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Recaída no vício

Mudança para beneficiar município que estoura limite de gastos evoca paternalismo perigoso

Na Presidência da República por um dia, Rodrigo Maia sancionou proposta que flexibiliza gasto municipal
Na Presidência da República por um dia, Rodrigo Maia sancionou proposta que flexibiliza gasto municipal - Pedro Ladeira 25.abr.18/Folhapress

Desde sua aprovação, em 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal sofreu poucas alterações relevantes, a maior parte delas nos últimos dois anos. A mais recente, promovida na terça (18), foi para pior.

Com a LRF buscou-se romper uma tradição de permissividade no manejo das finanças públicas nacionais, em especial nos estados e municípios. Até então, governadores e prefeitos cultivavam o hábito de estourar seus Orçamentos e, periodicamente, valerem-se de seu poder político para obter um socorro de Brasília.

Para interromper tais ciclos, estabeleceram-se limites para os gastos com pessoal e o endividamento, além de ficarem vedados empréstimos e refinanciamentos da União aos entes federativos.

Em dezembro de 2016 foi aberta uma exceção importante, com a criação de um programa de auxílio a estados em situação falimentar. Ali, pelo menos, houve ampla e transparente negociação, além de exigências de ajustes para os governos que se credenciassem ao plano.

Agora, Legislativo e Executivo mexeram na lei de modo bem mais sorrateiro. Deputados em final de mandato aprovaram às pressas um projeto oriundo do Senado, e o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sancionou o texto durante uma interinidade no Palácio do Planalto.

Com isso, municípios que ultrapassarem o teto para gastos com pessoal ativo e inativo, correspondente a 60% da receita, estarão livres de sanções se tiverem amargado uma queda de 10% ou mais em sua arrecadação (incluindo transferências obrigatórias de recursos de estados e da União).

Difícil não observar que, no Rio de Rodrigo Maia, parcela expressiva das prefeituras enfrentou problemas nos últimos anos com a redução dos ganhos com royalties do petróleo. Nos anos de bonança, esses recursos encorajaram contratações e reajustes salariais.

Conforme dados recém-publicados pelo Ipea, instituto de pesquisa ligado ao governo federal, é nos municípios que o número de servidores mais tem crescido —de 2,4 milhões, em 1995, para 6,5 milhões em 2016. Em alguma medida, a escalada se mostra natural, dada a tendência de descentralização dos serviços públicos.

A lei, de todo modo, precisa incentivar a prudência na gestão do quadro de pessoal. Eventuais flexibilizações, além de muito bem justificadas, devem ser pontuais e sujeitas a contrapartidas. O paternalismo, como demonstra a experiência, acaba saindo caro demais.

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