando obscuro o que o Brasil ganhará com tal dedicação, torna-se difícil ver nesses passos mais do que simpatia ideológica, algo que Jair Bolsonaro (PSL) prometera expurgar da política externa.

Historicamente, Brasil e EUA mantêm relação engrenada sob todos os presidentes, exceto pelo breve mal-estar de Dilma Rousseff (PT) ao se ver espionada, em 2013.

Em que pesem o antiamericanismo de assessores de Luiz Inácio Lula da Silva e a atrofia diplomática dos sucessores, é falacioso alegar que o Brasil tenha se afastado de seu segundo parceiro de negócios, a maior economia do planeta, que perfaz 12% da balança comercial.

É igualmente ingênuo não ver limites para a relação bilateral. O Brasil, afinal, não constitui aliado estratégico para os americanos. Localiza-se em região estável, sem bombas nucleares nem ameaças a interesses americanos. 

Não haveria, portanto, atrativo para Trump despender mais atenção a Brasília, sobretudo estando às voltas com uma investigação que pode lhe custar a Presidência e a campanha à reeleição em 2020.

Tal quadro pode mudar caso a situação na Venezuela se agrave, alçando o Brasil a parceiro necessário. Excluído esse cenário calamitoso, porém, o espaço para mudança de patamar é exíguo.

Os dois países mantêm uma profusão de debates, dos quais poucos avançam. Concentrar os diálogos em pautas mais concretas, como a energética, traria ganhos a ambos. 

O acordo de bitributação para poupar cidadãos e empresas expatriados de pagar imposto a dois governos pode retornar à agenda.

Já a dispensa de vistos para brasileiros está além dos presidentes. A crise econômica fez saltar a busca pelo documento e, com ela, a rejeição de pedidos, deixando o país longe do nível que a lei americana impõe para liberar a exigência. 

Distante também está um acordo de livre comércio, cuja confecção leva mais de quatro anos e enfrenta um Congresso democrata.

O imenso poder econômico e político dos Estados Unidos é, sem dúvida, atraente. A aproximação não pode, contudo, ofuscar o pragmatismo e prescindir de negociação.

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