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Daniel Gerber

Finalmente, o 'plea bargain'

Paradigma mundial é de resolver casos via mediação

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Cerimônia de transmissão de cargo do novo ministro da Justiça, Sergio Moro - Pedro Ladeira - 2.jan.19/Folhapress
Daniel Gerber

Logo ao assumir, o ministro Sergio Moro trouxe uma proposta que, por alterar significativamente o sistema processual, nasce polêmica. Trata-se do "plea bargain", um mecanismo do direito anglo-saxônico que permite a negociação de culpa e punição entre acusados e Ministério Público, evitando os desgastes de um processo penal.

Alguns dos objetivos dessa política criminal são uma mais eficiente e econômica solução para o controle da criminalidade pelo Estado e a desburocratização, o aceleramento e a simplificação da Justiça.

Se vingar, o Judiciário ganha fôlego para se concentrar em casos mais importantes, evitando o aumento da impunidade e empregando melhor seus recursos. Além de tais vantagens, uma justiça pactuada contempla a hipótese de que o acordo entre réu e Estado dará às vítimas reparações rápidas e adequadas.

A mudança vem com atraso, uma vez que o paradigma mundial é justamente o da resolução de conflitos via mediações. Do ponto de vista constitucional, pode ser implantada sem óbices, pois não haverá afastamento de jurisdição ou de persecução criminal --já que o MP não deixará de agir e a palavra final sobre qualquer acordo continuará nas mãos do Judiciário--, assim como nos tratos de delação premiada nenhum acordo será feito sem direito à defesa.

O argumento contrário de que o "plea bargain" provocará um "superencarceramento" não resiste à lógica. Se o cidadão se sabe culpado, a punição e reparação do dano são uma consequência inevitável de sua escolha consciente ao praticar um crime. Logo, o fato de tal acordo permitir ao Estado que alcance maior efetividade na punição jamais poderia ser visto como negativo.

De outra banda, se a pessoa se sabe inocente, não aceitará um pacto injusto, preferindo ir a julgamento. A preocupação de que o MP poderia coagir um inocente a aceitar o acordo é, por sua vez, superficial, pois não existe nada pior que ser denunciado, processado e correr o risco de condenação equivocada. 

Há ainda quem ataque o "plea bargain" atribuindo-lhe o rótulo de consequência do punitivismo da Lava Jato. Ora, fala-se em acordos criminais desde 1981, quando José Frederico Marques apresentou seu anteprojeto de reforma do Código de Processo Penal, dando origem, anos depois, aos Juizados Especiais e à suspensão condicional do processo, que também é um acordo.

Isso para não falar da colaboração premiada, que, além de abranger qualquer delito, resulta em benefícios como redução de pena e isenção processual. Aqui surge a questão capital: se posso negociar minha culpa e minha pena "entregando" terceiros, por que não poderia fazer o mesmo em relação a mim? 

Os contrários ao "plea bargain" parecem aceitar o acordo criminal apenas quando um suposto benefício social é maior que o individual, como no caso da delação. Mas isso sim é prejudicar o indivíduo, pois lhe tira a capacidade de gerir o próprio destino, devolvendo-a apenas quando incrimina terceiros. 

A sociedade brasileira se cansou da ineficiência de retóricas que não solucionam. O "plea bargain" é medida modernizadora que atende a esse anseio ao oferecer a gestão do próprio destino, longe do paternalismo de uma Justiça monopolizada pelo processo e de uma falsa proteção de interesse dos envolvidos na lide.

Daniel Gerber

Advogado, mestre em ciências criminais, professor de direito penal e sócio-fundador da Daniel Gerber Advogados e da Thinking Blue Soluções e Consenso

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