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Cerco ao alcaide

Cabe questionar se os vereadores desejam de fato o impeachment de Crivella

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O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, concede entrevista à Folha em seu gabinete, em fevereiro deste ano
O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, concede entrevista à Folha em seu gabinete, em fevereiro deste ano - Ricardo Borges/Folhapress

A abertura do processo de impeachment contra o prefeito do Rio, Marcelo Crivella (PRB), compõe um retrato das mazelas políticas brasileiras —legislação ambígua, fragmentação partidária, fisiologismo e institucionalidade frágil.

Como se sabe, o impeachment é instituto de natureza híbrida, parte jurídico, parte político, e as leis que definem os chamados crimes de responsabilidade acabam por incluir todo tipo de conduta minimamente duvidosa. Assim, quase sempre se pode apontar alguma irregularidade que dê margem ao processo de afastamento.

O que evita processos levianos é a porção política do impeachment. Uma deposição depende do voto de dois terços do Legislativo, algo que raramente se observa.

Crivella teria mandado renovar dois contratos de concessão pública sem que houvesse base legal para tanto. Em circunstâncias normais, episódios do gênero poderiam levar a questionamentos judiciais, mas dificilmente provocariam escândalo suficiente para uma providência radical.

O primeiro problema do prefeito —fora o envolvimento em episódios rumorosos— é não contar com uma base parlamentar sólida, tendo chegado ao posto num movimento de protesto dos votantes.

Segundo, ele não apenas consumiu rapidamente o capital político obtido nas urnas como se indispôs com vereadores. Há informações de que Crivella descumpriu acordos que firmara com membros da Câmara, além de recusar pedidos de obras e serviços nas bases eleitorais dos representantes.

Em situações de restrição orçamentária, como as do Brasil em geral e do Rio em particular, não se pode atender a todos os pleitos —o que exige do chefe do Executivo mais habilidade para manter o controle do jogo político.

Cabe questionar, de todo modo, se os vereadores desejam de fato o impeachment. É plausível, dado o fisiologismo das relações partidárias, que estejam apenas a pressionar o prefeito. Nessa hipótese, Crivella teria a chance de ceder a exigências e segurar-se na cadeira.

A mera conjectura mostra o potencial de perversão do instituto —concebido para afastar maus governantes, não para dar curso à ganância política de parlamentares. Trata-se de recurso extremo, que não deve ser banalizado.

editoriais@grupofolha.com.br

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