A titular da pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, causou polêmica ao anunciar num vídeo, gravado no dia em que assumiu o cargo, o início de "uma nova era no Brasil", na qual "menino veste azul e menina veste rosa".
Dificilmente a afirmação deixaria de ser recebida como um sinal de que Damares, advogada e pastora evangélica, pretende imprimir uma linha conservadora no ministério, na contramão dos movimentos que defendem direitos de mulheres e da comunidade LGBT.
É uma interpretação que encontra fundamento no ideário que levou o novo presidente ao poder.
De fato, ao longo da campanha eleitoral, Jair Bolsonaro (PSL) não se cansou de repetir o bordão do combate a uma fantasiosa "ideologia de gênero", que ameaçaria as crianças brasileiras no sistema educacional —preocupação que reapareceu em seu discurso de posse.
Nos últimos anos, o tema ganhou popularidade entre grupos religiosos conservadores que veem a emergência de reivindicações igualitárias de homossexuais e transgêneros como uma espécie de ameaça à família tradicional.
O suposto risco foi explorado com estardalhaço pela bancada evangélica no Congresso, que na legislatura passada tentou aprovar, sem êxito, o famigerado projeto da Escola sem Partido.
Ao tentar explicar-se, em entrevista para o canal de TV por assinatura Globonews, Damares disse que a declaração era uma "metáfora" e que o respeito, em suas palavras, "à identidade biológica das crianças" não implicaria revisões de direitos, perseguições ou atos discriminatórios.
"Não estou querendo impor nenhuma religião. Ninguém vai ser preterido", afirmou a ministra.
Quanto a esses aspectos, ela se mostrou, na entrevista, bastante razoável. Demonstrou sensatez ao separar, ao menos em tese, a pastora da ministra e defendeu com desenvoltura as prerrogativas de cidadania da comunidade LGBT. Disse ser favorável à adoção de crianças por casais homossexuais, assegurada por lei, e manifestou preocupação com a violência voltada contra essa parcela da população.
É possível que, à semelhança do que se observa também entre representantes de governos de esquerda, o intuito do gesto da ministra tenha sido antes contentar a militância do que definir as linhas de atuação de seu ministério.
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