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Chico Whitaker

Brumadinho, Flamengo, Angra: e o bom senso?

Inexiste a cultura de segurança em equipamentos

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Obras da usina  Angra 3, em Angra dos Reis, em 2011
Obras da usina Angra 3, em Angra dos Reis, em 2011 - Eletronuclear/Divulgação

Tragédia em Brumadinho, três anos após Mariana. Desta vez foi mais duro: mais de 300 vidas perdidas. Causa, a mesma: descaso com a segurança em benefício do lucro. Onde ficam as vidas humanas na lógica do mundo econômico e político? 

Nem bem identificados os responsáveis, a morte absurda de dez meninos em um centro de treinamento de futebol. E os 242 jovens da boate Kiss? E o incêndio do Museu Nacional, carbonizando a memória do país? Como sempre: falta de fiscalização, laudos ignorados.

Não temos no Brasil uma cultura de segurança em equipamentos coletivos. Com isso, é assustador o que pode acontecer com uma das invenções mais perigosas da humanidade, que importamos: as “chaleiras” para produzir eletricidade com energia nuclear, chamadas usinas nucleares. Temos duas, em Angra dos Reis. E estão programadas Angra 3 e algumas mais em outras regiões. Mas o projeto de Angra 3 é de 1977. Elaborado, portanto, antes de três acidentes com derretimento do reator, até então tidos como impossíveis —nos EUA (Three Mile Island), na então União Soviética (Chernobyl) e no Japão (Fukushima).

Em qualquer outro país seria obrigatório adequar o projeto às normas da Agência Internacional de Energia Atômica pós-1979. Para os que sofrem suas consequências, tais acidentes são catástrofes. A explosão de uma usina nuclear não se esquece no prazo de um luto: a radioatividade disseminada matará durante décadas ou séculos quem for contaminado. Esses acidentes, quando acontecem, só “começam”. Por centenas de anos será interditada a presença humana num vasto território em Fukushima e Chernobyl. E fora dele a leucemia matará meninos e meninas e nascerão crianças malformadas. 

Em Angra 3, o bom senso fugiu para muito longe. Irresponsabilidade? Talvez insanidade, que nos espreita numa das bonitas praias do Sudeste. O drama poderá alcançar as duas maiores cidades do país, segundo determinem os ventos. 

A Eletronuclear conseguiu em 2010 o licenciamento de Angra 3, com seu projeto obsoleto, engavetando um parecer de engenheiros de segurança e uma recomendação do Ministério Publico Federal pela adequação do projeto. 

Há informações imprecisas e duvidosas sobre supostas adequações. Mas cabe perguntar, por exemplo: o edifício do reator terá, como deveria, três vezes mais solidez do que o do projeto de 1977, para que resista a eventuais explosões? 

Conluios entre empresas e governos sempre existem. Em Fukushima, apesar das recomendações dos cientistas, o muro contra tsunamis ficou com somente quatro metros. A onda veio com 15 metros e afogou os equipamentos de segurança de quatro reatores nucleares. 

Uma petição por uma auditoria de Angra 3 (change.org/usinanuclearnao) está correndo o mundo. Os milionários de Angra nem imaginam que podem perder suas mansões. Mas lá fora se sabe que acidentes nucleares não respeitam fronteiras. 

A nuvem radioativa que saiu de Chernobyl cobriu toda a Europa. A água que resfria os reatores fundidos de Fukushima contamina o Pacífico.

Chico Whitaker

Arquiteto e urbanista e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz

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