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O Haiti de sempre

Como no Rio, a presença militar ostensiva resultou em não mais que um paliativo, sem proporcionar solução para o controle das milícias

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Mal se completou um ano do fim da missão de paz da ONU, cuja chefia militar coube ao Brasil, e o Haiti já está mergulhado em um novo ciclo de violência política —o que nem de longe configura surpresa, mas não deixa de ser desalentador.

No poder desde 2017, o presidente Jovenel Moise acaba de enfrentar a terceira e mais longa onda de manifestações exigindo a sua saída. Dezenas de milhares de haitianos tomaram as ruas enquanto grupos armados fechavam vias, provocando o caos. Ao menos sete morreram em nove dias de marchas, saques e bloqueios.

Embora o catalisador seja um escândalo envolvendo suposto desvio de fundos de ajuda venezuelana, o pano de fundo dos protestos populares são as crescentes dificuldades econômicas do país mais pobre do hemisfério ocidental.

Homem segura arma durante protestos contra o governo em Porto Príncipe, no Haiti
Homem segura arma durante protestos contra o governo em Porto Príncipe, no Haiti - Ivan Alvarado/Reuters

O Haiti enfrenta uma inflação de dois dígitos, pressionada pela desvalorização da moeda local, o gourde, diante do dólar. O resultado é uma disparada do preço dos alimentos, dado que boa parte da oferta vem do exterior.

Em meio a esse cenário doloroso, preocupa o ressurgimento de milícias armadas atuando politicamente para derrubar Moise. A atuação desses grupos esteve no centro da violência política de 2004, que resultou na Minustah, o acrônimo da missão de paz da ONU.

Ao longo de 13 anos, o Brasil enviou à região 37,5 mil militares, quase todos atuando em Porto Príncipe.

Ainda que tenha havido momentos heroicos, como a atuação durante o terremoto de 2010, a principal meta —acabar com a instabilidade política gerada pela violência— não foi atingida. Dezesseis meses após a missão, grande parte da capital está novamente sob a influência de grupos armados envolvidos na disputa pelo poder.

Não é coincidência que os frágeis resultados alcançados no Haiti se comparem aos da recém-encerrada intervenção na segurança do Rio de Janeiro —para a qual o país caribenho serviu de “laboratório”, segundo as Forças Armadas.

Nos dois lugares, a presença militar ostensiva resultou em não mais que um paliativo, sem proporcionar solução permanente para o controle das milícias.

Assim como tem agido com a Venezuela, o governo brasileiro deveria prestar mais atenção ao Haiti. No Planalto, não faltam auxiliares com experiência na missão de paz. Até agora, a única manifestação pública do Itamaraty foi uma nota aconselhando os cidadãos brasileiros a deixar aquele país. Que a diplomacia não faça o mesmo.

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