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Luiz Fux

Previdência, economia e Constituição

Equilíbrio depende da atuação dos três Poderes

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O vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux
O vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux - Pedro Ladeira - 15.dez.16/Folhapress

A Previdência Social é um sistema de seguro obrigatório em que o trabalhador participa por meio de contribuições mensais e recebe, em contrapartida, o benefício de uma renda no momento em que estiver inapto, seja pelo advento de aposentadoria seja pelo de riscos econômicos como a perda de rendimentos em razão de doença, invalidez, maternidade ou até mesmo a morte de cônjuge.

No contexto brasileiro, muito se discute a respeito da necessidade ou não de uma reforma. Nesse diapasão é que, em 20 de fevereiro deste ano, o presidente Jair Bolsonaro e sua equipe econômica, chefiada pelo ministro Paulo Guedes, entregaram uma proposta. 

O equilíbrio das contas públicas depende da atuação conjunta dos três Poderes. O Executivo deve organizar a política previdenciária, imprimir maior eficiência à gestão e, eventualmente, propor alterações legislativas para reorganizar as finanças em face de projeções etárias, déficits orçamentários e etc. 

Por sua vez, ao Poder Legislativo incumbe a tarefa de discutir com maturidade as propostas. Quanto ao Poder Judiciário, cabe a função de garantir os direitos constitucionalmente assegurados, sem olvidar do esforço das instituições político-representativas em imprimir equilíbrio econômico-financeiro.

As demandas judiciais implicam ao Judiciário a necessidade de realizar um cauteloso raciocínio. Por um lado, o juiz não pode se afastar das previsões legais e dos mandamentos constitucionais protetivos no referente aos direitos adquiridos no tocante à aposentadoria ou às garantias de proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário. 

Por outro, como bem nos relembram Guido Calabresi (ex-desembargador federal nos EUA e professor de Yale) e Philip Bobbitt (professor da Universidade de Columbia), o Judiciário não pode esquecer que está inserido em um ambiente político-econômico de recursos limitados no qual, não raras vezes, o poder público necessita realizar verdadeiras “escolhas trágicas” na medida em que elege como alocar recursos. 

Como já bem demonstrado por Cass Sunstein e Stephen Holmes, a proteção a qualquer direito, seja de cunho individual seja de social, representa custos ao Estado, prescindindo, consequentemente, de uma alocação dos recursos. Nesse diapasão, a discussão a respeito de direitos, especialmente os de cunho social, não está só adstrita a um debate principiológico. Para além do reconhecimento de direitos fundamentais, conquista histórica expressada na Carta de 1988, hoje, vivemos em um paradigma em que, cada vez mais, juristas precisam refletir, também, a respeito de como efetivá-los. As promessas constitucionais expressas não podem deixar de vir acompanhadas de consequências jurídicas e fáticas concretas, cogentes e eficazes, sob pena de restarem vãs e frias enquanto letras mortas no papel.

A imposição de previsão orçamentária prévia não deve, per si, refletir um obstáculo ao reconhecimento de um direito. O Poder Judiciário tampouco pode legitimar o descumprimento de deveres constitucionais por parte do poder público, sob a justificativa de falta de recursos. 

O que se deve ter em mente é o fato de que decisões judiciais podem produzir consequências sistêmicas. Em vez de efetuar mero enfrentamento direto, com decisões judiciais simplórias, é preciso repensar modelos de interferência judicial em que se distribuem os custos de decisão, criando incentivos para soluções negociais, legislativas ou até mesmo para que atores com maior expertise técnica possam colaborar na solução.

A atividade jurisdicional deve ultrapassar a visão “credor (cidadão) X devedor (Estado)” que vem orientando as intervenções judiciais. É dizer: eventual intervenção judicial precisa partir de uma óptica funcional, mensurando-se o grau de utilidade, os impactos sociais que ela promoverá e os incentivos e os desincentivos gerados por ela aos demais atores políticos envolvidos, a fim de se chegar a uma resolução dialógica para o problema, em prol dos cidadãos impactados.

O intuito, portanto, é o de promover decisões judiciais responsivas aos problemas presentes na realidade social sem, no entanto, “drenar recursos escassos e criar privilégios não universalizáveis”. 

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